sexta-feira, 12 de setembro de 2025

ADMISSÃO AO GINÁSIO.

                                        Carlos Eden Meira



Foi um golpe de sorte? Só Deus sabe. Quando fiz o quinto ano primário no Grupo Escolar Castro Alves, estudei no livro "Programa de Admissão ao   Ginásio".

Era um livro grosso de capa dura, contendo toda a programação para o concurso de admissão. No ano em que fiz o concurso, duas matérias eram  eliminatórias: Português e matemática.  Matemática era apavorante para mim. Sofria horrores na sala de aula durante as chamadas "sabatina de  tabuada". Na minha sala não tinha palmatória, mas um aluno chamado Balbino, pra fazer média com a professora, providenciava umas réguas grossas e pesadas o que servia de palmatória. Balbino esperava ganhar uns pontinhos em matemática, com esse maldito artefato. O aluno que errasse a resposta levava a reguada na palma da mão aplicada pelo aluno que perguntava. Quando era minha vez, eu apanhava um bocado. Principalmente quando se tratava de tabuada de multiplicação ou divisão.

Havia um colega, garoto gordinho, muito parecido com Oliver Hardy da dupla O Gordo e o Magro, que apanhava mais do que eu. Acontece que a professora fazia também sabatina de verbos e o gordinho era fraco nas duas coisas. Eu, me saía bem na sabatina de verbos, pois era bom em gramática. Balbino era fraco nas duas coisas também, mas como puxa-saco que era, esperava que a professora lhe desse os tais pontinhos esperados. O problema é que ninguém queria bater com força na mão dele que ameaçava: "Bate de leve, senão, na saída eu te pego".

Garoto franzino e tímido como eu, tinha que aguentar essas coisas na escola e também fora dela. No cinema, por exemplo, levei muito "peteleco" na orelha por qualquer que sentasse atrás de mim. Um cara que eu nem sei quem era, chegou a dizer que iria me escorraçar da cidade!! Imagine só! Havia também, um colega que era fã de Chubby Checker, fortão, mais velho e muito maior do que eu que tomava os gibis que eu levava pra trocar na porta do cinema.

Aconteceu que quando passei no exame de admissão ao ginásio no IERP fiz a melhor prova de Português da minha turma. Se matemática  era também matéria eliminatória, eu fiz uma péssima prova, mas tive a média necessária, e passei na de Português com boas notas. Na verdade, eu nem perdi tempo estudando matemática. Já matriculado na primeira série , tive uma  mudança de personalidade. Me sentia  forte, não fisicamente. Era uma espécie de revolta interior causada  pelo trauma que passei no curso primário, nas sabatinas de tabuada.

Procurei me enturmar o máximo possível com colegas iguais a mim, que também sofreram violência, no curso primário. Agora, já adolescentes, não queríamos levar desaforos pra casa. Quaisquer ameaças dos fortões, teriam que ser rebatidas à altura. Um grande amigo meu que estudava numa sala vizinha, tinha uma soqueira (soco inglês) de metal. Quando fui ameaçado por um colega de sala, considerado bom de briga, e que, induzido por uma fofoca de que eu estava paquerando a namorada dele, me questionou sobre o assunto.

Maria Lícia, era minha colega de sala. Quando perguntei se ela  namorava com  Jonathan, ela disse que não. Ela fazia parte da minha equipe de estudos, nas aulas de Francês. Acho que foi esse o motivo da fofoca. Procurei o Jonathan e perguntei se era verdade que ele iria me encher de porrada. Ele, calmamente, falou que nunca lhe passou pela cabeça essa tal ideia. De qualquer forma, passei a andar de Soqueira no bolso e uma pequena faca bonita, toda niquelada, numa bainha de couro que eu levava em minha pasta, escondida entre os livros.

Era uma época em que a rapaziada fazia questão de andar em grupos  fazendo badernas pelas ruas à noite. Por isso, andar com faca ou canivete, era comum. Eu não era chegado a esse tipo de atitude. Até aconselhava os amigos a evitar coisas erradas como esvaziar pneus, tocar as campainhas das casas e sair correndo, roubar melancias na feira, quebrar vidraças, e outras bagunças. Naquele ano, Jonathan já nem era mais meu colega de sala, nem a Maria Lícia. A última vez que a vi, foi na festa de despedida do quarto ano, na casa de um dos colegas. Ela me deu um presentinho, dançou comigo e disse baixinho: "Abra somente quando chegar em casa".

Ao chegar em casa lá estava um chaveirinho com meu nome gravado, e um bilhete dela dizendo: "Eu gosto muito de você. Pena é que eu vou me mudar pra outra cidade com minha família". Mas não disse o nome da cidade. 


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