Por Carlos Eden Meira
Depois da enchente de 1914,
conta-se que foi a de 1942, a segunda mais rigorosa enchente que atingiu
Jequié. Sendo assim, durante muitos anos antes da construção da Barragem da
Pedra, os moradores sentiam-se ameaçados por quaisquer vestígios de chuvas mais
intensas nas chamadas “chuvas das águas” que começam nos meses de fim de ano,
até os primeiros meses do ano seguinte. Quando nuvens escuras se formaram a
oeste da cidade, naquele ano no final dos anos 50, houve uma espécie de pânico,
pois diziam que localidades vizinhas na região da caatinga, já estavam debaixo
d’água. Diziam, inclusive, que houve um corre-corre desesperado de algumas
pessoas estocando alimentos, achando que a enchente atingiria o centro da
cidade, destruindo lojas e armazéns.
Tal boato fez com que meu pai,
pessoa precavida, chegasse à conclusão de que nesse desespero poderia faltar
açúcar, pois, disseram que as pessoas em pânico corriam ao armazém da Magalhães
S.A. na esquina da João Mangabeira com a Felix Gaspar, e compravam sacos e mais
sacos de sessenta quilos de açúcar. Meu avô, experiente em observar formação de
chuvas na região, duvidava que houvesse tal enchente; sorria satisfeito com as
perspectivas de chuvas que beneficiariam a lavoura e o pasto na zona rural da
caatinga, e divertia-se com o exagero do boato, inclusive com a preocupação do
meu pai.
Mesmo assim, meu pai mandou que
eu e meu irmão Raymundo, fôssemos (imaginem) de bicicleta, comprar um saco de
açúcar de sessenta quilos no tal armazém. Lá fomos, Raymundo no “guidom”, eu no
bagageiro, descendo em maluca disparada a bastante íngreme ladeira da antiga
Rua Laudelino Barreto, que começava no também antigo Alto da Bela Vista, em
direção ao centro. Um perigo doido, coisa que meu pai não viu, mas para nós
garotos, era muito divertido. Entretanto, quando chegamos ao armazém e os
vendedores que ali trabalhavam viram que o transporte do açúcar seria via
bicicleta, foi muita gozação.
Rindo muito, os rapazes do
armazém colocaram o saco atravessado sobre o “quadro” da bicicleta e improvisaram,
não sei como, uma corda para amarrá-lo. Difícil, no entanto, foi voltar a pé
pra casa, empurrando essa bendita bicicleta e sua pesada carga, ladeira acima.
Raymundo suando e resmungando muito, empurrando o “guidom”, e eu retado da
vida, “botando os bofes pela boca” a empurrar o bagageiro, tendo ainda que
aguentar as gozações e piadinhas das pessoas que passavam por nós e gritavam
rindo:
- Ô do açúcar, “a cuma” é o
quilo?
- Meninos, quanto querem para
levar dois sacos destes lá no Alto da Balança?
- Gente, olha uma bicicleta
movida a açúcar!
Choveu bastante naquele ano, mas a tal enchente não veio mesmo. Em compensação, lá em casa, passou-se muito tempo sem comprar açúcar.
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