terça-feira, 18 de abril de 2017

Ele é a Única Alegria

                          
Revista Esportiva Semanal da Editora Abril - Número 9 - 15 de Maio de 1970
                   
                                                                         Carlos Libório


O Jequié, até o dia 3, tinha ganho do Botafogo por 5 a 0, do Leônico por 2 a 1, do Monte Líbano por 4 a 2, do Ideal por 3 a 1, do Bahia por 2 a 1, do Feira de Santana por 3 a 0 e do Redenção por 2 a 0. Como é possível um time formado há apenas seis meses, com jogadores amadores e inexperientes, ganhar tanto assim e ameaçar tirar a glória do Bahia, o velho rei do futebol baiano? A explicação pode estar na raça e na juventude do seu time.
O Jequié quase não tem história porque sua vida é de apenas seis meses: quase não tem fama porque sua luta principal ainda é mostrar que existe: apenas de tudo isso, a Associação Desportiva Jequié talvez seja a única coisa boa do futebol baiano deste ano, capaz de salvá-lo do perigoso caminho da indiferença, feito por uma série de crises.
A última nasceu no fechamento do Estádio da Fonte Nova, para ampliação e conclusão, que obrigou à realização do todos os jogos da capital no Campo da Graça, pequeno sem conforto, sem segurança. As consequências foram a queda das rendas, a pobreza dos clubes e um futebol - sem alegria no Campo da Graça é impossível jogar um bom futebol. O gramado é muito ruim.


O campeonato Baiano só brilha quando o Jequié está em campo. Até o dia 3, ele tinha feito treze jogos: ganhou sete, empatou cinco, perdeu apenas um (Conquista, 1 x 0.) Fez 25 gols, levou dez. No balanço e na soma, o Jequié fez muito mais que todos esperavam.
Ele entrou no Campeonato quando seu estádio para 20 000 pessoas  foi aprovado pela Federação Baiana, que também consentiu que um time da cidade participasse do torneio. Mas o problema era que não existia nenhum time profissional em Jequié. Só existia a seleção amadora que venceu o Torneio Intermunicipal de 69, tirando o título que o Cachoeira tinha há dois anos. Então os diretores da seleção amadora passaram a ser diretores de um time profissional, e os jogadores passaram a receber salário e a vestir um uniforme amarelo e azul. Pronto, nascia o Jequié: Edmilson, Caculé, Carlinhos, Zé Augusto e Esquerdinha. Chinezinho e Maíca. Flori, Dilemando, Tanajura e Marcos. Apenas o armador Chinezinho veio de fora, emprestado pelo Fluminense de Feira de Santana. Em média o salário fixo de cada um é de 200 cruzeiros por conta do clube. Mas, por fora, cada titular recebe 100 ou 200 cruzeiros, dependendo do dinheiro conseguido entre diretores e torcida. E, nas grandes vitórias, como os 2 X 1 contra o Bahia, o bicho pode ser até de 200 cruzeiros.



O técnico é Geraldo Pereira, pernambucano, e antigo quarto-zagueiro do Fluminense de Feira, onde continua como auxiliar. Geraldo foi emprestado, seu salário é de 1 000 cruzeiros novos e o Jequié é o seu orgulho:
- O Jequié foi a minha grande chance no futebol, há muito tempo eu esperava por isso. Além do mais, a turma é boa, são jogadores novos que não dão trabalho fora do campo.
As rendas em Jequié dão em média 5 000 novos. Mas a diretoria sempre consegue vender ingressos por preços superiores ao da tabela. A diferença fica para o clube. Nas outras cidades a renda aumenta, graças à boa campanha.
Tudo ia bem para o Jequié. Mas agora com sua boa posição no Campeonato, começaram a aparecer problemas que sua diretoria nem havia imaginado. Um deles é o artilheiro Tanajura, que ameaça sair para trabalhar em Alagoas, como chefe do departamento de pessoal de uma empresa de petróleo, ganhando 800 novos por mês. O Jequié, como não quer perdê-lo, ofereceu 600. Pode ser que Tanajura fique.
Tanajura, rapaz de 22 anos, chute forte e muita valentia (principalmente dentro da área), divide o título de melhor jogador do Jequié com o goleiro Edmilson, o zagueiro Carlinhos e os atacantes Dilermando e Marcos, todos com menos de 23 anos. Dilermando é estudante de medicina, está no terceiro ano de faculdade em Salvador e só vai a Jequié um dia ou dois antes de cada jogo. Ele sai de Salvador pele Rio - Bahia, e depois de 350 quilômetros chega a uma cidade de 70 000 habitantes, conhecida como “Terra do Sol”, orgulhosa por seu time ter constado de rodada experimental da Loteria Esportiva: Jequié.



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