J. B. Pessoa
Capítulo - 65 do livro " Guris e Gibis".
Johnny
e seus amigos estavam contentes naquele maravilhoso domingo. Conforme foi
prometido aos garotos, a vizinhança unida, com ajuda financeira do vereador
eleito, entregou naquele dia uma sede novinha em folha, do clube que fora
destruído pelo velho Manequito.
A
exultação era geral. Durante aquela semana, a nova sede foi erguida com muita
alegria, usando tijolos de argila e telhas novas. Só tinha um cômodo, que era
maior do que o primeiro; contando com uma porta e três janelas. A novidade era
um modesto sanitário, com um pequeno tanque, o qual recebia água, enchido aos
baldes pelos meninos. Ficava na área do quintal da casa de Pé de Pata, motivo
pelo qual seu pai empregou uma boa soma de dinheiro, em sua edificação. O Seu
José Nascimento, pai de Géo, foi o pedreiro responsável pela construção, o qual
contou com a ajuda dos meninos e dos moradores adjacentes àquele círculo.
Naquele
domingo, o último do mês de novembro, Luís aproveitou o momento daquela
inauguração, dando uma festa de despedida de sua partida para outra cidade.
Convidou todos os garotos daquela periferia e ofereceu uma saborosa feijoada,
cozida por Dona Nonnita, acompanhada por um tonel com gelo picado, cheio de
refrigerantes, deixando a meninada, mais contente ainda, com aquele
acontecimento.
Depois
da graduação de Luís Augusto no curso primário, seu pai viajou com o garoto,
para conhecer a cidade de Juiz de Fora e enviar seus documentos escolares para
um excelente colégio particular daquela cidade, na intenção de matriculá-lo no
exame de admissão, daquele ano. A promoção do Senhor Gustavo já era uma
realidade e ele teria que assumir seu novo cargo, antes do Natal. Aproveitando
uma das suas idas àquela cidade, levou o filho para conhecê-la, o qual se
encantou com ela. Quando voltou a Jequié, Luís Augusto não falava em outra
coisa. Era a cidade mais linda que ele tinha conhecido e, além disso, ficava
perto da capital federal e de várias outras famosas cidades da região serrana
do Estado do Rio de Janeiro e de Minas Gerais.
Durante
a inauguração do clube e despedida de Luís, compareceram ao evento Bill Elliott
e Eduardo, acompanhados de suas namoradas Eva Marli e Luísa, os quais foram
recepcionados por Edgar e Neide, com a ajuda de Norma, Gina, e algumas garotas
da Rua Siqueira Campos. Embora fosse maior do que a primeira, a pequena sede
não cabia o número de garotos que compareceram à feijoada. As meninas
preferiram ficar sentadas na companhia dos meninos, nas pedras embaixo da
grande mangueira, lembrando-se dos cozidos, que faziam em seus quintais, aos
quais só compareciam as moças e garotos menores de dez anos. Bill Elliott,
aproveitando
o ensejo da conversa, começou a pilheriar com as garotas, dizendo:
-
Vocês estão vendo como elas são turma? Fazem os seus cozinhados e não convidam
a gente!
Norma,
que era uma garota moderna e estava informada das articulações feministas do
pós-guerra, responde pelas meninas:
- O
negócio é o machismo de vocês! Os pais não gostam de deixar suas filhas
solteiras na companhia de rapazes, com medo de vê-las difamadas. Por isso é que
toda moça, que preza a sua independência, sai de sua cidade natal e vai viver
nos grandes centros!
Não
desconhecendo o assunto e tendo uma opinião pessoal, Eva Marli completa:
- O
pior é que as mulheres cedem às exigências dos homens e acabam se tornando
fantoches deles. Algumas delas revoltadas, e sem terem consciência de suas
estupidezes, acabam frustradas, transformando-se em “comadres de plantão”!
-
Vendo dessa perspectiva, sou obrigado a concordar com vocês! – Disse Bill,
querendo mudar de assunto, pois sabia que tinha uma namorada, que detestava o
mandonismo masculino. Por sua vez Neide, que também era uma garota que primava
pelos direitos femininos, advertiu:
- Tudo
é uma questão de opinião. Um bom casamento com a pessoa certa é o ideal para
qualquer mulher! Entretanto, acredito que algumas mulheres não nasceram para
uma vida conjugal, de maneira convencional. É o que dizem as especialistas no
assunto!
Johnny
ficou observando o comportamento de sua turma, em relação ao conceito das meninas
e verificou que eles não estavam entendendo nada do assunto. Principalmente
Mipai, Nêgo e Géo, que viam no sexo oposto, apenas um destino natural,
designado pelo divino, que era um casamento, o qual a mulher devia fidelidade e
obediência ao marido. Ficaram calados e não opinaram em um assunto, tão
distante de suas realidades. Edgar era órfão de pai e sua mãe dizia que ele
tinha sido um bom marido. Deu a sua opinião, dizendo uma frase, conhecida por
todos:
-“Casamento
é uma questão de sorte”!
Eduardo
afagou as mãos de Luísa e disse afetuosamente:
-
Espero que a sorte me favoreça!
A
garota beijou o seu rosto e sussurrou ao seu ouvido:
- Eu
também, meu amor!
Ouvindo
às opiniões dos amigos, Luís Augusto, disse com convicção:
- Eu
tenho lido alguns artigos que falam em igualdades entre os sexos. Porém a
opinião dos meus pais são que deve haver direitos iguais e deveres diferentes.
Norma virou para Johnny, que era uma pessoa romântica e perguntou:
- E
você Johnny! O que acha de tudo Isso?
- Acho
que somos jovens demais para nos preocuparmos com essas coisas. Cada pessoa tem
o seu ponto de vista. Para mim o essencial é o amor. Havendo amor, haverá
felicidade. Entretanto para haver amor e felicidade, as responsabilidades devem
vir juntas!
Concordo
com Luís e Johnny! – Disse Eva Marli.
- Eu
também! – Afiançou Norma, para depois complementar:
- Mas
acho primordial uma mulher inteligente viver numa cidade civilizada!
- Por
falar em cidade civilizada, o que você achou de Juiz de Fora, Luís? – Perguntou
Gina, com uma ponta de inveja no olhar.
- Uma
verdadeira cidade maravilhosa e bastante populosa. Com muitas áreas de lazer e
vários cinemas. Um deles, o Cine Teatro Central, que é muito luxuoso, tem mil e
oitocentos e oitenta poltronas!
- Puxa
a vida!... Bem maior do que o Cine Teatro Jequié! – Comentou Pé de Pata, que
tinha orgulho de sua cidade ter um grande cinema.
Por
falar em cinemas, já são duas horas da tarde! E o papai aqui está indo para a
matinê - disse Nêgo, enfadado com a conversa das meninas.
- É
verdade! Ficamos nessa animada prosa, que esquecemos as horas – Disse Norma,
alegremente:
-
Fiquei de chegar à minha casa antes das duas horas! – Disse Gina, observando
seu relógio de pulso.
-Eu
também! - disse Neide para Edgar
Géo
virou-se para Mipai e disse preocupado:
- Puxa
a vida! – Ainda tenho que vender as minhas revistas, para assistir o filme e
não perder o seriado com Tom Mix.
-
Ainda dá tempo, pois o filme só começa às duas e meia! – Assegurou Mamãe eu
Quero, pois estava gostando daquela comilança de graça.
Adorando
aquele festejo, Pé de Pata não se incomodava com as horas. Estava feliz demais,
por estar na companhia de Gina e pela alegria de ver o clube inaugurado. Tõe
Porcino estava um pouco entristecido, pois sabia que ia perder um amigo
querido. Prezava muito a amizade de Luís Augusto, desde o dia que o conheceu na
barraca de Orlando. Naquele momento, quando Luís Augusto se despedia de todos,
Porcino perguntou:
-
Quando você vai embora, meu amigo?-
-
Amanhã eu parto de férias com meus pais para Salvador e de lá iremos para Juiz
de Fora!
Porcino
abraçou o amigo, se despedindo dele. Mipai, Géo e Mamãe eu Quero fizeram o
mesmo e partiram para suas casas. Em seguida foi à vez de Edgar e Neide, a qual
estava preocupada com o avanço das horas. Depois de se despedir de Luís com um
forte abraço, Eduardo seguiu para sua casa, na companhia de Luísa, Eva Marli e
Bill Elliott, o qual levou Gina consigo. Seu Gustavo, que estava na casa do
primo Miguel, levou os garotos em seu automóvel. Luís Augusto demorou, ainda,
algum tempo na casa dos primos, pois Maria de Fátima se recusava a deixar o
querido primo ir embora. Depois de
ele prometer visitar a todos no próximo São João, a menina se conformou. A seguir foi a vez dos tios Miguel e Nonnita, os quais deram bons conselhos ao garoto. Após as despedidas, Luís seguiu com Johnny para a matinê. Nêgo, na qualidade de presidente do clube, foi o último a sair fechando a sua porta se despedindo do resto da meninada da rua. Logo depois partiu feliz e para a matinê do Cine Bonfim.
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