Em
meados de março, Alceu Valença lançou o “Sem Pensar no Amanhã”, primeiro disco
de um projeto de álbuns gravados durante a pandemia (saiba mais).
Além deste, dois outros já foram registrados em estúdio, enquanto um terceiro
aguarda o cantor e compositor pernambucano de 74 anos ser totalmente imunizado
contra a Covid-19. “Tem esse disco ‘Sem Pensar no Amanhã’, depois tem um
segundo chamado ‘Era Verão’, tem um terceiro que eu não coloquei o nome, e o
quarto disco vai ser gravado agora depois que eu tomar a segunda dose da
vacina”, conta o músico.
O projeto em questão nasceu do ócio criativo, durante o período de isolamento social, quando ele ficou impossibilitado de cumprir sua extensa agenda, que só no primeiro semestre de 2020 previa 45 shows no Brasil e 16 na Europa. “A motivação foi estar em casa, eu que viajo tanto. Logo após o carnaval do outro ano teve a pandemia e eu comecei a tocar violão em casa, coisa que eu não costumo fazer, porque eu vivo na rua”, relata o cantor, que, por meio de sua “viagem sonora”, diz ter superado a forte saudade de circular pelo mundo. “Cantando eu estou viajando também, é uma viagem através da imaginação. É uma viagem do presente, do passado e até do futuro. Eu vou me transportando para determinados momentos”, filosofa.
Alceu celebra segunda dose da vacina contra a Covid-19, nesta sexta-feira (clique aqui e saiba mais) | Foto: Reprodução / Instagram
Confinado
em sua residência, no Rio de Janeiro, e sem poder visitar suas outras bases, em
Olinda (PE) e Portugal, Alceu abraçou o violão. Entre dedilhados e passeios por
seu vasto repertório ele atraiu a atenção da esposa, Yanê Montenegro, que
assina a produção executiva do álbum de estreia. “Eu estava tocando por deleite
e ela disse que o disco estava lindo, que estava tocando bem e que era bom a
gente fazer um disco”, lembra.
Naquele momento não havia um projeto concreto, mas a partir do
estímulo Alceu abraçou a música e a poesia, aproveitou para apurar a técnica,
e, entre novembro do ano passado e janeiro de 2021, gravou cerca de 30 canções
munido apenas de sua voz e um violão. O registro foi realizado no estúdio da
Deck, com produção de Rafael Ramos, e incluiu novas roupagens de grandes
sucessos, reinvenções de tesouros escondidos de seu repertório, além de músicas
inéditas, dentre elas “Sem Pensar no Amanhã”.
A escolha das faixas deste primeiro álbum também se deu de forma
muito natural, conduzida por uma narrativa visual característica do trabalho de
Alceu Valença. “Todo esse disco tem uma coisa cinematográfica. Uma música entra
na outra, como se fora um roteiro de um filme. Uma coisa vai entrando na
outra”, conta o pernambucano. “A ‘La Belle de Jour’, a moça da praia de Boa
Viagem, é a mesma moça que era uma bailarina e aparece na música ‘Mensageiro
dos Anjos’. Essa daí fala do cabelo lilás e aí depois vem 'Táxi Lunar’ que fala
de sol lilás. Depois eu pego o ‘Táxi Lunar’ e vêm lembranças na minha cabeça de
quando eu estava na Universidade de Harvard, em Boston, nos Estados Unidos,
fazendo um curso, quando vi a subida do homem à lua. Então, o que acontece? Do
táxi eu subo para a lua e pego um trem na ‘Estação da Luz’, lá em São Paulo, e
vou num passeio imaginário, percorrendo sobretudo o litoral brasileiro”,
explica o artista, que assume papel de condutor e passageiro de uma viagem
musical e poética através das 11 faixas do primeiro disco do projeto de
gravações na pandemia.
Ouça o disco "Sem Pensar no Amanhã":
A saudosa Bahia
também aparece no roteiro, que ultrapassa os limites do tempo. “Esse trem dá
uma passada em Salvador e ali na Praia do Forte… É uma viagem do passado e do
presente. Eu me vejo ali na Praça do Campo Grande e me lembro da pensão de Dona
Germana, que foi onde eu me hospedei pela primeira vez aí, quando eu era
estudante de Direito”, recorda Alceu, que retorna a Pernambuco pela Fortaleza
de Santa Cruz de Itamaracá, mais conhecida como Forte Orange, com a “Ciranda da
Rosa Vermelha”. “Eu danço ciranda lá no forte e aí é verão e vou para Olinda,
em pleno carnaval. E aí eu estou na Pitombeira dos Quatro Cantos, que é um
bloco situado atrás de minha casa. Lá e eu canto ‘Sem Pensar no Amanhã’, em que
me refiro à doce bailarina de vestido azul, das primeiras músicas que falei”,
narra Alceu Valença, que prossegue a viagem, encerrada com o fim da folia:
“Olinda fica bem tranquila, silenciosa, só o barulho do sino da igreja. Aí, no
terraço da minha casa, começa a aparecer beija-flor, sabiá, os rouxinóis. Ao terminar
isso aqui eu me despeço da minha cidade e botei o pé no mundo cantando ‘Marim
dos Caetés’”.
Assim termina a
história atemporal do “Sem Pensar no Amanhã”, congregando canções de ontem e
hoje, com vistas para o futuro. Neste sentido, Alceu tem celebrado o sucesso
alavancado pelas novas tecnologias. “A internet deu um impulsionamento
inacreditável dentro da minha carreira de visibilidade”, pontuou o artista, que
viu viralizar uma versão de “Anunciação” - um de seus grandes sucessos -
entoada pela torcida do Cerro Portenho, clube de futebol do Paraguai. Este hit,
assim como “La Belle de Jour”, também embalam a história dos nordestinos
Juliette Freire e Gilberto Nogueira, dois dos participantes favoritos do Big
Brother Brasil 21. “Minha mulher falou sobre isso, mas eu vejo pouco televisão.
No dia que eu vi o Big Brother não passou”, conta o artista, que nas horas
vagas prefere tocar violão e ler a ver TV, mas agradece o carinho do
público com sua obra. “Eu tenho uma satisfação. Que ótimo, uma maravilha. Eu
fico alegre, a mesma coisa que eu sinto ao ver minha música tocando no Cerro
Portenho e nos países Bascos”, celebra Alceu, cujas músicas ultrapassam números
de visualizações de nomes como Paul McCartney e Bob Dylan no Spotify.
"Anunciação"
embala história de Gil e Juliette no BBB 21:
TU VENS, EU JÁ ESCUTO OS TEUS SINAIS
Sempre atual, “Anunciação”, que foi convertida em grito de
torcida no Paraguai e no passado embalou processos históricos no Brasil, acabou
virando também hino pela vacinação contra a Covid-19. “Ela foi uma das músicas
das Diretas Já, foi sucesso em 1986, tinha muita gente que dizia que era a
chegada de um amor, outros que diziam que era a chegada de uma criança e outros
que eram tempos melhores. Eu espero que ela anuncie tempos melhores, agora
anunciando a vacina”, pontua Alceu, classificando a vacinação como “uma coisa
fundamental”. O músico destaca ainda o potencial de disseminação do vírus e
conta que mesmo com muita cautela, acabou contraindo a Covid-19, em dezembro do
ano passado (relembre).
“Sempre me resguardei, me cuidei. Nunca peguei na mão de ninguém depois da
pandemia - a não ser da minha mulher (risos) -, nunca comi um sanduíche fora, e
lhe digo mais uma: testei positivo em determinado momento”, lembra o artista.
Como pessoa pública, o cantor pernambucano destaca a importância de se portar como influência positiva. “Eu, que sou uma pessoa conhecida, tenho que dar exemplo. Então, quando eu desço e vou lá na farmácia ou vou encontrar meu filho, não entro na casa dele e vou a pé. E eu vou com máscara, óculos de plástico, coloco o cabelo pra cima e um boné. Isso pra dar o bom exemplo também. Não posso estar brincando, porque o mau exemplo é horrível”, declara o cantor, que pretende seguir os cuidados mesmo depois da segunda dose da vacina. “Acho que a ciência está correndo atrás para salvar o mundo, existe uma guerra comercial dos laboratórios, mas eu, de minha parte, não estou nem aí. Eu tomarei. A vacina pode vir de Oxford, dos Estados Unidos, da China ou da Conchichina. Se passou pela Anvisa, tudo perfeito. Eu mesmo tomei a Coronavac e não tive nenhuma reação, a não ser falar mandarim (risos)”, brinca o pernambucano, em referência ao imunizante chinês.
“Eu faço tudo ao contrário do que eles [negacionistas] pedem ou do que eles dizem. Eu não sou negacionista, eu acredito na ciência", diz Alceu | Foto: Leo Aversa / Divulgação
Com os
pés no chão, ele conta que rechaça veementemente os discursos que vão contra os
protocolos estabelecidos por especialistas para o combate à pandemia, a
exemplo do isolamento social, a aplicação da vacina e o uso de máscaras. “Eu
faço tudo ao contrário do que eles [negacionistas] pedem ou do que eles dizem.
Eu não sou negacionista, eu acredito na ciência. Essa merda pegou no mundo
todo, na Índia, na China, nos Estados Unidos, em Portugal, Argentina… Tudo
quanto é canto pegou, então como é que eu vou negar uma história dessas?”,
questiona Alceu Valença. “Quantas pessoas morreram porque não acreditavam
nisso? Então, não sou negacionista, pra mim a Terra é redonda, pra mim o vírus
tem que ser tratado com vacina, da mesma maneira que o vírus da gripe foi tratado
com vacina”, reitera o cantor, revelando que a Covid-19 ceifou a vida de várias
pessoas próximas, inclusive um primo de 38 anos.
Sem apoiar-se em milagres ou em otimismo exagerado, Alceu
defende ainda que a empatia é o caminho mais viável para o pós-pandemia. “Não
venho agora com teoria ‘ah, isso aqui é uma coisa para a comunidade ficar
melhor’. Não, a comunidade pode até ficar melhor, depois, em função da empatia,
de você entender o outro. Mas não é essa a questão. As pessoas que não se
cuidam estão fazendo um mal à sociedade. E é preciso ter empatia”, avalia o
cantor, que, mesmo diante de uma realidade desoladora, acredita que é preciso
seguir. “Todo dia eu recebo uma notícia, mas a gente tem que ir em frente,
com alto astral, pensar no hoje e ‘Sem Pensar no Amanhã’, mas pensando um
pouquinho”, conclui. (Bahia Notícias)
Nenhum comentário:
Postar um comentário