sexta-feira, 10 de abril de 2020

O primeiro encontro.


Capítulo - 29 do livro "Guris e Gibis"


Johnny acordou atrasado naquela manhã. Como era sábado, dia em que as aulas começavam mais tarde, sua mãe não o despertou cedo, como era de costume. Após um rápido banho, tomou uma simples xícara de café e, pegando os seus livros saiu apressado, quase correndo, se destinando a igreja matriz da cidade, para o encontro marcado com a sua querida Berenice. A garota fazia parte do grupo de jovens, que iriam ajudar a paróquia na preparação da igreja para a semana santa. Conseguiu chegar no horário marcado, encontrando Berenice na companhia da professora Beth Azevedo, que naquele momento, juntamente com outras senhoras, distribuía tarefas aos voluntários da Cruzada Juvenil, que era composta dos jovens, os quais já tinham feito à primeira comunhão.
A missão do pessoal era dar uma limpeza geral na igreja e cobrir todas as imagens dos santos com um pano roxo, em sinal de luto, referenciando a morte de Jesus. O dia seguinte era o domingo de ramos, que assinalava oficialmente o inicio da semana santa e a igreja teria que estar pronta, para receber os fiéis nos atos litúrgicos, marcados pela sobriedade exigida na tradição Católica Romana. Johnny tentou, em vão, conversar com Berenice. A garota sinalizou, indicando que aquele momento era inoportuno e que eles deveriam ter que esperar um pouco. O garoto ficou polindo os bancos da igreja, observando tudo aquilo com curiosidade. Estranhou o comportamento da turma, que trabalhava com moderação e se comunicava, uns com os outros, quase sussurrando. Quando alguém se atrevia falar um pouco mais alto eram repreendidas por duas beatas, as irmãs solteironas Dona Bebê e Dona Nenê, que viam o pecado em qualquer ato brincalhão por parte da meninada e censuravam as risadas como desrespeito à paixão de Cristo.
Depois de certo tempo naquelas tarefas, Berenice pediu dispensa à professora Beth e se retirou com Johnny, alegando que suas aulas iriam começar dento de poucos minutos. Eles desceram a escadaria da igreja de mãos dadas e foram se refugiar atrás do prédio Castro Alves, na parte da Rua Trecchina, que naquela hora estava deserta. Sentados no batente do portão, ficaram algum segundos em silêncio e, emocionados, trocavam olhares de ternura. Berenice aproveita a oportunidade dos dois estarem sozinhos e, pela primeira vez, conversa com Johnny sem a presença inconveniente da garotada que, por vezes, deixava o garoto encabulado. Olhando Johnny nos olhos, Berenice pergunta com doçura:
- Por que você era tão arredio e fingia que não gostava de mim?
Johnny afagou as mãos da menina e respondeu com um sorriso de contentamento:
- Eu lhe adorei desde a primeira vez que a vi, brincando de peteca com outras meninas na frente do Prédio! Só que nunca imaginei que você poderia se interessar por mim!
Berenice olhou seriamente para Johnny e disse:
- Eu pensei que você me evitava por ser mais jovem do que eu!
Johnny ficou surpreso com o temor de Berenice, pois um garoto jamais desprezaria uma moça por ter mais idade. Ao contrário, ficaria orgulhoso. Geralmente, as meninas só se interessa por rapazes mais velhos, forçando os garotos mentir, sempre aumentando as suas idades. Acariciando os cabelos da menina, o garoto disse sorrindo:
Nascemos no mesmo ano e a diferença é pouca! Porém, eu julgava que uma garota bonita como você, não iria dar bola a um pirralho como eu.
- Bobo! Como é que eu não iria namorar um menino lindo como você? – Depois olhando sério para o garoto, perguntou, fingindo ansiedade:
- Você é meu namorado, não é verdade?!
- Claro que sim! – Respondeu o garoto rindo da brincadeira. Depois olhando bem sério para a menina, disse com um leve tom de tristeza:
- Às vezes, até parece que estou sonhando, pois eu gosto tanto de você!
A garota olhou comovida para seu namorado, dizendo a seguir:
- Eu li na revista Capricho uma fotonovela, na qual dois jovens gostavam um do outro, mas foram separados pelos ciúmes e despeitos de outros! Você me promete que isso jamais acontecerá com a gente?
- Sim, eu prometo! Contudo, uma coisa me preocupa. Você está sabendo que Luiz é apaixonado por você?!
- Sim, eu sei disso! Por isso é que devemos manter o nosso namoro em segredo. Não quero que você, venha ter desavenças com seu primo por minha causa!
- Eu concordo consigo! – Disse o garoto, preocupado com os sentimentos de Luís Augusto. Depois alertou para a menina:
- Além disso, existe Eduardo, que também gosta de você! O que faremos para que os dois, não perceberem o nosso namoro?
- A minha preocupação é só com Luís, pois é seu primo e seu melhor amigo!
O garoto baixou os olhos, dizendo quase num sussurro:
- Eu estou me sentindo um fingido! Certa vez, eles me perguntaram se eu estava gostando de você e respondi que não, pois eu não notava o seu interesse em mim!
Berenice ficou comovida com a aflição do garoto e a sua lealdade aos amigos. Beijou as suas faces e, depois de pensar um pouco, explicou:
- Eu menti para os garotos, dizendo que a minha família não permite nenhum namorado antes dos quinze anos. Conscientizei a todos, que só após a festa de debutantes, daqui a dois anos, eles irão permitir que eu que eu lhes apresente algum pretendente. Isso significa que eles não têm chance alguma comigo. Outra coisa: ninguém é obrigado a gostar ou deixar de gostar de
alguém! Ademais poderemos seguir a nossa vida como dois bons amigos e dar tempo ao tempo, sempre um perto do outro. Você vê algum inconveniente nisso?
- Não! De maneira alguma! Eu só quero estar junto de você à vida inteira! – Disse o garoto comovido e, abraçando a menina, beijou-lhes as faces.
Os dois jovens púberes ficaram alguns segundos, fitando um ao outro, almejando a maneira mais romântica de demonstrar seus sentimentos. Nenhum dos dois, jamais tinha experimentando o doce sabor de um ósculo apaixonado. As garotas na puberdade tinham uma imaginação pueril a respeito do inusitado beijo na boca. As que tinham experiência, diziam que era o néctar dos deuses, o mel dos céus. As mais jovens ficavam a sonhar, imaginado o gosto que teria, e era comum uma menina associar o sabor de um beijo a guloseimas conhecidas. Quanto aos garotos, o beijo era agregado ao sexo. Todos diziam já ter beijado uma garota e alguns, de fato, já conheciam os mistérios da sexualidade de maneira torpe e inconsequente. Naquele momento, Johnny e Berenice desejavam que acontecesse um caloroso beijo nos lábios entre eles. Porém, não ousaram ir mais longe do que simples afago de mãos e beijos nas faces.
O sino do Grupo Escolar Castro Alves badalou o começo das aulas. Naquele sábado haveria uma sabatina de matemática, para os candidatos à admissão ao ginásio. Johnny despediu-se de Berenice, que seguiu para suas aulas no Ginásio de Jequié, ficando os dois se encontrarem na procissão da sexta- feira da paixão.

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