Capítulo - 44 do livro " Guris e Gibis".
O
anoitecer despontou esplendorosamente colorido, parecendo que o santo do dia
agraciava os seus fiéis com um maravilhoso céu coberto de estrelas. Fazia pouco
frio e não havia sinais de chuvas para aquela noite. Oficialmente o outono
estava chegando ao fim, apesar do inesperado frio abater-se sobre a cidade,
desde o início do mês, contradizendo as normas climáticas, numa condição
totalmente irregular; já que nessa época, os primeiros dias de junho costumavam
ter uma temperatura mais condizente com a situação geográfica da região.
Entretanto, para os habitantes de Jequié, outonos e primaveras eram estações
sem sentido, que só existiam mesmos, para serem comemorados nos dias de festas
escolares. Na Zona de Jequié só se sentia duas estações: verão no final e
começo de cada ano, e inverno no meio do ano, que começaria na época do São
João. Contudo, para os roceiros em geral, as duas estações eram cognominadas
como a da seca e a das águas, sendo que, as chuvas de verão, que aconteciam
entre o final de um ano e começo do outro, eram denominadas pelos catingueiros
de invernadas, e não era incomum, a temperatura cair bastante nos meses de
outubro e novembro e, às vezes, em dezembro e janeiro. O inesperado frio, que
aconteceu na cidade, parecia ter sido fruto de uma corrente vinda do continente
Antártico, atingindo a maioria dos municípios circunvizinhos e que, naquele
momento, havia sido dissipada em direção ao mar.
A
praça estava bastante movimentada, num vai e vem de pessoas, as quais passeavam
pelo jardim à procura de flertes ou aventuras amorosas. Casais de namorados
sentados em seus bancos dedicavam músicas românticas a seus consortes, através
do alto falante da quermesse. O Cine Teatro Jequié continuou a exibir gratuitamente,
o famoso filme em sua sessão de soirée, atraindo os adultos para sua sala de
projeção. A boemia jequieense se concentrava no Bar Joly, enquanto na
Confeitaria Cristal, rapazes e moças da distinta sociedade trocavam flertes ao
sabor de um chocolate quente.
Johnny
chegou bem cedo na praça, naquela última noite dos festejos de Santo Antonio.
Sua intenção era encontrar Berenice, antes de Luis, para poder ficar a sós com
sua pequena, nem que fosse por breves instantes. O relógio da matriz badalava
às sete horas, quando ele encontrou a turma da Siqueira Campos, sentada nas
escadarias do “Colarinho Saback”, na companhia de Orlando, Bill Elliott e
alguns colegas do Castro Alves. Os garotos haviam continuado na praça, desde o
final da matinê, preferindo não ir para casa e fazer suas refeições nas
barracas das baianas, que naquele mês, além do tradicional acarajé e abará,
serviam iguarias típicas das festas juninas. A garotada ficou exultante em ver
o amigo; principalmente Tõe Porcino, o qual foi o primeiro a lhe fazer festas,
usando expressões peculiares das histórias em quadrinhos:
-
Macacos me mordam se não é o meu amigo Johnny the Kid!
Johnny
abraçou o garoto e, sorrindo dos seus jargões infantis, entrou no jogo:
-
Caramba!... É um pássaro?... É um avião?!... Não! É o meu amigo, o Super
Porcino!
A
meninada desatou a rir, embarcando no gracejo dos dois. Géo, também querendo
participar da brincadeira, começou a imitar um mocinho do faroeste. Orlando
sorrindo com desdém do garoto, comentou para Mipai:
- A
viadagem começou!...
Mipai
riu bastante com aquela chacota. Escutando o comentário, Géo encarou Orlando,
perguntando:
-
Começou o que sujeito?!
Orlando,
fazendo ar de desentendido, respondeu:
- A
vadiagem! Vamos todos vadiar que essa é a última noite de farra. É pena que eu
vá ter que cantar a noite inteira!
- Bill
Elliott interveio na conversa para evitar brigas e, olhando sério para Orlando,
ponderou:
- Bom
para você que está ganhando dinheiro; enquanto isso, a gente está gastando!
Géo
olhou para Orlando com rancor, sentindo uma profunda antipatia pelo rapaz.
Contudo, procurou não dar importância ao caso, pois não queria estragar aquela
noite maravilhosa, cheia de meninas bonitas, passeando pelo jardim. Enquanto a
garotada comentava as últimas notícias do seu mundo juvenil, Bill chamou Johnny
à parte e segredou-lhe ao ouvido:
-
Berenice pede para você encontrar-se com ela no Bar Vermelho!
Johnny
olhou admirado para o amigo. Não esperava um recado de Berenice vindo por ele.
O rapaz percebendo a sua surpresa, bate sorrindo no seu ombro em sinal de
cumplicidade, dizendo:
-
Estou sabendo de tudo, pois Eva me contou! Estamos torcendo por vocês!
-
Obrigado! Você não imagina como estou precisando disso! – Disse Johnny, animado
com a novidade. Depois pergunta ao amigo:
- A que
horas devo me encontrar com ela?
-
Agora mesmo. Eva e Berenice estão esperando pela gente!
O
garoto ficou bastante contente com aquela notícia. Imediatamente despediu-se
dos amigos e partiu na companhia de Bill Elliott em direção ao Bar Vermelho.
Embora estivesse situado no centro da cidade, e em dias normais fosse bastante
freqüentado; naquele momento, o bar se encontrava um tanto vazio, pois o cerne
das atenções era a Praça Ruy Barbosa. Havia poucas pessoas transitando naquela
parte da avenida, que ficava distante da quermesse. Os garotos entram no bar e
cumprimentam alguns adultos, que tomavam seus cafezinhos em pé, junto ao
balcão. Johnny avistou Berenice na companhia de Eva Marli, sentada em um canto
da sala, usando uma das poucas mesas, daquele modesto estabelecimento. O garoto
ficou deslumbrado ao ver sua namorada. Berenice estava mais linda do que nunca
e, antes que ele pudesse dizer-lhe alguma coisa, ela beijou ardorosamente os
seus lábios.
A
emoção sentida naquele momento ficou guardada como um relicário de amor, no
coração de um garoto, que atingia a adolescência com uma paixão devaneadora.
Tudo aquilo parecia um sonho. Ele mesmo, já havia tido devaneios parecidos com
aquela realidade e, por um instante, temeu um triste despertar. Berenice aconchegou-se
nele abraçando-o ternamente, ficando os dois naquele deleite, por imensuráveis
segundos, esquecendo-se de tudo e de todos.
Eva
Marli, sentindo a curiosidade de alguns adultos no recinto, em torno dos jovens
namorados, adiantou-se em separar o casal e, de maneira harmoniosa, disse com
humor:
-
Jovens! Vocês estão proporcionando cinema grátis para todos!
Berenice
riu bastante de tudo aquilo. Apesar de ser uma garota extrovertida, estava
admirada com a sua própria ousadia. Tinha treze anos de idade e sabia que eles
eram jovens demais para aquelas manifestações ardorosas. Contudo, deu de
ombros, não se incomodando com as bisbilhotices dos outros. Estava
demasiadamente feliz com o seu belo garoto, a quem amava com doçura e era amada
por ele. Johnny permaneceu abraçado a Berenice, fitando os seus lindos olhos
azuis, enquanto acariciava ternamente os seus doirados cabelos.
Bill
Elliott estava surpreso com a desenvoltura do amigo. Como era possível que um
garoto tímido como Johnny, poderia ter uma ventura daquelas. Ele sabia que era
mais audacioso do que a maioria dos garotos; entretanto, não havia, ainda,
beijado a sua namorada. Eva Marli convidou os dois para sentarem-se naquele
momento. Olhou ao seu redor e verificou que, as poucas pessoas ali presentes
não estavam sendo indiscretas e não se incomodavam com a presença dos atrevidos
adolescentes. Apesar do nome, o Bar Vermelho era na realidade um misto de
taberna, mercearia e confeitaria ao mesmo tempo. A maioria das pessoas que o
frequentava morava nas suas adjacências e muitos eram profissionais liberais,
que tinham uma visão mais condizente com a época em que estavam vivendo.
Os
garotos, acomodados naquela parte do estabelecimento, começaram a papear sobre
as coisas corriqueiras do ambiente escolar. Eva Marli chamou a moça que estava
servindo e pediu o quitute mais famoso da casa. Aconselhando os seus amigos a
fazerem o mesmo, disse com convicção:
- Aqui
serve a melhor pamonha de toda a região!
- Eu
adoro pamonha e todas as iguarias que vem do milho! – Disse Bill que, apesar de
ter pais italianos, em sua casa era mais freqüente, a cozinha regional do
sudoeste baiano. Johnny, que havia sido criado na roça, adiantou com sabedoria:
- Não
só de milho, como também de mandioca e batatas!
-
Humm!... Um beijuzinho com manteiga de garrafa dá água na boca de qualquer
cristão! – Completou Bill esfregando as mãos com avidez.
Olhando
para os dois garotos que davam ares de comilões, Eva Marli caçoou:
-
Berenice, minha amiga! Precisamos tomar cuidados, senão em pouco tempo
estaremos namorando dois balofos!
-
Tenho certeza que não corro o menor perigo, pois Johnny não é um glutão! –
Assegurou menina. Depois olhando ternamente para o garoto, disse com emoção:
- Eu
vou amar esse homem por toda a minha vida e além da existência dela!
Impressionado
com tudo aquilo, Bill Elliott jamais imaginou que uma garota pudesse ser tão
romântica, como nos filmes de amor que assistia com sua mãe. Olhou para Eva,
que serenamente esperava algumas palavras de carinho do seu namorado. Parecendo
adivinhar aquele anseio, o garoto proferiu em tom amoroso:
-
Parece que eu também fiquei doente:
-
Doente?! ... De que? – Perguntou Eva, fingindo curiosidade.
- De
uma doença chamada paixão! – Respondeu o garoto sorrindo, afagando as mãos de
sua namorada.
Johnny
abraçou Berenice e beijando as suas faces, disse com doçura:
-
Acredito que nós todos sofremos da mesma doença!
- Uma
doença, segundo dizem, que só acontece com os adultos! - completou Bill
Elliott.
- Mas
aconteceu com a gente e estamos, maravilhosamente, apaixonados! – Finalizou Eva
Marli.
Os
jovens ficaram naquele encantamento por um bom tempo, esquecendo a realidade
que os rodeava. Trocavam ideias, traçando planos para o futuro, na esperança de
que o porvir fosse venturoso para todos. A felicidade existia e parecia que ela
havia feito morada nos corações daqueles adolescentes, que mal haviam saído da
puberdade. Para Bill Elliott aquela noite era especial. Não havia, ainda, vinte
quatro horas de namoro, e a sua bela Eva Marli tinha dito que estava apaixonada
por ele. Havia bastante tempo que ele gostava da menina, sem nenhuma esperança
de namoro, pois ela jamais havia flertado com ele. Algum dos seus colegas havia
dito que a menina era orgulhosa e oriunda de uma família preconceituosa.
Disseram também, a mesma coisa da doce Berenice. Porém, quando ele observou as
meninas assistindo ao torneio de futebol de uma garotada pobre, entendeu que
aquelas intrigas eram frutos dos despeitos de alguns fanfarrões, que
pretenderam conquistar as garotas, não conseguindo seus objetivos. Bill
percebeu, também, que seus jovens amigos eram bastante maduros, para a pouca
idade que tinham e não via infantilidade alguma por parte deles, como notava em
certos colegas, bem mais velhos, que apresentavam condutas amolecadas. Todos
eles possuíam objetivos e se esforçavam em ter uma postura mais condizente com
o mundo adulto; principalmente Luis, Eduardo, Edgar e Johnny, o mais jovem de
todos.
O sino
do relógio da matriz soou oito badaladas baixas e duas altas, anunciando às
vinte horas e trinta minutos. Johnny lembrou-se dos amigos que esperavam por
eles no jardim e alertou aos jovens.
- Já
estamos atrasados, pois marcamos de encontrar com a turma, às oito horas em
ponto!
-
Ah!... Pra que se preocupar a toa? O único que deve está chateado é Orlando,
pois cismou que é o meu guarda costa! – Disse Berenice sorrindo.
-
Principalmente se não encontrar Johnny por perto! – Observou Bill Elliott.
- Ué,
por que a mim?!... – Perguntou o garoto, admirado com aquela colocação.
Bill
olhou para Johnny e sorrindo, bateu de leve em seu ombro, dizendo:
-
Eduardo suspeita do seu namoro com Berenice e comentou isso com Orlando. Ele
nega o fato, mas está com uma pulga atrás da orelha!
– Ele
devia se mancar e cuidar da própria vida! - Disse Eva Marli, que acrescentou:
-
Agora está invocado com Luísa, que está apaixonada por Eduardo!
- E
Eduardo está caído por ela – Concluiu Bill Elliott.
-
Acredito que nesse momento, Orlando deva estar cantando na banda. Ele é meu
irmão de leite e isso é sagrado para mim! Infelizmente, o garoto tem uma visão
equivocada das coisas! – Disse Berenice, tentando amenizar a antipatia que Eva
Marli tinha pelo rapaz.
Bill
Elliott concordou com Berenice, dizendo:
-Eu
conheço Orlando há muito tempo e, desde pequeno, ele trabalha para ajudar a
família. Acredito que isso o tenha atrapalhado nos estudos, não lhe dando uma
visão melhor das coisas!
Conhecendo
de perto os problemas dos amigos, Johnny acrescentou:
- É
difícil para qualquer pessoa estudar e trabalhar ao mesmo tempo!
Bill
Elliott chamou a moça que os atendeu, para pagar a conta e disse sorrindo com
alegria:
-
Vamos deixar de chorumelas, que hoje a farra é por minha conta!
- Nada
disso, vamos dividir! Disse Johnny, pegando sua carteira.
- Quem
convida faz a festa! – Adiantou o rapaz.
- É
isso aí garoto! – disse Eva contente com o cavalheirismo do seu namorado.
Johnny
não insistiu diante da decisão do amigo e acatou a sua vontade. Os jovens
saíram do bar, seguindo pela avenida com destino a Praça Ruy Barbosa.
Verificaram que naquele momento fazia pouco frio, pois alguns moradores
colocaram suas cadeiras na calçada e ficaram proseando com seus vizinhos. O
tempo estava suave, com um céu de muitas estrelas, prometendo uma noite
esplendorosa para todos naquele domingo.
A
praça estava repleta de transeuntes no último dia da quermesse. O baile da
pista de patins começou mais cedo, do que as outras noites e estava abarrotado
de pessoas dançando boleros e samba-canções na voz maravilhosa de Orlando Silva
Santos, acompanhado pela banda Amantes da Lira. Aquele baile estava se tornando
uma tradição nas festas juninas daquela cidade. Após a inauguração do chamado
“Colarinho de Saback” foi construído na parte
côncava,
o parque infantil, onde estava a quermesse, e a pista de patins onde acontecia
o baile. Era a instituição mais democrática da cidade de Jequié. Sem nenhuma
sombra de preconceitos, dançavam em sua pista todas as camadas sociais, sem
distinção de cor, classe ou credo. Era comum ver o filho de um engraxate
dançando com a filha de algum doutor, ou bacharéis dançando com empregadas
domésticas. Tudo acontecia naturalmente com muita alegria.
Chegando
à praça, os jovens foram procurar os seus amigos, encontrando toda a turma
sentada em um banco localizado na área central do Jardim. Quem primeiro avistou
a garotada foi Bill Elliott, que acenou para eles gritando:
-
Então meninada, quais são as novidades?
- As
mesmas de sempre! Respondeu Luis, intrigado com o desaparecimento deles.
Norma,
curiosa pelo fato dos quatro estarem juntos e afastados deles por um bom tempo,
perguntou:
-
Ôxente!... Por onde vocês andaram?
Eva
Marli respondeu em tom brincalhão:
- Passeando
na floresta enquanto o seu lobo não vem!
- A
gente estava provando os quitutes do Bar Vermelho a convite de Bill e Johnny;
demoramos um pouco, pois a conversa estava animada. – Respondeu Berenice com
naturalidade.
- Eu
estava morrendo de saudades de você! – Disse Luís Augusto, afagando as mãos de
Berenice, com um sorriso maroto. A garota esquivou-se delicadamente dele,
dizendo:
- Eu
estava sentindo a falta de todos!
- A
gente estava esperando vocês para irmos dançar no baile da quermesse! Disse Eduardo,
de mãos dadas a Luísa.
- Todo
mundo será obrigado a dançar ou pagar prendas! – Disse Norma caçoando dos
meninos.
Ouvindo
aquela novidade, Edgar chamou Johnny à parte, dizendo:
- Ih
rapaz; e agora?!... Eu não sei dançar!
- Nem
eu! – Respondeu o garoto, com certo receio.
Neide,
sentindo a ansiedade do namorado, afagou as suas mãos e disse sorrindo:
- Não
se preocupe meu bem, que eu lhe ensino!
As
meninas acharam excelente aquela decisão e, puxando os meninos pelos braços,
levaram todos eles para a pista de patins. Luis adorou a idéia, pois era o
único que sabia dançar. Como sempre, o garoto acompanhou Berenice, que ia
conversando alegremente com Eva Marli e Bill Elliott, seguidos por Eduardo,
Luísa, Edgar e Neide. Como estava sozinha, Norma pegou na mão de Johnny e o
intimou graciosamente:
- Hoje
tu serás o meu par garoto! Tens preconceito com garotas mais velhas?
- De
forma alguma! O problema é que não sei dançar! – Afirmou Johnny, com receio de
cometer gafes na pista de dança.
A
garota balançou o seu corpo, dizendo com charme:
- Não
há nenhum mistério nisso! É só seguir o ritmo da música, que a dança flui
naturalmente!
Embora
estivesse um tanto avexado com a perspectiva de dançar, Johnny analisou toda a
conjuntura em que estava vivendo e chegou à conclusão de que, mais cedo ou
tarde, ele teria que enfrentar uma situação como aquela. Sentiu que, o encanto
de um convite como aquele acalma qualquer acanhado. Respirou forte e, munido de
repentina coragem, foi o primeiro do grupo a tirar uma garota para dançar. A
seguir Luis convidou Berenice e os dois deram uma verdadeira mostra de
elegância na arte rítmica. Eduardo, que já tinha ensaiado, anteriormente,
alguns ritmos com Luísa, dançava com desenvoltura. Edgar e Bill ficaram um
pouco retraídos; porém, diante das insistências de suas namoradas, entraram na
pista, no momento em que a banda executava um samba-canção, que estava sendo
cantado por um velho conhecido da turma: Orlando Silva Santos.
Johnny
estava impressionado consigo mesmo. Nunca tinha imaginado que conseguiria
aquela façanha. Norma tinha uma experiência notável e, ao lado dela, ninguém
percebia que ele estava sendo conduzido pela garota. Eduardo notando, que o
enciumado Orlando não tirava os olhos de Luísa, resolveu desdenhar do rapaz,
dançando perto do palco, para mostrar que era o senhor da situação. Percebendo
que Eduardo não sabia dançar, o cantor pediu ao maestro para executar um
bolero. Se atrapalhando todo com os passos especiais do ritmo, Eduardo foi o
primeiro a sair do salão. Em seguida Johnny, Bill e Edgar fizeram o mesmo;
ficando apenas Luís e Berenice bailando ao som de uma suave música mexicana.
Orlando sorriu satisfeito com a má atuação de seu desafeto. Logo depois,
Berenice e Luis deixam o salão e vão para a companhia dos amigos, que ocupavam
uma mesa em um canto da pista. Ninguém notou a estratégia de Orlando, para
estragar a festa da garotada. Entretanto, Johnny, Bill e Edgar estavam
contentes, pois foi a primeira vez que eles dançaram em público. Sentados em
volta da mesa, os garotos começaram a comentar o acontecimento. Eles foram os
únicos de suas idades a dançarem no baile da quermesse naquela noite, pois a
maioria dos dançantes era adulta. Bill Elliott foi o primeiro a falar:
- Essa
foi a primeira vez em minha vida, que eu dancei em um baile. Acho que não me
saí tão mal, como eu imaginava!
- Eu
também! – afirmou Johnny.
- E eu
também! – Concluiu Edgar.
Eduardo,
que havia pisado nos pés de Luísa, duas vezes, e estava chateado com a sua
atuação, comentou:
- Eu
sempre me atrapalho com o danado do bolero. Por isso preciso treinar um pouco!
Johnny
concordou com o amigo e completou:
- No
meu caso, eu devo treinar muito e com todos os ritmos!
- Nada
disso! Você foi maravilhoso! – Afirmou Norma, incentivando o garoto, e
virando-se para Berenice disse a seguir:
- Você
precisa dançar com Johnny! Ele é o rapaz mais leve, com que eu já dancei!
- Não
faltará ocasião para isso! – Disse a menina sorrindo.
A
garotada ficou conversando por algum tempo, tomando refrigerantes e comendo
pipocas. A banda fez um curto intervalo, para descansar, voltando minutos
depois sem o cantor, executando composições das grandes orquestras americanas,
que faziam sucesso no momento. De repente uma canção chama a atenção de Johnny
e Berenice, que reconhece a música tocada em seus primeiros beijos de amor. A
garota olha ternamente o namorado, que estava sentado no outro lado da mesa, o
qual retribuiu aquele olhar com muita doçura. Os dois ficaram em silêncio por
alguns instantes, encantados com aquela melodia. De repente Johnny se levanta
e, dirigindo-se para Berenice, pergunta-lhe em tom maroto:
- A
senhorita me dá o prazer dessa contradança?
Berenice
responde com meiguice:
- Pois
não cavalheiro! O prazer é todo meu!
Os
dois se levantam e seguem para a pista de dança. Johnny abraça Berenice e a
conduz suavemente pelo salão, ao som da bela canção. A garotada tem a mesma
idéia e seguem todos juntos, tendo Norma, dessa vez, Luis como par. O ritmo
lento e harmonioso faz com que os enamorados pairem silenciosamente pelo salão,
deixando suas emoções falarem por si mesmas. Eduardo segue dançando com Luísa,
sorrindo do olhar enfezado de Orlando, que não podia interromper o desempenho
do jovem enamorado.
Depois
de algum tempo, os jovens vão para a mesa e pagam as suas contas, resolvendo
passear pelo jardim, que estava bastante movimentado naquele momento, devido o
final das sessões dos dois cinemas. O relógio da matriz anuncia as vinte e duas
horas e todas as garotas resolvem ir embora, pois aquele era o horário em que a
maioria dos pais permite as suas filhas menores de quinze anos permanecerem nas
ruas em tempos de festas. Notando a tranqüilidade de Neide com Edgar, Eva Marli
observou:
- Vejo
que hoje, você está mais à vontade do que em outras noites!
- Sim,
pois minha mãe e minha avó sabem que estou namorando Edgar. Além disso, elas
estão na quermesse e já deram sinal de que é hora da gente seguir para casa. –
disse a menina, alegre com a aprovação de Edgar pela mãe. Ela gostou do garoto
que trabalhava numa loja importante e, ainda, estudava à noite. Norma era a
única que parecia aborrecida com a determinação das senhoras. Virou para a
turma e lamentou:
- Eu
só estou aqui porque meu pai permitiu que eu viesse com elas. Depois que duas
“baratas” de igreja me caluniaram para ele, dizendo que sou uma namoradeira,
estou sofrendo uma repressão danada!
Não é
só você! Por isso é que eu digo pra a gente tomar cuidado, pois os linguarudos
da cidade estão de línguas afiadas. Afirmou Eva Marli.
-
Principalmente os “piolhos do tênis” – Concluiu Norma.
-
Piolhos do tênis?... O que é isso?! – Perguntou Luis, admirado com aquela
expressão.
Johnny,
que conhecia a fama dessa molecada, explicou ao primo:
- É
uma turma de otários, que freqüentam o tênis clube e gostam de falar mal das
pessoas que eles detestam. Principalmente das garotas! Ninguém escapa de suas
difamações!
-
Vamos deixar de comentar sobre pessoas negativas, que faz muito mal a saúde! –
Disse Berenice, que desprezava qualquer tipo de comentário maldoso.
-
Concordo com você! – Finalizou Luis.
Nesse
momento, a mãe e avó de Neide se aproximam da garotada, saudando a todos com
muita simpatia. Depois de breves convives, os jovens se despedem, marcando
encontro na praça, no final da tarde do dia seguinte. Berenice, como sempre,
preocupada com Johnny, pede a Edgar que o acompanhe até a sua casa. Não podendo
se despedir de Johnny como ela queria, a garota afaga as mãos do namorado e
beija-lhe o rosto com doçura. A seguir se despede de Luís, com beijinhos em
suas faces, dizendo carinhosamente aos garotos:
- Vão
dormir e sonhe com os anjos, pois gosto muito dos dois!
- Nós
também gostamos muito de você! – afirmaram, simultaneamente, os dois primos.
Johnny, Luis e Edgar seguiram juntos, deixando Norma e Neide, com sua mãe e avó, em suas casas. Bill Elliott e Eduardo conduziram Berenice e Eva, a qual, nas noites de festas, dormia na casa da amiga. A seguir, acompanharam Luísa até a sua residência, na Praça da Estação.
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