sábado, 31 de agosto de 2019

CRIME E CASTIGO

                       Carlos Eden Meira


Lampião era bandido, ou herói? Antonio Conselheiro era um louco fanático, ou um grande líder político e religioso? Napoleão Bonaparte foi um grande imperador, ou um megalomaníaco sanguinário? Che Guevara era um herói guerrilheiro idealista, ou um terrorista frio e cruel? A história oficial é sempre contada por aqueles que lutaram pelo que acreditam e venceram, e, os personagens acima referidos foram todos derrotados e tiveram suas biografias contadas de acordo com a ideologia dos vencedores. Entretanto, se for feita uma pesquisa junto àqueles que de alguma forma, (experiência pessoal ou estudo), perceberam a importância da luta de alguns desses homens, em benefício do meio e do momento em que viveram, indo de encontro aos interesses das classes políticas dominantes de suas respectivas épocas, veremos que suas biografias podem ter sido, em grande parte, distorcidas.
Todos eles foram considerados facínoras, loucos ou visionários fanáticos, ao serem descritos pelos historiadores a serviço das classes vencedoras. Entretanto, muita gente em suas épocas, admirava e respeitava suas idéias e atitudes; são considerados heróis, e muitos se tornaram símbolos revolucionários como Napoleão Bonaparte ou Che Guevara, por exemplo. Em que pesem os excessos que possam ter sido por eles cometidos em nome de suas causas, provocando dor e sofrimento em seu caminho, há quem acredite erroneamente, que os fins justificam os meios. Queremos crer que, no que se refere a Adolf Hitler e Joseph Stalin, os horrores do nazismo e da sangrenta revolução comunista, nem os meios nem os fins são justificáveis, mesmo que por incrível que pareça, ainda exista quem ache que sim.
Tomamos o título deste texto, emprestado da magistral obra “Crime e Castigo” do grande gênio da literatura russa, Fiódor Dostoievski, cujo tema é justamente o conflito psicológico de seu personagem central, Rodion Raskólnikov, um jovem estudante universitário que comete um horrendo assassinato para roubar, em nome do que ele acreditava ser uma boa causa. Ele se considerava uma pessoa intelectualmente superior, mas, sendo pobre, precisava de dinheiro para continuar seus estudos, ajudar a família e outras pessoas pobres. Em sua lógica, achava que assim como Napoleão Bonaparte, que ensanguentou a Europa em nome dos seus propósitos e era admirado por multidões, ele também poderia derramar sangue em nome de sua nobre causa. Era um dos que achava que os fins justificam os meios. Movido por uma crise de consciência e remorso, ele acaba confessando o crime e se entregando à justiça, mas, por ser uma pessoa de boa índole e por ter confessado, acaba tendo a pena reduzida.
Lampião foi derrotado e morto numa emboscada, na Grota de Angicos no sertão nordestino; Antonio Conselheiro foi vencido e morto na famosa guerra de Canudos; Napoleão morreu no exílio, após a derrota na grande batalha de Waterloo; e Che Guevara foi morto nas selvas bolivianas. Cada um deles, se é que cometeram crimes, tiveram seus castigos. Não sendo criminosos e sim heróis, não foram castigados e sim sacrificados. O crime e o castigo aí se tornam relativos. Para quem muito sofreu nas mãos de um possível herói, não importa a grandeza de sua causa, ele sempre será lembrado como o seu algoz, merecedor de castigo. Para quem foi salvo e protegido por um facínora, ele sempre será visto como seu benfeitor, merecedor de sua gratidão, pouco importando os crimes que tenha praticado. É uma questão de ponto de vista individual, o ser humano é assim naturalmente, independente de qualquer ideologia, princípios éticos ou morais.

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