J. B. Pessoa
A
preocupação com o ensino no Brasil vem desde os tempos coloniais. A Coroa
Portuguesa, em parceria com a Igreja, enviou para a colônia muitos jesuítas,
alguns dos quais se tornaram famosos, a exemplo de Manoel da Nóbrega e José de
Anchieta. Durante mais de um século, a Companhia de Jesus cuidou da
catequização dos nativos e da escolaridade dos colonizadores, até o início da
era pombalina. Após a reforma educacional realizada pelo Marquez de Pombal, em
cujo contexto social estava presente as ideias absolutistas, porém inspiradas
pelo iluminismo, o governo português buscou empreender reformas em todas as
áreas da sociedade portuguesa, atingindo o Brasil como colônia, visando dar-lhe
uma unidade política com sua metrópole. Na época do Reino Unido Brasil, Portugal
e Algarves a educação primária e secundária não foi modificada; D. João VI deu
mais ênfase na expansão do ensino superior. Entretanto, implantou mais escolas,
criando as “Escolas Reunidas”, estabelecendo a gratuidade dessas escolas em
todo o Reino Unido.
Durante
o Império Brasileiro houve uma expansão considerável do ensino primário. A
Constituição de 1824 manteve as resoluções do Reino Unido, como o princípio da
liberdade de ensino, sem restrições, e o designo de instrução primária gratuita
a todos os cidadãos. A aprovação da primeira lei sobre o Ensino Elementar em
1827 manteve essa determinação, como também, a criação escolar das “Primeiras
Letras” em todas as cidades, vilas e povoados, assim como “Escolas de Meninas”
nas cidades mais populosas. Contudo, apenas 10% da população em idade escolar
se matricularam nas escolas elementares.
Em
1832 havia em todo o Brasil 162 escolas para meninos e apenas 18 para meninas.
A razão de haver essa diferença enorme deve-se o costume de que a educação
feminina era relegada as prendas domésticas, motivo pelo qual haver um número
deficiente de professoras em todo território nacional. Na ausência de formação,
os professores eram selecionados a partir de três condições: maioridade,
moralidade e capacidade. Havia poucas escolas de Ensino Normal. A primeira
escola de formações de professores destinados a lecionarem nas escolas
primárias, - as chamadas “escolas normais”- foi fundada em 1835, sendo a
primeira, a Escola Normal de Niterói. No campo do ensino secundário, surgem os
liceus, correspondentes ao que mais tarde foram cognominados de Ginásios. Havia
no Brasil, poucas escolas denominadas “Escola Normal”, razão pela qual foram
citadas as três condições acima, conhecidas como método lancasteriano. Visando
criar mais condições para que a reforma do ensino primário desse certo, em 1837
é criado o Colégio Dom Pedro II, que serviu de modelos para outros; um centro
formador de professores, que exigia sete anos de estudos para conferir o
diploma de bacharel em letras, o que dava o direito a lecionar para o curso
primário. Os concluintes do Colégio Pedro II passaram a ter o privilégio de
matrículas, sem exames, em qualquer escola superior do Império, tornando-se a
única instituição escolar a ter tal prerrogativa. Por essa época, em todo o
império, as escolas primárias e secundarias particulares só empregavam
professores de nível superior; chegando, muitas vezes, a importar mão de obra
de países europeus,
principalmente
da França e Inglaterra. Até a fundação do Colégio Dom Pedro II, a profissão
docente era exclusivamente masculina. A mulher podia ser tutora, mas nunca uma
professora.
Em
1854, D. Pedro II, então já há alguns anos no poder, reformulou o conteúdo
ministrado e a própria estrutura do ensino básico. O ensino elementar passou a
chamar-se ensino primário e, apesar de ter duração variável de aluno para
aluno, a rigor passou a durar quatro anos, sendo dividido em elementar e
superior. No superior estas mesmas disciplinas se desdobravam dando origem a
dez disciplinas. No elementar passaram a serem ministradas as disciplinas de
instrução moral e religiosa, leitura e escrita, noções essenciais de Gramática,
princípios de Aritmética e sistema de pesos e medidas, sendo regulamentada a
exigência do diploma primário para poder ingressar no secundário.
Como
podemos observar, sempre houve uma preocupação dos governantes desse imenso
País, com a formação escolar do povo brasileiro. Apesar de haver certas
controvérsias, tornam-se necessárias esclarecer, que tudo que se diz a respeito
da Historia, deve-se considerar o Tempo e o Espaço, sem a visão paradoxal de
ideias pré-concebidas. Essa preocupação continuou com o advento da República, a
qual procurou associar a educação como um todo, conforme as concepções
positivistas. Houve reformas, mas sempre sob os princípios adotados pelo novo
regime, o qual tinha como meta implantar um ensino eficiente, com um currículo
unificado para todo o País, surgindo assim, os competentes grupos escolares.
Os
grupos escolares precedem das antigas “escolas reunidas” da época do Reino
Unido. Foram criados em 1893, visando reunir escolas isoladas de uma região
comum. Surgiram no Estado de São Paulo e mais tarde foram introduzidos em Santa
Catarina (1911). Seus idealizadores visavam criar espaços de educação continuada,
simultaneamente à de formação de professores. O modelo foi adotado
exclusivamente no meio urbano, visto que na zona rural, o método era
sofisticado demais, pela inexistência de um corpo discente mais elevado. As
escolas isoladas persistiram por muito tempo, durante todo o século XX.
Mais
sofisticados do que as antigas escolas reunidas, os grupos escolares foram
criados para serem instituições de referência em todo território nacional. A
edificação de um prédio escolar próprio, com um mobiliário adequado às
necessidades dos alunos e com uma metodologia de ensino inovadora, tornou-se
concisas. A essas características acrescentam-se os preceitos de Higiene, a
qual se fez presente à construção do prédio e do ambiente escolar como um todo.
Os grupos escolares, tanto pelo ambiente adequado e pela metodologia de ensino
moderna, revolucionaram o ensino público primário brasileiro, assegurando a
gratuidade e direito de todos, no período conhecido como Republica Velha.
A
partir da Revolução de 1930, início da Era Vargas, surgem às reformas
educacionais mais modernas. As questões educacionais começaram a ser o centro
de interesses dos intelectuais, tais como: Lourenço Filho, Fernando de Azevedo,
Anísio Teixeira, entre outros. Sendo assim, o governo criou em 14 de novembro
de 1930, o Ministério dos Negócios da Educação e Saúde Pública, tendo como
ministro Francisco Campos, que criou um Plano Nacional de Educação,
influenciado pela chamada Escola Nova, a qual cuidava também da
Educação
física dos alunos, dentro da filosofia grega de “mente sana, corpus sano”. O
governo brasileiro se preocupando com a emergência de um país
urbano-industrial, de acordo com as necessidades nacionais, deu um grande
impulso na área da educação. Em 1931 foi instituído o exame de admissão ao ginásio,
visando um estudo mais apurado do primário, para se chegar ao secundário. Os
grupos escolares foram modernizados, com amplas salas, áreas recreativas e
ambientes adequados às vicissitudes climáticas de cada região. Dentro desse
contesto, surgiu o Grupo Escolar Castro Alves.
Depois
da grande enchente que destruiu quase toda a cidade, Jequié foi reconstruída
nas áreas mais elevadas. O antigo cemitério, que ficava em um local inadequado,
foi removido para um ponto distante. Projetada por profissionais competentes,
tendo à frente o engenheiro Alberto Leal, sob o comando do maior benemérito
jequieense, Vicente Grillo, a cidade ressurgiu mais bela do que antes. Dotadas
de amplas praças e largas avenidas, a Cidade de Jequié tornou-se motivo de
orgulho de seus habitantes. Nas imediações do seu antigo campo-santo surgiu uma
grande praça, onde foi edificada em sua parte mais alta, a nova igreja matriz,
ainda sem o projeto arquitetônico de André Safrey. No local onde situava a
antiga necrópole da cidade foi erguido, muito tempo depois, o prédio do Grupo
Escolar Castro Alves.
Fazendo
parte dos ideais da política revolucionaria getulista, Jequié ganhou em 1934
uma verdadeira obra faraônica para a época. Construído pelo Governo da Bahia,
tendo a frente o interventor estadual, o Capitão Juracy Magalhães, na gestão do
então intendente municipal João Carlos Borges de Souza, esse majestoso prédio
foi projetado pelo competente engenheiro Álvaro Ramos. A construção do Prédio
obedeceu aos novos conceitos do momento, o qual teve como projeto arquitetônico
o estilo eclético. A obra foi iniciada em 1933 e inaugurada com louvor em 19 de
agosto de 1934, com as presenças de Juracy Montenegro Magalhães, João Carlos
Borges de Souza, Virgilio de Paula Tourinho e demais autoridades estaduais e
municipais, conforme fotografias existentes no Museu Histórico de Jequié.
Ao
contrario da Igreja, o prédio escolar foi edificado na parte mais baixa da
praça, não fazendo esquina com nenhuma rua. Assim sendo, foi projetado como se
tivesse duas frentes. Uma dava para a Avenida Rio Branco, a qual é a frente
principal, com um grande pátio existente até os dias atuais. A outra frente, a
qual dava para a Praça Castro Alves propriamente dita, existia outro grande
pátio, com um muro largo e baixo, portando uma pequena escadaria no meio,
delimitando a área do Grupo Escolar Castro Alves; local onde eram realizadas as
festas promovidas por essa famosa escola. Esse pátio, que era maior do que o da
frente, usado pela meninada jogar bola, foi destruído por imposição da
Catedral, que construiu numa área pertencente à escola, a chamada “Concha
Acústica”. Na época em que foi inaugurado o Grupo Escolar Castro Alves, não
havia surgido, ainda, o quarteirão onde foi construído o Cine Teatro Jequié
(1948) e, muito menos, as ruas denominadas de Rua Dr. Virgílio Tourinho e Rua
Trecchina. Sendo assim, com o tempo, a parte voltada para a igreja matriz, hoje
catedral, ficou sendo considerada com o fundo do prédio.
Os
primeiros estabelecimentos escolares que apareceram em Jequié foram frutos da
iniciativa privada. As escolas eram primarias, sendo algumas delas
subvencionadas pela prefeitura, que funcionavam na sede do município e
em
alguns povoados. O ensino era considerado de ótima qualidade. A primeira escola
da cidade, sem a menor dúvida, foi dirigida pelo seu proprietário e primeiro
professor de destaque da região, Damião Vieira, que já vinha atuando como
educador primário, antes da emancipação da cidade. Uma das figuras mais
importantes no alvorecer da escolaridade municipal foi a grande educadora
Eulina Alves de Queiroz, irmã do médico e político Dr. José Alves Pereira. Ela
foi a primeira professora formada a exercer o magistério em Jequié. A
professora Eulina fundou no início do século, uma escola particular feminina,
tornando-se uma mestra querida, que muito contribuiu na formação de diversas
cidadãs jequieenses. Nessa mesma época, surgiu, também, outro estabelecimento
de ensino, dirigido pelo grande educador, professor Antonio Tobias Lopes
Ribeiro, que fundou uma escola particular primária para o sexo masculino,
contribuindo, também, na formação escolar de muitos dos seus concidadãos.
As
escolas particulares jequieenses continuaram existindo, após o surgimento de
uma grande escola pública. Havia inúmeras delas na cidade. Das mais
sofisticadas, com professoras renomadas, portando diplomas de magistério,
formadas em uma Escola Normal, às “professoras” humildes, que lecionava para
camada mais pobre da sociedade.
Como a
cidade de Jequié sofria, na maior parte do ano, um calor intensivo, o Grupo
Escolar Castro Alves foi projetado dentro dos princípios adequados “às
vicissitudes climáticas de cada região” tornando-se o principal estabelecimento
escolar primário da cidade, em todos os tempos. Todo o prédio, onde hoje
funciona o Museu Histórico João Carlos Borges, é amplo e arejado. Dotado de
oito salas espaçosas, as quais podiam compor, confortavelmente, cinquenta
alunos, o prédio foi dividido em duas partes: uma ala feminina e outra
masculina, conforme as concepções adequadas à moralidade da época. Entretanto,
segundo informações de antigos estudantes, tais ditames não foram regiamente
seguidos, pois nos anos 50 as salas escolares já eram mistas. Entre as salas de
cada ala, tanto na masculina como na feminina, há dois amplos espaços, que eram
utilizados para recreações e ordens unidas. Cada ala era dotada de nove
sanitários, perfazendo dezoito em todo o prédio. Entre as alas há uma sala
especial, com janelas para ambas as partes, a qual foi aproveitada como uma
biblioteca escolar. Na parte onde fica o porão, há duas salas que foram
utilizadas, mais tarde, como salas de aula, hoje usadas como reserva técnica do
museu.
Em
suas salas, esse glorioso prédio recebeu inúmeros alunos, de todas as camadas
sociais e contribuiu, de sobremaneira, na formação primária dos principais
cidadãos ilustres de Jequié. Todos os alunos eram tratados iguais e sem
discriminações. Contudo, se podia notar a classe social de cada criança pela
farda escolar, principalmente das meninas. Embora iguais para todas, com saias
em azul-marinho e blusas brancas, os tecidos eram diferentes; os quais iam do
modesto
brim e tecido de algodão, aos ricos tecidos de cambraias de linho e a nobre
casimira.
Durante
mais de meio século em atividade, lecionaram em suas salas, brilhantes
professoras, como: Alíria Argolo, Florípedes Sodré (professora Sinhá), Glória
Fraga, Georgina Pereira, Anita Rabelo, Dalva Pinto, Altamira Marioti,
Natividade Pereira, Adalgisa, Laura Scaldaferri, Helenita Costa Brito, Raimunda
Gouveia, Mimi Eloy, Lígia Munhoz, Emilia Ferreira, Maria Ferreira de Souza
(professora Ferreirinha), Tânia Rabelo, Maria Adélia Aguiar Ribeiro, Noélia
Pessoa, Elisa tourinho, Guaracy, Mary Rabelo, entre outras.
A
partir da sua inauguração, o Grupo Escolar Castro Alves tornou-se o referencial
da cultura jequieense. Juntamente com a Igreja Matriz e o Edifício Vicente
Grillo, foi considerado um dos cartões postais da cidade. Em 14 de março de
1947, a escola homenageou o poeta Castro Alves com uma placa comemorativa pelo
seu centenário de nascimento. O curioso é notar que a palavra Jequié ainda era
ainda escrito com a grafia “Jiquié” com “I”. Depois da conclusão dos
tupinólogos, que o topônimo Jequié originou-se do vocábulo tapuia jaquieh
(onça) e não da palavra tupi jequi (armadilha para apanhar peixe), outra placa
foi colocada (1949) homenageando o Poeta dos Escravos com a palavra Jequié,
escrita como é atualmente.
Durante
as décadas de 30, 40, 50 o Grupo Escolar Castro Alves foi uma referência em
toda a região, como uma escola preparatória para o exame de Admissão ao
Ginásio. Como estava sobrecarregada de alunos, o então prefeito municipal
Ademar Nunes Vieira, inaugurou (1958), no Bairro Joaquim Romão outro grupo
escolar, o qual leva o seu nome.
A
partir de 1960 foram surgindo outras escolas nos bairros jequieenses. O Castro
Alves continuava a ter mais destaque do que os outros grupos, pois além de
estar situado em uma área nobre, contava com um corpo docente mais competente e
famoso. Com a reforma de 1971, o Governo Civil- Militar instituiu uma mudança
no ensino do primeiro e segundo graus, colocando o curso primário e ginasial
juntos. Nessa reforma foi subtraído um ano do curso primário (quinto ano), o
qual não mais necessitava de um diploma, abolindo o Exame de Admissão ao
ginásio, criando, assim, o ensino fundamental. Dentro dessa diretriz, o
conceito de grupo escolar e ginásio ficaram obsoletos. Mesmo assim, o dinâmico
Castro Alves continuou atuando, cujo corpo docente só lecionava os quatros
primeiros anos do ensino fundamental.
Obedecendo
as considerações pragmáticas da reforma, novos centros educacionais foram
aparecendo, unindo o ensino fundamental com segundo grau, sendo o último,
técnico ou preparatório para a opção universitária. Os novos colégios
municipais e estaduais foram sendo construídos nos bairros e
subúrbios
da cidade, onde residiam os estudantes em geral. Com o tempo, o Grupo Escolar
Castro Alves foi perdendo o seu aparato anterior, ficando considerado
inadequado pelos educadores modernos. Sendo assim, a velha escola foi
desativada em meados dos anos 90. A partir de então, o prédio ficou no mais
completo abandono, a ponto de ter suas estruturas comprometidas com a
implacabilidade do tempo.
Havia
alguns anos que o dinâmico jornalista Raymundo Meira alimentava o sonho da criação
de um museu histórico para a cidade. A ideia era antiga. Surgiu do ideal de um
grupo de jornalistas liderados por Henrique Meira Magalhães, Eusino Soares,
Leonel Ribeiro de Oliveira e Adauto Cidreira. Raymundo, em parceria com a
professora Eronildes Ribeiro Santos, e da ajuda de decididos cidadãos
Jequieenses, criou a ASSAM, a qual detinha um grande acervo da memória da
cidade. A ASSAM criou o Museu Histórico de Jequié, que foi abrigado nas
dependências do Grupo Escolar Castro Alves, já totalmente reformado e
restaurado.
Bibliografia.
A Nova
Historia de Jequié e Capítulos da Historia de Jequié de Emerson Pinto de
Araújo, Fatos Pitorescos da Cidade Sol de Raimundo Meira; Geografia da Bahia de
Fernando Floriano Rocha; Geografia da Bahia de Olga Pereira Meting; Revista de
Jequié – Informativa de 1970 – Gestão: Waldomiro Borges; Jequié, Síntese
Histórica e informativa de 1992 – Gestão: Luis Amaral e um livro de pontos para
o curso primário, editado nos anos 50 pela Tipografia Sudoeste. Enciclopédia
Delta Larousse, Coleção Conhecer e Coleção Nosso Século da Abril Cultural.
Este trabalho contou com a colaboração de Antonio Varjão Matos, museólogo e coordenador do Museu histórico de Jequié. Foi concebido, visando o tombamento de um dos poucos prédios antigos, que ainda existe na cidade de Jequié.
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