Por Carlos Éden Meira

                   Acreditou-se ao longo dos anos neste país, que o cidadão brasileiro para demonstrar inteligência, sagacidade, perspicácia e prestígio, ao buscar aquilo que é de seu interesse dentro da sociedade, teria que, antes de tudo, saber mexer com os pauzinhos, ou seja: fazer ilegalmente intercâmbio com pessoas influentes em determinado setor, para realizar seus objetivos recíprocos. Nada de trabalhar honestamente, cumprir regras, regulamentos ou leis, institucionalizando-se assim, a chamada malandragem. Foi dentro deste contexto, que a figura do malandro carioca, com suas gírias e trejeitos, popularizados pelos sambistas ou pelos meios de comunicação, (cinema e rádio, na época), passaram a ser glamourizados de tal forma que nos anos 40, Walt Disney, a serviço da tal “política de boa vizinhança” do governo americano, criou para representar o Brasil num desenho animado e histórias em quadrinhos, o papagaio Zé Carioca, um simpático malandro trambiqueiro e vagabundo, que vive colocando seus companheiros em apuros. Há quem diga que a própria criação do Zé Carioca, já teria sido feita através de uma malandragem dos gringos, pois, teria sido copiado de um personagem semelhante, criado por um cartunista brasileiro.

                 Tal imagem passou a ser o estereótipo que representa o caráter do brasileiro em todo o mundo, como se essa calhordice institucionalizada fosse um problema genético nosso. Ora, até certo tempo, a imagem típica e folclórica do malandro era aceita com simpatia, pois, a malandragem era tida como uma alternativa do pobre, para sobreviver numa sociedade preconceituosa e conservadora, liderada por políticos autoritários e elitistas. Entretanto, essa simpatia passou a gerar uma inversão de valores, principalmente entre os jovens que discriminam os companheiros honestos e de boa índole, rotulando-os de trouxas, otários e vacilões. Isto, ao longo  de muitos anos, gerou uma  mentalidade deturpada, na qual tudo o que se aprendeu nas escolas, nas igrejas e outras instituições educacionais, tornou-se “dispensável” no que se refere à ética. O jovem brasileiro de hoje ouve falar em honestidade, lealdade, dignidade, ética e moral, porém, dificilmente vê essas coisas postas em prática. Tornaram-se conceitos cada vez mais abstratos, cada vez menos perceptíveis. Existem pais que se divertem quando seus filhos pequenos e mal-educados, dizem palavrões, aborrecem as visitas ou fazem qualquer outra insubordinação. Alegam que “é coisa de criança”.   Só que muitas dessas crianças vão crescendo assim, irreverentes e indisciplinadas, e ao tornarem-se adultas, muitas delas é que vão, mais tarde, dirigir as instituições nacionais. O resultado disto é essa vergonha nacional que vemos, mormente no meio político.
                O Brasil é hoje, um país moralmente prejudicado por este equívoco sócio-cultural, correndo o risco de ser totalmente dominado por bandidos e autoridades omissas, (salvo as raras e honrosas exceções) – que desde sua mais tenra infância aprenderam que ser malandro é melhor do que ser certinho. Estamos agora, pagando muito caro por este lamentável equívoco, pois, hoje não existe mais o malandro tido como boa praça, de antigamente. A tolerância com a qual se tratou a simpática malandragem de ontem, resultou numa “evolução” para o banditismo propriamente dito, dando lugar ao espantoso aumento de crimes violentos, ao tráfico de drogas, à politicagem desenfreada, à corrupção praticada por indivíduos inescrupulosos e egoístas, que usam o poder e influência, para manter a sociedade submissa aos seus interesses. Cabe agora, aos atuais e futuros governantes inverterem este quadro deprimente, dando bons exemplos, influenciando as futuras gerações através de programas educacionais, que venham a colocar o Brasil numa nova era de estabilidade social.

*Carlos Eden Meira – Jornalista e cartunista DRT 1161