sábado, 7 de agosto de 2021

No escurinho do cinema

                                                                     J. B. Pessoa

Houve uma época em que, o programa predileto da meninada de Jequié era ir às matinês aos domingos. Era o tempo das trocas de revistas em quadrinhos nas portas dos cinemas, antes e depois de cada sessão. Época dos grandes filmes de faroeste, filmes em preto e branco e alguns raros coloridos. Tempos dos famosos seriados que, com a sua “volta na próxima”, deixava o herói em perigo e ele só se safaria na próxima semana, em outro capítulo, obrigando o espectador a retornar, sempre, no próximo domingo.

Enquanto a garotada entrava no cinema, com o inocente propósito de ver um bom filme, alguns moleques tinham intenções completamente diferentes. Compareciam ao espetáculo, no intento de paquerar alguma garota. Marcavam os encontros sempre nas portas dos cinemas. Outros, mais espertos, esperavam dentro da sala de projeção para não pagar o ingresso da menina.

Em um desses maravilhosos domingos, apareceu na matinê do Cine Teatro Jequié, um rapaz acompanhado de uma linda garota. Era uma menina de quinze anos, loura de olhos claros e um corpo escultural. O malandro procurou com o olhar e encontrou dois lugares vazios, em frente de uma turma de guris que, naquele momento, gritavam com alegria à espera da projeção cinematográfica. Sentaram os dois de mãos dadas e o sujeito, olhando em volta, encarou a meninada com um sorriso zombeteiro. Quando as primeiras cenas apareceram na tela, surgiram entre os dois pombinhos um colóquio tão escabroso, que a gurizada ficou indecisa, a qual das artes assistia: se a do celulóide ou a do drama ao vivo. O namoro iniciou entre suspiros e beijos prolongados. A “mão boba” do malandro não parava de trabalhar. A turminha observava, atentamente, tudo àquilo com interesse e ao mesmo tempo com certa dose de inveja. O rapaz, que não passava de um sujeito exibicionista, ao perceber a plateia que se formava ao seu redor, resolveu dar mais ênfase no seu desempenho. Com um olhar de galã hispânico e um falso sotaque carioca, interrogou a guria num sussurro adocicado.

- Diga-me broto! De quem é esses olhinhos que não se cansam de me admirar?

- É seu querido! – Respondeu a garota com voz melosa de menininha apaixonada,

- E esse narizinho?

- É seu, meu querido!

- E essa boquinha gostosa?

- Também é sua, meu bem!

À medida que ia perguntando à garota, sempre no diminutivo, a quem pertencia àqueles dotes físicos, o malandro acariciava a todos eles: no queixo, no pescoço e ia descendo, descendo... Tocando nos seios da menina perguntou novamente!

- E esses peitinhos durinhos, broto!... Diga pro papai aqui! De quem é?

A menina, uma tanto envergonhada, disse baixinho:

- É claro que é seu, meu bem!

Nesse momento, a gurizada tinha esquecido completamente do filme que assistia e todos estavam com os olhos grudados na cena ao vivo. O sacana, ainda não satisfeito, desceu a mão grande mais abaixo, indo pousar naquela maravilhosa flor, que toda mulher traz entre as pernas.

- E essa bocetinha!... De quem é?

A ninfeta percebendo a atenção da turma em sua volta, envergonhada, tirou a “mão boba” de suas partes e calou-se timidamente.

O patife perguntou mais e mais! Como a menina teimava em não responder, e ele, querendo mostrar-se senhor da situação, berrou bem alto e de bom som:

- De quem é essa bocetinha aqui?!

Subitamente, um moleque famoso da cidade gritou bem alto, sendo ouvido por todo o recinto:

- Acode Seu Guarda!... Perderam uma boceta aqui dentro do cinema!

(*) do livro (não publicado) “Velhos Tempos Jequieenses”

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