Por Carlos Eden Meira
Ele ficava ali, sentado horas a
fio em um banco tosco, talhado num pedaço de tronco, sob a sombra de uma
frondosa gameleira. Barba, sobrancelhas e cabelos alvos, destacavam-se da pele
escura queimada de sol e marcada por um emaranhado de rugas, assemelhando-se a
uma figura esculpida em barro, com rachaduras provocadas pela constante
exposição ao sol.
Suas mãos, calejadas por anos de trabalho duro moviam-se com destreza no preparo de um cigarrinho de palha ("drobó"), picando o fumo de corda, cortando e alisando a palha com uma pequena faca bem amolada, que trazia sempre numa pequena sacola de tecido grosso, pendurada no ombro direito.
Ao seu lado, o inseparável
"radinho de pilha", sempre sintonizado em alguma emissora de São
Paulo, cidade de onde recebeu o radinho, enviado por um de seus netos que já
havia tempos, para lá viajara em busca de um sonhado emprego, numa
fábrica de biscoitos. Maravilha das maravilhas, o radinho tocava e cantava
lindas músicas que falavam de saudades do sertão, que o emocionavam, e às
vezes, o faziam chorar. Ah, mas também, contava "causos" engraçados e
falava sobre muitas notícias interessantes! "O compadre Quincas da Lagoa
Branca tem um um maior do que esse, mas, só toca música feia e só diz
mentira", afirmava ele. Se alguém perguntasse quais as mentiras do rádio
do compadre, ele dizia, revoltado: "Pois não é que uma vez, o danado do
rádio do compadre tava dizendo que os "gringos" tinham pisado na Lua? Onde já se
viu mentira mais cabeluda do que essa? A Lua é coisa de Deus e só quem pisa
nela é São Jorge! E as músicas que tocava? Tinha um tal de roque, roque, roque!
Parecia até rato roendo a parede! Meu radinho, não. Meu radinho é pequeno, mas
só fala verdade, só conta "causos" engraçados e só toca música
bonita! Eu contei isso pra Mestre Libório carpinteiro, e ele me disse que
depende da marca do rádio. Rádio de marca vagabunda é muito mentiroso e só toca
porcaria. O meu foi meu neto que enviou de São Paulo. É rádio dos bons"!
Concluiu sorrindo.
Ao anoitecer, levantou-se do tronco que lhe servia de banco, tendo o cuidado de não esquecer do seu querido radinho, o qual guardou carinhosamente em sua sacola que levava a tiracolo, dizendo: " É hora de ir pra casa, pois, quando escurece , isso aqui fica cheio de alma penada"! Quando alguém o questionava, afirmando que era preciso temer os vivos e não os mortos, ele rebatia: " Os vivos? Dos vivos, eu não tenho um pingo de medo! Eu tenho medo mesmo é dos mortos. Os vivos que se metem a besta comigo, eu corto no facão! Mas, quem já morreu não morre duas vezes. Deus me livre! Com alma penada eu não me meto! Boa noite e até amanhã"!
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