segunda-feira, 19 de julho de 2021

A Revelação.

                                                           J. B. Pessoa

Maria Celeste era uma moça ditosa.

Apesar de pertencer a uma família de poucos recursos, sempre encarou a vida com coragem e otimismo, nunca deixando que as desventuras existenciais, abatessem o seu ânimo, impedindo de atingir seus objetivos. Começou a trabalhar muito cedo, carregando marmitas para restaurantes e engraxando sapatos para a vizinhança. Tinha seus próprios rendimentos para comprar as coisas que necessitava e se sentia orgulhosa em ajudar a família nas despesas mensais. Aos treze anos arranjou um emprego num armarinho, o qual tinha como balconistas os filhos do comerciante, conhecendo com eles o gosto amargo do assédio. Conservando-se pura e recatada, a menina reprimia as ousadias com elegância e diplomacia. Deixando um emprego e conseguindo outro, estudando a noite e trabalhando durante o dia, conseguiu graduar-se, com distinção, em professora na Escola Normal do Instituto de Educação Régis Pacheco, sendo considerada a mais bela normalista daquele ano, que o homem pisou na Lua.

Celeste gostava muito de festas, principalmente as que aconteciam nos clubes sociais de sua cidade. Era uma excelente dançarina e ia aos bailes, soberbamente vestida. Os modelos que usava eram criados e confeccionados por ela mesma. Muito educada, ela era estimada por todos que a conhecia. Morena cor de jambo e olhos esverdeados tinha uma pele macia e delicada. Alta e elegante, com um corpo escultural, chamavam a atenção dos rapazes por onde passava. Seu rosto belo e mimoso despertava paixões nos jovens, sendo bastante cortejada em todas as reuniões sociais que frequentava.

Havia certo indivíduo na sociedade jequieense, que assediava Celeste constantemente. Pretendia seduzir a moça e a exibir como troféu aos estroinas da cidade. Pertencente a umas das oligarquias da região, tinha fama de ser um conquistador inveterado. Era um sujeito alto, forte, de aparência razoável e metido a bacana. Andava pela casa dos trinta e sua performance era verdadeiramente anacrônica para a época. Tinha cabelos escuros e lisos, penteados cuidadosamente com brilhantina e um vasto bigode, que lhe dava um efeito totalmente singular. Andava bem vestido com roupas feitas à medida; porém, o seu gosto pela moda parou na década anterior. Seu nome completo era José Epaminondas Garcia e Silva, mas era conhecido pelo apelido de Pepe Marreta. Seu maior orgulho, além de sua vasta cabeleira, era o seu DKV-Vemag de quatro portas, de cor vermelha, que ele exibia pelos quatro cantos da cidade. A sua ocupação predileta era a boemia e a libertinagem.

O sujeito se considerava uma verdadeira maravilha. Apoiado por um batalhão de bajuladores ao seu lado, afirmava ter deflorado 32 meninas e todas elas apaixonadíssimas por ele. Às vezes, quando um pai ou irmão se atrevia tomar alguma satisfação, era por ele surrado. Pois além de forte, Pepe Marreta praticava a nobre arte do pugilismo.

Um belo dia, caminhando alegre em direção ao Grupo Escolar Castro Alves, onde passou lecionar depois de formada, Celeste foi abordada por Pepe que, usando galanteios piegas, lhe ofereceu uma carona. Celeste detestava o sujeito. Tinha verdadeira aversão pelas coisas que ele dizia e fazia, principalmente pelas músicas que ouvia. Pepe era o oposto de tudo que ela considerava como uma pessoa refinada.

- Vamos menina, é só uma carona! – Insistiu ele com uma voz adocicada e lançando para a garota o seu olhar de galã hispânico, disse sorrindo:

– Uma boneca como você não deve andar a pé. Isso é até um pecado!... Olha, cuidado com o lobo mau!

Celeste considerava Pepe um verdadeiro imbecil. Apesar dos galanteios bizarros do sujeito, ela disse gentilmente:

- Agradeço-lhe o convite, porém já estou perto da escola, não havendo necessidade disso!

O malandro olhou a garota com descontentamento e fingindo tristeza, disse a seguir:

- Oh! Que pena! Quando você precisar é só pedir! Sou seu escravo!... Olha que nós nos conhecemos desde que você era apenas uma menininha!

A garota esboçou um sorriso e disse dissimulando a sua antipatia:

- Sei que posso contar com a sua pessoa!

Celeste nunca havia se esquecido do assédio daquele sujeito, durante toda a sua adolescência. Ela ainda se lembrava do medo que sentia do malandro e de sua raiva pelo desrespeito à sua pessoa. Respirando aliviada depois que Pepe foi embora, a moça entrou na escola, um pouco preocupada, sentindo que novo assédio, iria ocorrer seguidamente.

Depois que o sujeito se despediu da garota, dirigiu-se para um bar chamado White Star, que ficava perto da escola. Era um bar famoso, muito frequentado pela boemia local. A maioria era de gente decente, como comerciários, estudantes e operários; havendo, também, alguns velhacos e libertinos, que faziam daquele estabelecimento o seu ponto predileto. Ali chegando o sujeito foi logo abordado e entrevistado pelos malandros que estavam à espreita, desde que o famoso Pepe Marreta abordou aquela garota maravilhosa.

Dando a sua versão do ocorrido, o fanfarrão aproveitou a plateia de desocupados e despejou um turbilhão de mentiras para aquele grupo de beberrões, que só tinha uma ocupação na vida: beber e falar da vida alheia!

- A menina tá na minha! – Disse Pepe Marreta com desdém e, tomando um trago de conhaque, acrescentou:

- Ela está temerosa!... Afinal é uma professora e tem um nome a zelar.

- Só quero saber quando você vai comer ela, cara! – proferiu com cinismo, um sujeito asqueroso, que se comprazia com o sucesso dos outros.

Pepe ascendeu um cigarro e, olhando para todos que estavam no bar, disse aparentando naturalidade:

- Já marcamos tudo, meu compadre!... Sábado à noite, depois da festa do Tênis, eu a levo pra Cidade Nova e aí a gente faz a nossa festa particular!

Alguns rapazes, que se encontravam no bar, sabiam que tudo aquilo era calúnia e ficaram revoltados com a tamanha patifaria, daquele canalha mentiroso. Porém, ninguém tinha coragem de dizer coisa alguma, pois os socos de Pepe eram uma verdadeira marreta, daí o cognome do famigerado cafajeste.

O patife já havia concebido um ardiloso plano, para comprometer a honra daquela charmosa moça, que soube resistir às suas investidas amorosas. Ele nunca a perdoou por tamanha afronta! - “Quem era aquela sujeitinha sem eira e nem beira, que se atrevia a esnobá-lo”, - pensava ele a todo o momento. A atração que ele sentia pela garota, foi aos poucos se transformando em rancor e com o tempo em ódio. Uma antiga colega de Celeste, sofrendo chantagem por parte do velhaco, foi forçada a ajudá-lo na ocasião.

Naquele sábado à noite, o Jequié Tênis Clube estava repleto da bonita mocidade jequieense! Dava-se a impressão, que toda a sociedade local tinha comparecido à festa, pois todas as mesas tinham sido reservadas. O baile foi animado pela famosa banda, “Oliveira e seu Conjunto” e o evento resplandecia de um colorido animador. Tratava-se de uma festa beneficente, coordenada pelos alunos da quarta série ginasial do Ginásio de Jequié. Celeste estava radiante e era, sem dúvida, a garota mais bonita do baile! A rapaziada não tirava os olhos dela, despertando por parte de algumas moças, pouco dotadas de encantos, do nefasto sentimento de inveja.

Às duas horas da manhã, quando a festa estava no auge, o malandro colocou em evidência o seu diabólico plano. Deu sinal para a colega de Celeste que, a contragosto, foi conversar com ele:

- Não estou gostando nada dessa situação! Não sei que tipo de peça você quer pegar nela. Veja bem o que você vai fazer...

- Deixa de bobagem, menina! Não é nada demais! Confie em mim! - Argumentou o sujeito, fazendo ar de moço bom!

Depois de ser orientada no que deveria fazer, a moça foi ao encontro de Celeste e, fingindo ansiedade, disse-lhe a seguir:

- Celeste querida! Preciso muito de um favor seu! Meu irmão bebeu demais e está caído em um bar! Preciso levar ele para casa! Pepe vai comigo de carro até o local, mas eu não queria ir sozinha com ele! Você poderia me acompanhar?

- A garota franziu a testa e proferiu preocupada:

- Mas logo com esse cara?!... Não tem outra pessoa?

- Infelizmente não. Foi o único rapaz que se prontificou a me ajudar!

Celeste ficou bastante contrariada com a situação; mas, como não era incapaz de negar ajuda a alguém, não viu outra solução. E, apesar da companhia do detestável sujeito, foi com a amiga em socorro do irmão.

Logo que viu a sua vítima, o malandro sorriu simpaticamente, tecendo largos elogios à moça. Celeste o cumprimentou com um sorriso frio e os três entraram no carro com destino ao bairro do Jequiezinho. Celeste sentou no banco da frente com Pepe, após a insistência do sujeito.

Quando deu a partida, o malandro percebeu os olhares das pessoas que estavam por perto e sorriu satisfeito. O seu plano corria ás mil maravilhas. Entrou com o seu carro na Avenida Rio Branco e foi até ao White Star Bar, com a desculpa de comprar um maço de cigarros. Os vagabundos de plantão sorriram, maliciosamente, quando Pepe piscou para eles, esboçando um largo sorriso. O carro seguiu depois para seu destino à procura de um inexistente bêbado, que não se encontrava em parte alguma. A busca já havia demorado mais de uma hora, como estava previsto no infame plano, quando a irmã do garoto veio com a informação, de que o bêbado já se encontrava em casa dormindo. A moça pediu ao sujeito que a levasse para casa, pois precisava ver o irmão para saber de sua saúde. Pepe levou a moça até a sua casa que, convenientemente, morava no Jequiezinho, perto de onde eles se encontravam. Esse fato implicou em Celeste voltar para a festa, tendo somente a companhia do famigerado Pepe Marreta.

- Você vai me deixar sozinha com esse sujeito?! - Perguntou indignada a garota, preocupada com a sua situação.

- Não se preocupe meu anjo! Pepe é um rapaz de respeito! Ele levará você até a festa, que deve estar um barato nesse momento!

Celeste voltou com Pepe Marreta, que sorria satisfeito, dizendo a moça do apreço que ele lhe tinha e que ela poderia considerá-lo como verdadeiro amigo. Na volta para o clube, o sujeito fez questão de passar novamente no White Star Bar para esnobar entre os presentes, a pretensa conquista. Quando Celeste entrou no clube, na companhia do sujeito, notou os olhares inquisidores das pessoas ali presentes. Ficou um pouco preocupada com as possíveis fofocas, porém bastante aliviada por se ver livre de tão pegajoso individuo.

A festa corria às mil maravilhas, com muita gente dançando ao som de Oliveira, que na época estava na sua melhor fase. Celeste foi ao encontro de sua turma e explicou o motivo de sua demora. Pepe permaneceu no salão por pouco tempo e, logo depois, deixou a festa, indo ao encontro de seus camaradas, para relatar à sua canalhice. O plano para comprometer a reputação de Celeste, tinha dado certo, nos mínimos detalhes.

No domingo pela manhã, a notícia correu de boca em boca: “Pepe Marreta comeu Celeste!” Chuvas de telefonemas para todos os rapazes da cidade, contando a grande novidade, dando um trabalho extra para as telefonistas da Companhia de Telefone de Jequié. Parecia, afinal, haver caído o último baluarte da virtude, após tenaz resistência de uma heroína, que aos poucos foi desfalecendo sob o jugo de tão poderoso opressor! A ninguém parecia tratar-se de uma grande mentira! Dir-se-ia que, as pessoas têm uma vocação natural para crer nos fracassos do próximo e nunca em suas vitórias. Como sempre acontece, o ocorrido tomou feições mais dramáticas, devido à força das fofocas, principalmente, das comadres zelosas da moral e dos bons costumes! Uma delas sugeriu, que a moça fosse expulsa da escola e barrada no clube, devido à má influência exercida por ela à juventude jequieense!

Naquele domingo, Celeste acordou mais tarde do que o costume. Afinal chegou a sua casa pela madrugada, após o final da festa, a qual foi bastante divertida. Dormiu até ao meio dia, quando foi despertada por sua mãe, a qual relatou o boato que afetava a sua honra. A moça ficou bastante

nervosa com aquela situação e, aos prantos, explicou todo o ocorrido, pedindo perdão à sua família por tamanha ingenuidade. Sua mãe foi bastante compreensiva e a moça foi totalmente apoiada por seus familiares, solicitando-a que deixasse as coisas como estavam! Afinal, dizia sua mãe: “A mentira tem pernas curtas”. Mesmo assim, a moça foi acometida de uma pequena febre nervosa e teve que ser atendida pelo Doutor Nilton Pinto de Araújo, um médico amigo de seu falecido pai, pedindo que ela ficasse de repouso por três dias.

Na manhã seguinte, Celeste pensou em tudo que poderia fazer para reverter à situação. Depois de muito refletir, achou melhor fazer uso de um provérbio popular, que diz: “Bem ou mal, mas fale de mim!” Porém, descartou logo a ideia, pois não possuía cinismo bastante para isso! Mais tarde lembrou-se de outro ditado: “Quem com ferro fere, com ferro será ferido!” E calmamente começou a arquitetar a sua vingança!

Naquela terça-feira, a moça acordou mais animada, pretendendo ir logo à desforra, pois não era uma pessoa que se deixasse abater pelos infortúnios existenciais do cotidiano. Chegando à escola cumprimentou todas as colegas com o seu sorriso de sempre e evitou conversar sobre o assunto, dando satisfação somente às pessoas de sua inteira consideração.

Havia nessa escola, um grupo de professoras, as quais eram as mais famosas boateiras da cidade. Esse grupo era liderado por uma solteirona, que era temida por todos, devido á sua língua ferina! Celeste sabia que entre dois boatos, o mais escabroso prevaleceria e colocou logo em ação, com o seu ardiloso plano! Para que isso acontecesse, aproximou-se daquelas fofoqueiras e, com sutileza puxou conversa com elas, falando sobre amenidades. Depois de algum tempo, uma delas perguntou de sobressalto:

- Então Celeste!...Quando será o casamento!

- Que casamento menina? – Perguntou, fingindo espanto. As professoras entreolharam-se com sorrisos maliciosos, e uma delas disse a seguir:

- Ora essa! Com Pepe!... Afinal ele “tirou você de casa!” Não é verdade?

- Sim, certa forma!... Porém não quero me casar com ele!

- Por que não?!... Você não gosta dele?

- Eu gostava dele! Mas a decepção que tive, mata qualquer amor!... A minha tão sonhada primeira vez foi um fracasso total!

- Como assim?!... O que foi que aconteceu?! – Interrogou uma das professoras, bastante excitada, prevendo o reboliço que iria acontecer.

Celeste olhou para elas com cara de choro e, demonstrando uma grande tristeza, pediu em tom conspiratório:

- Vocês prometem não contar isso a ninguém?

- Claro que prometemos!... Não somos fofoqueiras!... Pode confiar na gente!

A garota deu um profundo suspiro e fingindo uma grande mágoa, começou a relatar o suposto acontecimento, daquele fatídico sábado.

- Sabe!... É que ele tem hábitos estranhos...

- Como assim? – Perguntaram as três professoras de uma só vez!

A moça elaborou uma furtiva lágrima e, com uma voz rouca, denotando um profundo desgosto, disse baixinho:

- É que ele gosta de introduzir objetos em seu anus!

- Verdade?!... Nossa! Dê-nos mais detalhes, menina! Essa história está ficando muito interes... Digo séria! – Expos a solteirona escondendo o sorriso!

Celeste suspirou novamente e, fingindo estar mais calma, relatou os supostos acontecimentos, os quais, indubitavelmente, ela seria a grande vítima. À medida que ia narrando, as professoras arregalavam mais os olhos, diante de tamanha revelação.

A garota, sentindo a atenção das professoras, deu mais ênfase a sua estória:

- É que ele precisa dessas coisas para atingir a ereção! A princípio foi só uma vela normal. Como ele não estava conseguindo nada foi aumentando o tamanho e a grossura delas! A cada tentativa, eu ficava mais assustada com tudo aquilo! De repente ele ficou nervoso por não

conseguir, foi até a cozinha e trouxe o maior pepino que eu já vi e disse para mim: “Este aqui é bom, parece de verdade” e introduziu tudo nele!... Só assim ele conseguiu! E quando quis me possuir, foi acometido de uma súbita ejaculação precoce!... Fiquei bastante triste! Ele me disse, pra não contar a ninguém e que na próxima vez, a coisa iria ser diferente!

- Ora essa!... Quem diria!... Pepe Marreta gosta de tomar no...

- O que é isso mulher?!... Não tem vergonha? – Disse a solteirona tapando a boca da colega com a mão e ao mesmo tempo tentando controlar a gargalhada, que acabou tomando conta das três! A seguir uma delas pergunta a Celeste:

- Menina!... Quer dizer que você saiu dessa aventura, totalmente invicta?!

- Sim! Estou bastante triste com isso, pois eu gostava muito dele!

- Ora, não se preocupe com isso! Você é uma garota muito bonita e não vão faltar rapazes para você! Espere um pouco e logo estará gostando de outro! Depois de relatar tudo, conforme o seu plano, Celeste despediu-se das colegas e foi ter com seus alunos, dando início à sua aula, esperando o rolar dos acontecimentos. Como ela previra, o boato correu de boca em boca, rapidamente, como um rastilho de pólvora e, na noite daquela terça-feira, nos principais bares e botequins da cidade, o assunto era o mesmo: “Pepe, a marreta caída!” A maioria dos boêmios jequieense não gostava daquele sujeito “metido a besta” e aumentavam, maliciosamente a noticia, dando uma conotação mais picante! No White Star Bar, também conhecido como o bar do Tõe, o assunto não era diferente:

- Pepe Marreta!... Gilete?! – Perguntou alguém.

- Gilete uma ova, o sacana é bichona mesmo! – Respondeu outro,

- Aquele cara nunca me enganou! Aquele bigodão era só para disfarçar. Eu soube que desde pequeno ele gosta da coisa! Seu apelido era “Pepita, a Santa” e dava pra todo o mundo no Ginásio do Padre! – Comentou outro rapaz, que nutria um ódio mortal por Pepe, desde que ele inventou certo boato e sua irmã ficou falada em toda a cidade. Naquele momento, aproveitou a oportunidade para dar o troco no sujeito.

O tempo foi passando, a notícia se espalhando e o boato sendo aumentado! A princípio o sujeito tentou reagir àquela “ignóbil calúnia”, distribuindo socos e pontapés em todos os caçoadores que ele encontrava em seu caminho. Pepe não podia compreender como um boato desses tivesse tamanha repercussão. E jamais poderia imaginar que a meiga Celeste tivesse alguma coisa com isso. Nos dias que foram sucedendo os acontecimentos, o sujeito foi acometido de uma terrível paranoia. Via inimigos em toda a parte e acabou achando que era coisa da ditadura militar, que vitimava a democracia, naquele período da vida brasileira.

Numa noite calorenta de sábado, perto do fim do ano, a rapaziada bebia alegremente no White Star, que estava repleto de estudantes comemorando o final do ano letivo. Na ocasião, Pepe Marreta estacionou seu carro na porta do bar e entrou olhando para todos com cara de mau. Já bastante embriagado, pediu uma “batida de limão”, tomando todo o copo de um trago só. De repente, sem que nada o provocasse, bateu com violência no balcão, gritando em alto e bom som:

- Porra!... Nessa merda de cidade não tem homem!

Silêncio total em todo o recinto! Ninguém se atrevia a contrariar o sujeito que, naquele momento, parecia uma fera preste a dar o bote! Depois de um curto momento, no qual, ninguém emitiu qualquer som, um rapaz magrinho, chamado Raimundo Meira, também embriagado, gritou mais alto ainda:

- Como é que é, porras?!... Vamos deixar um veado falar mal da gente?

Pepe quando ouviu aquilo, partiu em direção do rapaz como um touro na arena! Nesse instante, alguém lhe passou a perna e o sujeito foi cair numa mesa em que estavam acomodados três irmãos, famosos arruaceiros do Bairro Joaquim Romão! A briga que se seguiu então foi sangrenta. Os arruaceiros, ajudados por alguns estudantes, desferiram uma memorável surra em Pepe Marreta, o qual foi parar no hospital, bastante machucado! Logo após o final da confusão, alguém chegou ao bar, vendo tanto alarido, perguntou:

- O que houve por aqui?!

- Deram uma surra num veado chato! – Respondeu um bêbado!

Celeste ficou sabendo de todo o ocorrido. Sua vingança tinha sido totalmente consumada. Ela sentiu que um capítulo de sua vida tinha chegado ao fim. Saiu da cidade, progrediu na vida e hoje é uma empresária de sucesso no Rio de Janeiro!

Pepe Marreta desapareceu! Desmoralizado, foi embora para sempre de Jequié. Algumas pessoas comentavam que ele havia mudado de nome! Outras diziam que ele havia morrido de tanto beber! Ninguém sabia, ao certo, do seu distino. Um dia, muito tempo depois, alguém se recordou dele e fez o seguinte comentário:

- Êta veado valente, sô!

Esse Conto foi publicado no site londrino DinalvaArtsFacts, com vários comentários favoráveis, principalmente em Portugal.

(Esse conto faz parte do livro não publicado “Velhos Tempos Jequie)

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