quarta-feira, 24 de dezembro de 2025

"JURA BOCA NUA"

                                               Por Carlos Eden Meira

Magrinho, sempre sorridente, pernas compridas e finas, pele escura demonstrando suas raízes afro-descendentes, queixo proeminente num rosto cuja boca, apesar da prótese dentária que usava, mostrava sinais de que por muito tempo ficara sem os dentes da frente, o que lhe valeu o apelido de "boca nua". Jurandir Alves Souza era seu nome verdadeiro, e era sempre visto prestando serviços diversos, a troco de algum dinheirinho ou pequenos presentes. Gostava de dar respostas interessantes, nas entrevistas aos radialistas seus conhecidos que o abordavam durante os programas de rádio transmitidos das ruas do centro da cidade, e ficava feliz quando alguns deles citavam o dia do seu aniversário.

Em homenagem a ele, no dia do aniversário, alguém dedicava "Jura", samba de Noel Rosa  e Sinhô, na versão cantada por Zeca pagodinho. Jurandir foi nosso colega na CDL, onde o pessoal curtia seu jeito "sui generis" de falar que era interessante. Aos sábados, pela manhã, Jura não hesitava em buscar uma feijoada e as cervejinhas, coisas que não dispensava nunca, pois, comer e beber era mesmo com ele. Quando alguém, por brincadeira, dizia que não ia mais ter feijoada nem cerveja, ele fechava a cara e resmungava o tempo todo. Ali, no Calçadão da Sete de Setembro, Jura era conhecido por todos. Dos lojistas aos  funcionários das lojas. Creio que em Jequié, pouca gente não   conhecia "Jura boca nua".

Não tenho certeza de nada, quanto ao que nos acontece quando deixamos este mundo. Apesar de não ser ateu nem materialista, creio que céu e inferno são simbolismos que representam nossa própria condição humana. Não me considero capaz de definir os valores que determinam a felicidade ou a infelicidade de alguém, pois, conheço pessoas que se alegram com o mínimo, enquanto outras buscam desesperadamente encontrar a felicidade no luxo e na riqueza. Acabam perdidas no vício e nos excessos que a fortuna lhes proporciona, tornando-os infelizes. É claro que pobreza não traz felicidade a ninguém, e se o simples fato de ser rico trouxesse infelicidade, ninguém iria querer ganhar o prêmio máximo da loteria.

Entretanto, estes não são fatores imprescindíveis para determinar o que leva uma pessoa a se considerar feliz ou infeliz. Jurandir Alves Souza era um cidadão pobre, mas não me parecia uma pessoa infeliz. Pelo contrário, estava sempre alegre, gostava de cantar enquanto trabalhava. Só ficava visivelmente aborrecido, quando alguém atrasava o pagamento por um serviço prestado.

Na sua existência simples e humilde, viveu do seu jeito, a vida que o destino lhe reservou. E se houver num outro "plano astral" um mundo melhor do que este em que vivemos, Jurandir, com certeza está por lá.

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