Pode ter alguém que ame Ipiaú igual ao jornalista e escritor Wilson Midlej, mas com mais amor do que ele eu duvido. Se o umbigo de Wilson não está enterrado em algum curral desta terra, sua alma tá plenamente misturada com o Água Branca e Rio de Contas, com as campinas do Burí, com as aves que aqui gorjeiam e as matas que resistem e se manterem firme. Tá sublimada, elevada no nosso "Céu de Estrelas sempre a brilhar".É dele a intensidade dessa gratidão.Confira. (José Américo Castro)
AGORA SIM: IPIAUENSE, GRAÇAS A DEUS
Desde o tempo de menino, morador da Soterópolis, tinha uma certa inveja de minha irmã e de alguns dos meus primos. Eles eram ipiauenses. Em minha análise, não tinham feito nada para sê-lo. Simplesmente, nasceram à beira do Rio de Contas. Ipiauenses com certidão e tudo.
Enquanto alguém que participou da maioria dos acontecimentos importantes da cidade do Rio Novo desde o final dos anos cinquenta até setembro de 1970, quando me casei na Igreja de São Roque, era apenas um visitante, um forasteiro que tinha suas raízes por ali.
Embora vivesse e estudasse em Salvador, invariavelmente passava as férias em Ipiaú. Desde quando se fazia necessário atravessar a baía de Todos os Santos de navio, desembarcar em São Roque, depois, seguir de trem até Nazaré e de ônibus até Ipiaú.
Tempos depois, Edward trazia a Empresa Brasil de Transportes e Marialdo Ribeiro instalava ali, a Atlanta Taxia Aéreo.
Convivi com a energia elétrica racionada, a chamada “luz de bandinha”, a construção da ponte do Japumerim, as decolagens dos aviões da Atlanta 2 vezes por semana, o fim das sete voltas e do atoleiro do Tamarindo, dando lugar à “correia preta” da estrada para Jequié.
Li nos jornais o resultado da eleição na Ipiaú de 1958: Juca Muniz derrota Seo Teles. Assisti o lançamento de Os Magros e a vitória de Euclides contra Roque Menezes, as tempestades de 1964 – em todos os seus aspectos – e o consequente desabamento da igreja antiga. Vi e ouvi a multidão emocionada aplaudindo Hildebrando quando este surgiu, na porta principal da igreja, sujo e molhado por ter se desvencilhado das enormes vigas que se desprendiam do teto, trazendo a imagem de São Roque sob a camisa, num gesto de proteção e heroísmo.
Hildebrando seguiu, sob intenso aguaceiro, acompanhado da turma do Garrancho para tomar cachaça na barraca de Ulisses. Ali, Hildebrando se consolidou como líder popular.
Vi Jaime Cobrinha, Álvaro Martins e Wilson Rocha erguerem o futebol de Rio Novo;
Vi um alfaiate, bom de bola, virar professor e depois doutor;
Vi o Dr. Waldemiro liderar o movimento para construção do Clube Náutico Rio das Contas.
Vi os militares chegarem pra levar Euclides Neto. Vi, também, um coronel e dois majores serem seduzidos pela conversa firme e franca daquele que seria, tempos depois, o modelo de escritor, político e homem integral, da minha geração.
Assisti a instalação da primeira exposição agropecuária de Ipiaú, vi a antiga Rio Novo transformar-se em Município Modelo da Bahia. E, afinal, vi o governador Lomanto Júnior dizer ao general que se o prefeito de Ipiaú tivesse que ser preso, ele também deveria seguir junto, pois pensavam iguais.
Vi o rubronegro Independente nascer e crescer. Vi Cardoso e Cabeleira brilharem no alvi negro Ipiaú. Vi filhos ilustres dessa terra galgarem postos de comando na política e de relevância nas letras.
Vi o ipiauense Tom Legal, filho de Zé Português, sair do ginásio Rio Novo para ser Odontólogo, Presidente do Conselho do Cacau e Deputado Estadual;
Nas artes, vi Dicinho brilhar pela voz de Gal Costa e Lula Martins vencer a 1ª Bienal de São Paulo de Artes Plásticas. Conheci a força interior de outro artista ipiauense, Antonio José Mota Pinheiro, aquela figura humana especial, Zebrinha;
Vi a ipiauense Maria Adélia Jaqueira ser coroada Miss Bahia;
Vi o filho de Américo Castro, José Américo da Matta Castro, um jornalista ipiauense graduado pela UFBA, ser considerado referência de comportamento ético e honrado na Bahia;
Também vi o vaqueiro Diorato, considerado o mais valente e habilidoso aparador de boi marroeiro e amansador de burro brabo das redondezas;
Vi Mapin, Dr. Manoel Pinto, em parceria com o jornalista Jairo Simões comporem o fantástico hino de Ipiaú. Uma obra de tanta relevância que, tenho certeza, o Mestre Lôla gostaria de tê-lo musicado;
Vi o capitão Milton cortar as madeixas dos cabeludos e tudo terminar em paz e conselhos;
Fui por algum tempo uma espécie de embaixador de Ipiaú nos setores administrativos do governo da Bahia, quando lá trabalhava. Primeiro com Dr. Salvador, depois com Zequinha Borges e Hildebrando Nunes.
Por tudo isso, eu sempre fui ipiauense. Do Emburrado à Canoa Virada, do Rio do Peixe ao Buri, eu sempre fui ipiauense.
Portanto, é com emoção que eu agradeço à querida amiga, vereadora Margarete Chaves, muito mais conhecida como Margarete do Abrigo, em razão daquela obra de autoria dos seus tios Dr. Nogueira e dona Zizinha. Eles a implantaram e mantiveram. O mesmo Abrigo em que Margarete dedicou-se desde à adolescência e que hoje é o seu projeto de vida. Eu agradeço pela honra de me tornar cidadão de Ipiaú.
Não fora o incansável trabalho da vereadora Margarete, de levar um pouco de luz a tantos conterrâneos, um pouco de felicidade a tantos anciãos, Margarete também me proporciona, a mim, um dos momentos mais felizes. Sou ipiauense. Muito obrigado. (Wilson Midlej)


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