sábado, 15 de agosto de 2020

O Final dos festejos.

J. B. Pessoa

Capítulo - 44 do livro " Guris e Gibis".

O anoitecer despontou esplendorosamente colorido, parecendo que o santo do dia agraciava os seus fiéis com um maravilhoso céu coberto de estrelas. Fazia pouco frio e não havia sinais de chuvas para aquela noite. Oficialmente o outono estava chegando ao fim, apesar do inesperado frio abater-se sobre a cidade, desde o início do mês, contradizendo as normas climáticas, numa condição totalmente irregular; já que nessa época, os primeiros dias de junho costumavam ter uma temperatura mais condizente com a situação geográfica da região. Entretanto, para os habitantes de Jequié, outonos e primaveras eram estações sem sentido, que só existiam mesmos, para serem comemorados nos dias de festas escolares. Na Zona de Jequié só se sentia duas estações: verão no final e começo de cada ano, e inverno no meio do ano, que começaria na época do São João. Contudo, para os roceiros em geral, as duas estações eram cognominadas como a da seca e a das águas, sendo que, as chuvas de verão, que aconteciam entre o final de um ano e começo do outro, eram denominadas pelos catingueiros de invernadas, e não era incomum, a temperatura cair bastante nos meses de outubro e novembro e, às vezes, em dezembro e janeiro. O inesperado frio, que aconteceu na cidade, parecia ter sido fruto de uma corrente vinda do continente Antártico, atingindo a maioria dos municípios circunvizinhos e que, naquele momento, havia sido dissipada em direção ao mar.

A praça estava bastante movimentada, num vai e vem de pessoas, as quais passeavam pelo jardim à procura de flertes ou aventuras amorosas. Casais de namorados sentados em seus bancos dedicavam músicas românticas a seus consortes, através do alto falante da quermesse. O Cine Teatro Jequié continuou a exibir gratuitamente, o famoso filme em sua sessão de soirée, atraindo os adultos para sua sala de projeção. A boemia jequieense se concentrava no Bar Joly, enquanto na Confeitaria Cristal, rapazes e moças da distinta sociedade trocavam flertes ao sabor de um chocolate quente.

Johnny chegou bem cedo na praça, naquela última noite dos festejos de Santo Antonio. Sua intenção era encontrar Berenice, antes de Luis, para poder ficar a sós com sua pequena, nem que fosse por breves instantes. O relógio da matriz badalava às sete horas, quando ele encontrou a turma da Siqueira Campos, sentada nas escadarias do “Colarinho Saback”, na companhia de Orlando, Bill Elliott e alguns colegas do Castro Alves. Os garotos haviam continuado na praça, desde o final da matinê, preferindo não ir para casa e fazer suas refeições nas barracas das baianas, que naquele mês, além do tradicional acarajé e abará, serviam iguarias típicas das festas juninas. A garotada ficou exultante em ver o amigo; principalmente Tõe Porcino, o qual foi o primeiro a lhe fazer festas, usando expressões peculiares das histórias em quadrinhos:

- Macacos me mordam se não é o meu amigo Johnny the Kid!

Johnny abraçou o garoto e, sorrindo dos seus jargões infantis, entrou no jogo:

- Caramba!... É um pássaro?... É um avião?!... Não! É o meu amigo, o Super Porcino!

A meninada desatou a rir, embarcando no gracejo dos dois. Géo, também querendo participar da brincadeira, começou a imitar um mocinho do faroeste. Orlando sorrindo com desdém do garoto, comentou para Mipai:

- A viadagem começou!...

Mipai riu bastante com aquela chacota. Escutando o comentário, Géo encarou Orlando, perguntando:

- Começou o que sujeito?!

Orlando, fazendo ar de desentendido, respondeu:

- A vadiagem! Vamos todos vadiar que essa é a última noite de farra. É pena que eu vá ter que cantar a noite inteira!

- Bill Elliott interveio na conversa para evitar brigas e, olhando sério para Orlando, ponderou:

- Bom para você que está ganhando dinheiro; enquanto isso, a gente está gastando!

Géo olhou para Orlando com rancor, sentindo uma profunda antipatia pelo rapaz. Contudo, procurou não dar importância ao caso, pois não queria estragar aquela noite maravilhosa, cheia de meninas bonitas, passeando pelo jardim. Enquanto a garotada comentava as últimas notícias do seu mundo juvenil, Bill chamou Johnny à parte e segredou-lhe ao ouvido:

- Berenice pede para você encontrar-se com ela no Bar Vermelho!

Johnny olhou admirado para o amigo. Não esperava um recado de Berenice vindo por ele. O rapaz percebendo a sua surpresa, bate sorrindo no seu ombro em sinal de cumplicidade, dizendo:

- Estou sabendo de tudo, pois Eva me contou! Estamos torcendo por vocês!

- Obrigado! Você não imagina como estou precisando disso! – Disse Johnny, animado com a novidade. Depois pergunta ao amigo:

- A que horas devo me encontrar com ela?

- Agora mesmo. Eva e Berenice estão esperando pela gente!

O garoto ficou bastante contente com aquela notícia. Imediatamente despediu-se dos amigos e partiu na companhia de Bill Elliott em direção ao Bar Vermelho. Embora estivesse situado no centro da cidade, e em dias normais fosse bastante freqüentado; naquele momento, o bar se encontrava um tanto vazio, pois o cerne das atenções era a Praça Ruy Barbosa. Havia poucas pessoas transitando naquela parte da avenida, que ficava distante da quermesse. Os garotos entram no bar e cumprimentam alguns adultos, que tomavam seus cafezinhos em pé, junto ao balcão. Johnny avistou Berenice na companhia de Eva Marli, sentada em um canto da sala, usando uma das poucas mesas, daquele modesto estabelecimento. O garoto ficou deslumbrado ao ver sua namorada. Berenice estava mais linda do que nunca e, antes que ele pudesse dizer-lhe alguma coisa, ela beijou ardorosamente os seus lábios.

A emoção sentida naquele momento ficou guardada como um relicário de amor, no coração de um garoto, que atingia a adolescência com uma paixão devaneadora. Tudo aquilo parecia um sonho. Ele mesmo, já havia tido devaneios parecidos com aquela realidade e, por um instante, temeu um triste despertar. Berenice aconchegou-se nele abraçando-o ternamente, ficando os dois naquele deleite, por imensuráveis segundos, esquecendo-se de tudo e de todos.

Eva Marli, sentindo a curiosidade de alguns adultos no recinto, em torno dos jovens namorados, adiantou-se em separar o casal e, de maneira harmoniosa, disse com humor:

- Jovens! Vocês estão proporcionando cinema grátis para todos!

Berenice riu bastante de tudo aquilo. Apesar de ser uma garota extrovertida, estava admirada com a sua própria ousadia. Tinha treze anos de idade e sabia que eles eram jovens demais para aquelas manifestações ardorosas. Contudo, deu de ombros, não se incomodando com as bisbilhotices dos outros. Estava demasiadamente feliz com o seu belo garoto, a quem amava com doçura e era amada por ele. Johnny permaneceu abraçado a Berenice, fitando os seus lindos olhos azuis, enquanto acariciava ternamente os seus doirados cabelos.

Bill Elliott estava surpreso com a desenvoltura do amigo. Como era possível que um garoto tímido como Johnny, poderia ter uma ventura daquelas. Ele sabia que era mais audacioso do que a maioria dos garotos; entretanto, não havia, ainda, beijado a sua namorada. Eva Marli convidou os dois para sentarem-se naquele momento. Olhou ao seu redor e verificou que, as poucas pessoas ali presentes não estavam sendo indiscretas e não se incomodavam com a presença dos atrevidos adolescentes. Apesar do nome, o Bar Vermelho era na realidade um misto de taberna, mercearia e confeitaria ao mesmo tempo. A maioria das pessoas que o frequentava morava nas suas adjacências e muitos eram profissionais liberais, que tinham uma visão mais condizente com a época em que estavam vivendo.

Os garotos, acomodados naquela parte do estabelecimento, começaram a papear sobre as coisas corriqueiras do ambiente escolar. Eva Marli chamou a moça que estava servindo e pediu o quitute mais famoso da casa. Aconselhando os seus amigos a fazerem o mesmo, disse com convicção:

- Aqui serve a melhor pamonha de toda a região!

- Eu adoro pamonha e todas as iguarias que vem do milho! – Disse Bill que, apesar de ter pais italianos, em sua casa era mais freqüente, a cozinha regional do sudoeste baiano. Johnny, que havia sido criado na roça, adiantou com sabedoria:

- Não só de milho, como também de mandioca e batatas!

- Humm!... Um beijuzinho com manteiga de garrafa dá água na boca de qualquer cristão! – Completou Bill esfregando as mãos com avidez.

Olhando para os dois garotos que davam ares de comilões, Eva Marli caçoou:

- Berenice, minha amiga! Precisamos tomar cuidados, senão em pouco tempo estaremos namorando dois balofos!

- Tenho certeza que não corro o menor perigo, pois Johnny não é um glutão! – Assegurou menina. Depois olhando ternamente para o garoto, disse com emoção:

- Eu vou amar esse homem por toda a minha vida e além da existência dela!

Impressionado com tudo aquilo, Bill Elliott jamais imaginou que uma garota pudesse ser tão romântica, como nos filmes de amor que assistia com sua mãe. Olhou para Eva, que serenamente esperava algumas palavras de carinho do seu namorado. Parecendo adivinhar aquele anseio, o garoto proferiu em tom amoroso:

- Parece que eu também fiquei doente:

- Doente?! ... De que? – Perguntou Eva, fingindo curiosidade.

- De uma doença chamada paixão! – Respondeu o garoto sorrindo, afagando as mãos de sua namorada.

Johnny abraçou Berenice e beijando as suas faces, disse com doçura:

- Acredito que nós todos sofremos da mesma doença!

- Uma doença, segundo dizem, que só acontece com os adultos! - completou Bill Elliott.

- Mas aconteceu com a gente e estamos, maravilhosamente, apaixonados! – Finalizou Eva Marli.

Os jovens ficaram naquele encantamento por um bom tempo, esquecendo a realidade que os rodeava. Trocavam ideias, traçando planos para o futuro, na esperança de que o porvir fosse venturoso para todos. A felicidade existia e parecia que ela havia feito morada nos corações daqueles adolescentes, que mal haviam saído da puberdade. Para Bill Elliott aquela noite era especial. Não havia, ainda, vinte quatro horas de namoro, e a sua bela Eva Marli tinha dito que estava apaixonada por ele. Havia bastante tempo que ele gostava da menina, sem nenhuma esperança de namoro, pois ela jamais havia flertado com ele. Algum dos seus colegas havia dito que a menina era orgulhosa e oriunda de uma família preconceituosa. Disseram também, a mesma coisa da doce Berenice. Porém, quando ele observou as meninas assistindo ao torneio de futebol de uma garotada pobre, entendeu que aquelas intrigas eram frutos dos despeitos de alguns fanfarrões, que pretenderam conquistar as garotas, não conseguindo seus objetivos. Bill percebeu, também, que seus jovens amigos eram bastante maduros, para a pouca idade que tinham e não via infantilidade alguma por parte deles, como notava em certos colegas, bem mais velhos, que apresentavam condutas amolecadas. Todos eles possuíam objetivos e se esforçavam em ter uma postura mais condizente com o mundo adulto; principalmente Luis, Eduardo, Edgar e Johnny, o mais jovem de todos.

O sino do relógio da matriz soou oito badaladas baixas e duas altas, anunciando às vinte horas e trinta minutos. Johnny lembrou-se dos amigos que esperavam por eles no jardim e alertou aos jovens.

- Já estamos atrasados, pois marcamos de encontrar com a turma, às oito horas em ponto!

- Ah!... Pra que se preocupar a toa? O único que deve está chateado é Orlando, pois cismou que é o meu guarda costa! – Disse Berenice sorrindo.

- Principalmente se não encontrar Johnny por perto! – Observou Bill Elliott.

- Ué, por que a mim?!... – Perguntou o garoto, admirado com aquela colocação.

Bill olhou para Johnny e sorrindo, bateu de leve em seu ombro, dizendo:

- Eduardo suspeita do seu namoro com Berenice e comentou isso com Orlando. Ele nega o fato, mas está com uma pulga atrás da orelha!

– Ele devia se mancar e cuidar da própria vida! - Disse Eva Marli, que acrescentou:

- Agora está invocado com Luísa, que está apaixonada por Eduardo!

- E Eduardo está caído por ela – Concluiu Bill Elliott.

- Acredito que nesse momento, Orlando deva estar cantando na banda. Ele é meu irmão de leite e isso é sagrado para mim! Infelizmente, o garoto tem uma visão equivocada das coisas! – Disse Berenice, tentando amenizar a antipatia que Eva Marli tinha pelo rapaz.

Bill Elliott concordou com Berenice, dizendo:

-Eu conheço Orlando há muito tempo e, desde pequeno, ele trabalha para ajudar a família. Acredito que isso o tenha atrapalhado nos estudos, não lhe dando uma visão melhor das coisas!

Conhecendo de perto os problemas dos amigos, Johnny acrescentou:

- É difícil para qualquer pessoa estudar e trabalhar ao mesmo tempo!

Bill Elliott chamou a moça que os atendeu, para pagar a conta e disse sorrindo com alegria:

- Vamos deixar de chorumelas, que hoje a farra é por minha conta!

- Nada disso, vamos dividir! Disse Johnny, pegando sua carteira.

- Quem convida faz a festa! – Adiantou o rapaz.

- É isso aí garoto! – disse Eva contente com o cavalheirismo do seu namorado.

Johnny não insistiu diante da decisão do amigo e acatou a sua vontade. Os jovens saíram do bar, seguindo pela avenida com destino a Praça Ruy Barbosa. Verificaram que naquele momento fazia pouco frio, pois alguns moradores colocaram suas cadeiras na calçada e ficaram proseando com seus vizinhos. O tempo estava suave, com um céu de muitas estrelas, prometendo uma noite esplendorosa para todos naquele domingo.

A praça estava repleta de transeuntes no último dia da quermesse. O baile da pista de patins começou mais cedo, do que as outras noites e estava abarrotado de pessoas dançando boleros e samba-canções na voz maravilhosa de Orlando Silva Santos, acompanhado pela banda Amantes da Lira. Aquele baile estava se tornando uma tradição nas festas juninas daquela cidade. Após a inauguração do chamado “Colarinho de Saback” foi construído na parte

côncava, o parque infantil, onde estava a quermesse, e a pista de patins onde acontecia o baile. Era a instituição mais democrática da cidade de Jequié. Sem nenhuma sombra de preconceitos, dançavam em sua pista todas as camadas sociais, sem distinção de cor, classe ou credo. Era comum ver o filho de um engraxate dançando com a filha de algum doutor, ou bacharéis dançando com empregadas domésticas. Tudo acontecia naturalmente com muita alegria.

Chegando à praça, os jovens foram procurar os seus amigos, encontrando toda a turma sentada em um banco localizado na área central do Jardim. Quem primeiro avistou a garotada foi Bill Elliott, que acenou para eles gritando:

- Então meninada, quais são as novidades?

- As mesmas de sempre! Respondeu Luis, intrigado com o desaparecimento deles.

Norma, curiosa pelo fato dos quatro estarem juntos e afastados deles por um bom tempo, perguntou:

- Ôxente!... Por onde vocês andaram?

Eva Marli respondeu em tom brincalhão:

- Passeando na floresta enquanto o seu lobo não vem!

- A gente estava provando os quitutes do Bar Vermelho a convite de Bill e Johnny; demoramos um pouco, pois a conversa estava animada. – Respondeu Berenice com naturalidade.

- Eu estava morrendo de saudades de você! – Disse Luís Augusto, afagando as mãos de Berenice, com um sorriso maroto. A garota esquivou-se delicadamente dele, dizendo:

- Eu estava sentindo a falta de todos!

- A gente estava esperando vocês para irmos dançar no baile da quermesse! Disse Eduardo, de mãos dadas a Luísa.

- Todo mundo será obrigado a dançar ou pagar prendas! – Disse Norma caçoando dos meninos.

Ouvindo aquela novidade, Edgar chamou Johnny à parte, dizendo:

- Ih rapaz; e agora?!... Eu não sei dançar!

- Nem eu! – Respondeu o garoto, com certo receio.

Neide, sentindo a ansiedade do namorado, afagou as suas mãos e disse sorrindo:

- Não se preocupe meu bem, que eu lhe ensino!

As meninas acharam excelente aquela decisão e, puxando os meninos pelos braços, levaram todos eles para a pista de patins. Luis adorou a idéia, pois era o único que sabia dançar. Como sempre, o garoto acompanhou Berenice, que ia conversando alegremente com Eva Marli e Bill Elliott, seguidos por Eduardo, Luísa, Edgar e Neide. Como estava sozinha, Norma pegou na mão de Johnny e o intimou graciosamente:

- Hoje tu serás o meu par garoto! Tens preconceito com garotas mais velhas?

- De forma alguma! O problema é que não sei dançar! – Afirmou Johnny, com receio de cometer gafes na pista de dança.

A garota balançou o seu corpo, dizendo com charme:

- Não há nenhum mistério nisso! É só seguir o ritmo da música, que a dança flui naturalmente!

Embora estivesse um tanto avexado com a perspectiva de dançar, Johnny analisou toda a conjuntura em que estava vivendo e chegou à conclusão de que, mais cedo ou tarde, ele teria que enfrentar uma situação como aquela. Sentiu que, o encanto de um convite como aquele acalma qualquer acanhado. Respirou forte e, munido de repentina coragem, foi o primeiro do grupo a tirar uma garota para dançar. A seguir Luis convidou Berenice e os dois deram uma verdadeira mostra de elegância na arte rítmica. Eduardo, que já tinha ensaiado, anteriormente, alguns ritmos com Luísa, dançava com desenvoltura. Edgar e Bill ficaram um pouco retraídos; porém, diante das insistências de suas namoradas, entraram na pista, no momento em que a banda executava um samba-canção, que estava sendo cantado por um velho conhecido da turma: Orlando Silva Santos.

Johnny estava impressionado consigo mesmo. Nunca tinha imaginado que conseguiria aquela façanha. Norma tinha uma experiência notável e, ao lado dela, ninguém percebia que ele estava sendo conduzido pela garota. Eduardo notando, que o enciumado Orlando não tirava os olhos de Luísa, resolveu desdenhar do rapaz, dançando perto do palco, para mostrar que era o senhor da situação. Percebendo que Eduardo não sabia dançar, o cantor pediu ao maestro para executar um bolero. Se atrapalhando todo com os passos especiais do ritmo, Eduardo foi o primeiro a sair do salão. Em seguida Johnny, Bill e Edgar fizeram o mesmo; ficando apenas Luís e Berenice bailando ao som de uma suave música mexicana. Orlando sorriu satisfeito com a má atuação de seu desafeto. Logo depois, Berenice e Luis deixam o salão e vão para a companhia dos amigos, que ocupavam uma mesa em um canto da pista. Ninguém notou a estratégia de Orlando, para estragar a festa da garotada. Entretanto, Johnny, Bill e Edgar estavam contentes, pois foi a primeira vez que eles dançaram em público. Sentados em volta da mesa, os garotos começaram a comentar o acontecimento. Eles foram os únicos de suas idades a dançarem no baile da quermesse naquela noite, pois a maioria dos dançantes era adulta. Bill Elliott foi o primeiro a falar:

- Essa foi a primeira vez em minha vida, que eu dancei em um baile. Acho que não me saí tão mal, como eu imaginava!

- Eu também! – afirmou Johnny.

- E eu também! – Concluiu Edgar.

Eduardo, que havia pisado nos pés de Luísa, duas vezes, e estava chateado com a sua atuação, comentou:

- Eu sempre me atrapalho com o danado do bolero. Por isso preciso treinar um pouco!

Johnny concordou com o amigo e completou:

- No meu caso, eu devo treinar muito e com todos os ritmos!

- Nada disso! Você foi maravilhoso! – Afirmou Norma, incentivando o garoto, e virando-se para Berenice disse a seguir:

- Você precisa dançar com Johnny! Ele é o rapaz mais leve, com que eu já dancei!

- Não faltará ocasião para isso! – Disse a menina sorrindo.

A garotada ficou conversando por algum tempo, tomando refrigerantes e comendo pipocas. A banda fez um curto intervalo, para descansar, voltando minutos depois sem o cantor, executando composições das grandes orquestras americanas, que faziam sucesso no momento. De repente uma canção chama a atenção de Johnny e Berenice, que reconhece a música tocada em seus primeiros beijos de amor. A garota olha ternamente o namorado, que estava sentado no outro lado da mesa, o qual retribuiu aquele olhar com muita doçura. Os dois ficaram em silêncio por alguns instantes, encantados com aquela melodia. De repente Johnny se levanta e, dirigindo-se para Berenice, pergunta-lhe em tom maroto:

- A senhorita me dá o prazer dessa contradança?

Berenice responde com meiguice:

- Pois não cavalheiro! O prazer é todo meu!

Os dois se levantam e seguem para a pista de dança. Johnny abraça Berenice e a conduz suavemente pelo salão, ao som da bela canção. A garotada tem a mesma idéia e seguem todos juntos, tendo Norma, dessa vez, Luis como par. O ritmo lento e harmonioso faz com que os enamorados pairem silenciosamente pelo salão, deixando suas emoções falarem por si mesmas. Eduardo segue dançando com Luísa, sorrindo do olhar enfezado de Orlando, que não podia interromper o desempenho do jovem enamorado.

Depois de algum tempo, os jovens vão para a mesa e pagam as suas contas, resolvendo passear pelo jardim, que estava bastante movimentado naquele momento, devido o final das sessões dos dois cinemas. O relógio da matriz anuncia as vinte e duas horas e todas as garotas resolvem ir embora, pois aquele era o horário em que a maioria dos pais permite as suas filhas menores de quinze anos permanecerem nas ruas em tempos de festas. Notando a tranqüilidade de Neide com Edgar, Eva Marli observou:

- Vejo que hoje, você está mais à vontade do que em outras noites!

- Sim, pois minha mãe e minha avó sabem que estou namorando Edgar. Além disso, elas estão na quermesse e já deram sinal de que é hora da gente seguir para casa. – disse a menina, alegre com a aprovação de Edgar pela mãe. Ela gostou do garoto que trabalhava numa loja importante e, ainda, estudava à noite. Norma era a única que parecia aborrecida com a determinação das senhoras. Virou para a turma e lamentou:

- Eu só estou aqui porque meu pai permitiu que eu viesse com elas. Depois que duas “baratas” de igreja me caluniaram para ele, dizendo que sou uma namoradeira, estou sofrendo uma repressão danada!

Não é só você! Por isso é que eu digo pra a gente tomar cuidado, pois os linguarudos da cidade estão de línguas afiadas. Afirmou Eva Marli.

- Principalmente os “piolhos do tênis” – Concluiu Norma.

- Piolhos do tênis?... O que é isso?! – Perguntou Luis, admirado com aquela expressão.

Johnny, que conhecia a fama dessa molecada, explicou ao primo:

- É uma turma de otários, que freqüentam o tênis clube e gostam de falar mal das pessoas que eles detestam. Principalmente das garotas! Ninguém escapa de suas difamações!

- Vamos deixar de comentar sobre pessoas negativas, que faz muito mal a saúde! – Disse Berenice, que desprezava qualquer tipo de comentário maldoso.

- Concordo com você! – Finalizou Luis.

Nesse momento, a mãe e avó de Neide se aproximam da garotada, saudando a todos com muita simpatia. Depois de breves convives, os jovens se despedem, marcando encontro na praça, no final da tarde do dia seguinte. Berenice, como sempre, preocupada com Johnny, pede a Edgar que o acompanhe até a sua casa. Não podendo se despedir de Johnny como ela queria, a garota afaga as mãos do namorado e beija-lhe o rosto com doçura. A seguir se despede de Luís, com beijinhos em suas faces, dizendo carinhosamente aos garotos:

- Vão dormir e sonhe com os anjos, pois gosto muito dos dois!

- Nós também gostamos muito de você! – afirmaram, simultaneamente, os dois primos.

Johnny, Luis e Edgar seguiram juntos, deixando Norma e Neide, com sua mãe e avó, em suas casas. Bill Elliott e Eduardo conduziram Berenice e Eva, a qual, nas noites de festas, dormia na casa da amiga. A seguir, acompanharam Luísa até a sua residência, na Praça da Estação.

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