J. B. Pessoa
Um
pote de ouro?!... Onde o senhor ouviu isso, seu João do Osso? Do meu irmão
Adonias?... Homessa! Eu já tinha até esquecido dessa história boba! Como?!...
Eu botei uma alma mal assombrada pra correr?!... Todos vocês querem ouvir o
caso? Pois bem, aí vai!
Essa
história aconteceu em novembro de 1951, semanas antes, da minha mudança para
essa maravilhosa cidade, que moramos. Pra início da conversa não se trata de um
pote de ouro, e sim, de um pote de barro cheio de moedas de ouro. Pois bem:
havia bastante tempo, que circulava por toda a região, que havia um pote cheio
de cheio de ouro, enterrado nas imediações de Iguatemi. Essa estória era
antiga, e antes do meu nascimento!... Segundo o povo, o grande fazendeiro
Aureliano Fernandes Amorim, que por sinal é bisavô de Tina, minha mulher, Teria
enterrado um pote cheio de moedas ouro, após o golpe militar que deserdou o
nosso grande monarca D. Pedro II, de governar o Brasil. Pois bem: a proclamação
da república pegou desprevenida a população sertaneja, que não entendia o que
estava acontecendo. Afinal, o imperador do Brasil não governava por direito
divino?!... Era o que clamava Aureliano, indignado com as noticias que lia nos
jornais, vindos da capital baiana.
Seu
moço!... Meus companheiros de prosas!... O que aconteceu naquela época ficou
marcado na memória do povo sertanejo. De repente, apareceram os fiscais
republicanos e começaram a cobrar impostos, os quais ninguém havia ouvido
falar!... Pegavam o pobre tabaréu e tomava dinheiro, a metade de suas criações
e sacos de mantimentos, alegando impostos de rendas atrasados. Verdade, seu
Manequito?!... O seu avô dizia que tomavam até doce das crianças?!... Exagero à
parte, contudo foi uma verdadeira derrama! O que há de verdade é que, o governo
republicano instituiu novos impostos, mas as cobranças ficaram a cargo de
fiscais corruptos, designados pelos governadores dos estados, como existem nos
tempos atuais.
Aureliano
Fernandes Amorim era um homem muito rico. Ele era proprietário de uma grande
fazenda, cortada pelo Rio São João, que separa os municípios de Brumado e
Livramento. A sua fazenda, denominada de Santo Inácio, era a mais progressista
da região. Produzia de tudo, pois era autossuficiente. Alem da cultura de
algodão, mamona e milho e culturas de subsistência, tinha uma tecelagem, que
fabricava os tecidos necessários do dia a dia e uma pequena metalurgia que
produzia ferramentas, tais como facas, facões, foices, martelos e quase tudo
que necessitava. Pois bem: segundo o povo, Aureliano, apavorado com os fiscais
republicanos, teria enterrado um grande pote de barro cheio de moedas de ouro.
Os mais antigos afirmam que ele morreu sem revelar onde tinha enterrado o
fabuloso pote de ouro. Dizem que a alma dele já apareceu a muita gente, na
intenção de revelar o local; porem, as pessoas fugiam da visagem, pois tinham
medo de almas penadas. O tempo foi
passando
e a lenda do pote de ouro suscitando casos de assombração, conforme o gosto do
proseador.
Em uma
segunda-feira, quando eu estava circulando pela feira de Iguatemi, apareceu o
meu jovem primo Abdias Matos, com um sujeito de um povoado chamado Barbosa. Era
um caboclo magro, de estatura mediana, que aparentava uns trinta e poucos anos.
Abdias me apresentou ao “barbozeiro” como um homem valente, que não tinha medo
de nada, nem de assombração, e nos covidou para tomar uns aperitivos no bar de
Quincas, onde se reuniam os nossos amigos e parentes, nos dias da famosa feira
de Iguatemi. Lá chegando, cumprimentamos a todos e nos sentamos em volta uma
mesa vazia, que ficava afastada das demais. Em seguida, depois de alguns tragos
de uma boa destilada, o sujeito, que atendia pelo nome de Nando, me fez uma
inusitada proposta!... Meus amigos: adivinhe qual foi a proposta?!... Isso
mesmo Seu João do Osso: encontrar o famoso pote de ouro.
O
barbozeiro me afiançou de que, o lendário tesouro existia, pois uma “alma
penada” contou pra seu tio. Era para ele ir buscar o tal pote e ficar podre de
rico!... Porem, ele não podia ir, pois é entrevado das pernas, e contou onde
ficava o pote com ouro, para o confiável sobrinho. O tio afirmou que o pote era
tão grande, que deixariam ricos, todos que o acompanhasse na inusitada
empreitada!... Seu moço, meus amigos aqui presentes, na medida em que tragava
os copos da branquinha, o sujeito ficava mais animado e elevava o tom da voz e,
de repente, todo mundo que estava bebendo no bar, ficou sabendo da história.
Animados
com aquela empreitada, alguns rapazes resolveram nos acompanhar, em mais uma
das minhas aventuras. Alguns, pois a maioria estava horrorizada com aquela
tarefa. Aliás, só há uma coisa, que o catingueiro tem medo: essa coisa é alma
penada. O tal Nando, marcou um encontro com a gente à meia noite; condição que
provocou a desistência de outros. Como era hora do almoço, me despedi de todos,
e segui para a casa de Belanisa, minha irmã, onde eu estava hospedado com minha
família, esperando a nossa viajem de muda para Jequié.
A
noite estava maravilhosa, com sua luz prateada iluminando a minha amada vila.
Era noite de lua cheia. Encontrei a rapaziada alegre, ainda tomando suas
destiladas, com muita animação. Abdias não estava com eles, pois não acreditava
naquela estória. “Né, isso aí é caso da carochinha”, Disse-me ele, quando se
despediu de mim, na hora do almoço. Pois bem: segui com aquela risonha
rapaziada, todos animados com a possibilidade de ficarem ricos. Quando o
barbozeiro disse, que o tesouro estava enterrado em uma cova, no cemitério da
vila, houve mais desistências. “Ótimo, assim vai sobrar mais ouro pra gente!”
Disse um dos rapazes mais afoito, o qual afirmava que já havia botado muito
Lobisomem pra correr. Assim, com apenas seis pessoas, contando comigo e o
barbozeiro, entramos no cemitério à meia noite em ponto.
A lua
continuava a brilhar, magnificamente, com um céu cheio de estrelas. Já dentro
do cemitério, notei que os quatro rapazes ficaram bastante
assustados
com o piar de uma coruja. De repente, a lua se escondeu por trás de uma nuvem
escura, e a noite ficou como um breu. Tirei uma lanterna de pilhas do bolso do
meu paletó e iluminei todo o percurso. Seu moço!... Meus companheiros de
prosas!... De repente, no clarear da lua, apareceu uma figura grande, toda de
branco, com uma vela acesa na cabeça, que gritou com uma voz cavernosa: “ O
ouro me pertence, e vou levar todo mundo pro o Cão!” Seu moço!... Os quatro
rapazes saíram “voando” do cemitério, apavorados com aquela figura sinistra, só
ficando eu e o barbozeiro, o qual emitia um leve sorriso, de quem esperava o
acontecimento. A seguir a “visagem” levantou os braços, ameaçadoramente,
aparecendo à barra da calça e os pés, calçados com uma alpercata catingueira.
Como percebi que se tratava de um embuste, saquei o meu revólver 38, e sapeque
chumbo quente nos pés da “alma penada”. Seu moço, meus companheiros de
prosas!... Dessa vez, quem saiu “voando” foi o barbozeiro, seguido pela alma
penada, que corria apavorada, a qual deixou cair seu chapéu de couro, com uma
vela apagada em cima. Era tudo uma mentira para pegar peças nos tolos. Como seu
Manequito?... Se a “visagem” era o primo de minha mulher e parente meu, Luis
Weisderland Amorim?!... Não! Nessa época, ele já estava casado com uma paulista
de Fernandópolis, morando naquela progressista cidade!
Pois
é, meus amigos!... Essa foi a “alma mal assombrada” que botei pra correr!...
Sinto muito se os desapontei, pois contei o “peixe pescado” e não aumentei o
tamanho!... Agora vamos tomar um cafezinho quente, que seu Otonho tem um causo
pra contar.
Décimo sétimo e último capítulo do livro não publicado: “ As Aventuras de um Catingueiro”.
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