Por
Carlos Eden Meira
O
ataque ao jornal francês “Charlie Hebdo”, apesar de brutal e inaceitável, era
de certa forma previsível, já que o semanário havia sofrido um atentado em 2011.
Sendo um órgão de imprensa de humor irreverente, numa Europa onde é crescente a
discriminação a imigrantes vindos em grande parte, de países de religião
muçulmana, estará sempre visado pelos radicais do islamismo. Cartunistas mais
afoitos sabiam dos riscos que corriam quando satirizavam figuras consideradas
sagradas para o Islã, principalmente para os alucinados fanáticos
fundamentalistas. Assim, o ato extremamente violento em si, demonstrou a
fragilidade das instituições livres e a ameaça à liberdade de expressão,
perante o radicalismo político e religioso de grupos extremistas, a que o mundo
inteiro está exposto.
Sendo
um pobre e obscuro cartunista, nordestino, nascido e envelhecido no interior da
Bahia, procurando respeitar a fé, os costumes e crenças populares, sempre
evitei nas minhas charges e cartuns, críticas às entidades religiosas e
instituições similares, por acreditar no direito das pessoas de crer naquilo
que lhes traga a paz espiritual e promova o bem-estar de seus semelhantes,
desde que não sejam manipulados por líderes fanáticos e hipócritas. Por outro
lado, dediquei-me ao cartunismo voltado para a charge política, principalmente
por me sentir na obrigação de colocar a arte do humor gráfico a serviço da
cidadania, contra os desmandos e contradições dos maus políticos. Na grande
maioria das vezes tenho sido apenas colaborador, sem remuneração, fazendo
charges para ilustrar textos meus, publicados nos órgãos de imprensa que me
solicitam a colaboração.
O
“Charlie Hebdo” começou a circular na França a partir de l970, época em que “O
Pasquim”, aqui no Brasil teve seu melhor momento, publicando charges contra o
regime ditatorial que censurava duramente os órgãos de imprensa. “O pasquim”, assim como o “Charlie Hebdo” era
também um hebdomadário, ou seja, um jornal editado semanalmente, daí o termo
“hebdo” do jornal francês. Cartunistas como Henfil, Ziraldo, Jaguar, Millôr
Fernandes e outros, faziam ótimas charges de uma sutileza inteligente, que
conseguiam driblar os censores de curta percepção, atingindo assim, seu
objetivo de comunicar-se com o público leitor, ainda que de vez em quando, tivessem
edições inteiras vetadas e apreendidas ou circulando com algumas colunas
cobertas de tinta preta, por imposição da censura.
O
ataque ao jornal francês é um gravíssimo acontecimento, que faz o mundo
retroceder aos tempos medievais do obscurantismo, quando os livres pensadores,
sábios, poetas e artistas eram condenados à morte, porque contrariavam os
conceitos estabelecidos por aqueles que se consideravam donos da verdade, cuja
mentalidade os impedia de aceitar quaisquer novas idéias que ameaçassem mudar
os valores políticos, culturais e religiosos da época. Entretanto, não é
ridicularizando a fé e as crenças de outros povos, gerando intolerância e
discriminação, o que resulta nessas brutais reações dos fanáticos, que alcançaremos
a paz almejada por todos.
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