domingo, 6 de outubro de 2019

Um dia especial.

João Batista Pessoa

Capítulo - 04 do livro “Guris e Gibis”.

Uma neblina fria caía no momento em que o Sr. Miguel Viana Pereira chegou à sua nova residência. Veio acompanhado de sua família: Dona Nonna Bruni, sua esposa e seus filhos, João Evangelista e Maria de Fátima. Eram sete horas da manhã, quando o garoto saltou da carroçaria do caminhão que carregava as mobílias de sua casa e foi ajudar sua mãe e irmã descer da boléia. A mulher estava bastante desanimada com aquela situação. Aceitou a mudança da família do campo para a cidade, depois de ver o seu marido perder tudo, devido aos desvios financeiros de um péssimo sócio. Ela entrou na casa vazia e, percorrendo todos os cômodos, verificou que a sua casa da roça era bem maior e melhor do que aquela em que iria morar. Como tinha uma fé muito grande e um otimismo natural, arregaçou as mangas e tratou de deixar o seu novo lar, o mais confortável possível. A casa era forte e bem feita, apesar de ter sido construída com um tipo de tijolos, conhecido como adobão. A entrada era pela lateral, tinha quatro janelas na frente e era separada de seus vizinhos por dois becos espaçosos, que permitiam janelas laterais nos quartos e salas. A inexistência de um forro deixava o telhado à vista, constituído por telhas comuns sobre ripões grosseiros. Tinha sido reformada recentemente, pois o cheiro da pintura a base de cal, corante e água recendiam naquele momento. O assoalho era de um ladrilho vulgar, confeccionado com argila cozida, muito comum na região. Apesar de não haver luz elétrica, possuía um grande tanque que recebia, esporadicamente, água corrente. A ausência de muro no quintal limitava a privacidade do morador, deixando toda família exposta à curiosidade da vizinhança. O terreno possuía algumas árvores frutíferas e era delimitado por uns mourões em suas extremidades. O banheiro ficava no quintal da casa, e possuía um pequeno tanque, separado do grande. Nele havia um vaso sanitário, uma pia e uma grande torneira, na qual se tomava o banho frio. A inexistência de saneamento básico naquela área obrigava os moradores da rua a construir fossas sanitárias em seus quintais e, às vezes, alguns esgotos escorriam a céu aberto naquela periferia.
Um sol brilhante dissipou a neblina da madrugada, prometendo um dia radiante. João Evangelista ajudou seu pai a descarregar o caminhão e levar seus pertences para dentro de casa. A mobília era simples e modesta. A sala de visitas ficava à esquerda da casa, tendo a sua direita um quarto. Nela foi colocado um sofá e duas poltronas de madeira, uma chapeleira e uma mesinha de centro com um vaso de vidro fosco de cor azulada. A sala de jantar, separada da primeira por um corredor, com portas para dois quartos restantes, era mais espaçosa e tinha uma janela na lateral e uma nos fundos que dava para o quintal. Nela foi colocada uma grande mesa de madeira com seis cadeiras, e as únicas peças finas da casa, que consistia na máquina de costura de Dona Nonna e uma cristaleira de Jacarandá. No quarto de casal, que era o maior da casa, foi colocada uma grande cama de madeira, com um guarda roupa, uma cômoda e uma penteadeira, todas confeccionadas com entalhes grosseiros por um marceneiro local. A cozinha ficava à direita da sala de jantar, possuía uma janela que dava para o outro beco e uma porta, a qual era a saída para o quintal. O cômodo era dotado de um fogão a carvão, feito de tijolos, o qual possuía três bocas e um forno. Nele foi colocada uma
mesinha com quatro tamboretes, um filtro de cerâmica, um pote de argila e uma prateleira de madeira. Nos dois quartos menores, o Sr. Miguel armou duas camas patentes para as crianças e depositou os grandes baús com as bugigangas trazidas da roça, além de cobertores, lençóis, fronhas e toalhas, todos tecidos nos teares da fazenda do seu sogro, confeccionadas e bordadas por sua esposa.
Depois de por a casa em ordem, Dona Nonnita, como ficou conhecida pelos vizinhos, tratou de preparar o almoço e esperar seu marido vir do trabalho com as novidades. Ela estava preocupada, pois, aquela situação também era diferente. Após ter sido aprovado em um concurso público o Sr. Miguel tornou-se funcionário da prefeitura, ficando com o cargo de fiscal municipal. Era o primeiro dia do seu primeiro emprego. Agora, aos 40 anos, aquele homem enérgico, acostumado a dar ordens, iria receber. Essa nova situação o deixava bastante chateado, porém, aos poucos, foi se adaptando a sua nova realidade que, meses depois, quando foi convidado para administrar uma fazenda, na qual seria sócio minoritário, recusou a oferta, alegando estar satisfeito com a função, que desempenhava em seu novo trabalho.
João Evangelista estava entusiasmado com os acontecimentos do dia. No almoço inaugural da nova casa conversava animado com sua família, pois tudo corria bem. Seu pai funcionário público e ele, juntamente com a sua irmã, matriculados na principal escola pública da cidade. Embora fosse modesta, a família possuía residência própria. A esperança de que todos seriam felizes naquela casa animou dona Nonnita, que transmitia aos seus filhos, os princípios e valores com os quais foi educada.
Após as refeições, enquanto todos descansavam, o garoto saiu para um passeio pela redondeza, examinando atentamente tudo ao seu redor. Tinha doze anos e o fato de sua família ter perdido suas posses e ser obrigada a uma vida menos favorecida, não o incomodava muito; principalmente depois dos esclarecimentos que recebeu a respeito dos acontecimentos que privaram a família de seus bens. Seu pai era um homem honesto e honrou todos os seus compromissos, não devendo nada a ninguém. Ele recomeçaria tudo de novo com a ajuda de Deus. A família não era pobre, apenas estava passando por um período de deficiência financeira, que seria corrigido com muito trabalho e abnegação. Assim pensado, com muita fé no futuro, João foi caminhando displicentemente, quanto avistou um grupo de garotos que conversavam animadamente, debaixo de uma grande mangueira.
João ficou parado por uns instantes observando aqueles meninos, que no momento travavam uma calorosa discussão a respeito dos artistas de cinemas. Os mais afoitos eram um garoto pardo de treze anos, chamado Edgar da Silva Nogueira, que morava nas proximidades, cujo apelido era Edgar Pezão ou Edgar Pé Grande, devido ao fato dele ter pés grandes e não possuir a curvatura natural. O outro era um moreno claro, de cabelos lisos, da mesma idade e tão forte quanto Edgar. Seu nome era José Assunção da Costa, mas atendia pelo apelido de Mipai, devido às estórias que contava cujo herói era o seu próprio pai.
Mipai gostava muito de filmes faroeste e tinha uma predileção pelo especial pelos seriados, que assistia sempre nas matinês de domingo dos cinemas da cidade. Naquele momento afirmava categoricamente:
- O artista mais arretado pra mim é Rocky Lane! Êta cabra bom de briga e arretado no tiro, meu irmão!
- Ah é?!... E onde fica Tarzan, seu besta? - Gritou Edgar, indignado com aquela afirmação, acrescentando a seguir:
- O Tarzan manda cair dentro pra briga mais de dez bandidos ao mesmo tempo!
- E ainda luta com tigres, leopardos e leões! - Atravessou a conversa Geraldo Dias Nascimento, conhecido como Géo, que não perdia um só filme do “Rei das Selvas!” e colecionava as revistas em quadrinhos desse famoso herói.
Nesse momento um lourinho de olhos azuis, chamado Ademir Garcia Nunes Filho, de apelido Nêgo, entrou na discussão e a questão ficou mais tumultuada.
- Está todo mundo errado! O artista mais forte e arretado que existe é o Superman!
- Olha aqui, cambada de otários! Eu quis dizer que Rocky Lane é o maior artista caubói. Porém, o artista mais forte que existe é o Sansão! – Corrigiu Mipai
- É o Superman, seus bestas!... O Superman é o homem feito de aço!
Todos pararam de falar momentaneamente e um silêncio pacificador pairava no ar, dissipando aquela contenda. O argumento de Nêgo parecia incontestável. Afinal, o super-herói tinha muitos poderes e, além disso, voava! Ele já estava todo prosa de ter prevalecido a sua opinião, quando ouviu uma voz calma e segura de si, a alguns metros de distância.
- O maior e mais forte artista que existe é o Sansão e disso ninguém pode duvidar!
Nesse momento a turma notou um garoto de porte altivo, que era estranho ao lugar. Apesar ter só doze anos, era bastante desenvolvido para sua idade. Vestia uma camisa de meia de cor amarela, uma calça curta de brim cáqui com cinto preto e usava um par de basqueteiras. Nêgo olhava com desdém para aquele guri, que ainda usava calças curtas e ousava tirar o brilho de seus argumentos, quando Mipai perguntou?
- Oxente!... De onde você saiu Zé?
- Se fosse uma cobra, me mordia! – disse Géo sorrindo, sentindo uma precoce simpatia por aquele guri branquinho de cabelos aloirados e olhos esverdeados.
- Meu nome é João Evangelista, eu sou o novo vizinho de vocês! Estou morando naquela casa, onde tem um pé de tamarindo.
- Ah! Ele é o filho de padrinho Miguel, que é muito amigo e compadre de papai! – Disse um garoto tão alvo quanto João, que estava totalmente alheio àquela discussão, pois seu herói predileto era o “Cavaleiro Negro”, que só existia nas revistas de quadrinhos.
- Minha mãe está lavando roupa no rio e meu pai está trabalhando na feira. Vou mandar avisar pra eles, que vocês chegaram. Meu nome é Roberto Guedes de Souza, eu sou afilhado do seu pai. – Disse o garoto para João.
- O apelido dele é Pé de Pata Viageira! – Disse Géo morrendo de rir.
- Deixa de ser besta, sujeito, senão eu espalho teu apelido lá da Caixa D’ água, pro mundo inteiro!
Géo ficou calado com receio de a turma descobrir esse tenebroso apelido. Por isso mesmo, sofria chantagem por parte de Pé de Pata, que não revelava esse
segredo a ninguém. O seu preço do silêncio era uma entrada de matinê todos os meses.
- Aqui todo mundo tem apelido! – Observou Edgar. – O dele foi porque ele contou uma lorota pra gente dizendo que, quando morava em Maracás, tinha uma pata muito bonita. Deixou essa pata com a avó, quando veio morar aqui. A pata ficou com saudade dele e veio pra Jequié a pé, viajando solitária por toda a estrada, chegando aqui com os pés em carne viva!
- E quando chegou, deu um abraço nesse moleque mentiroso e disse: Betinho eu te amo! – gritou Mipai, pilheriando e rindo bastante do garoto.
- É mentira! Eu não disse que ela falou! – Protestou Pé de Pata com indignação.
João Evangelista achou muito engraçado a história contada pelos meninos, que costumavam caçoar um dos outros. Ficou por um bom tempo conversando com aquela garotada, trocando idéias e contando histórias. Sentiu que aquela turma era especial, pois nunca tivera amigos. As pessoas que conhecia na roça eram os trabalhadores do seu pai, que raramente traziam suas crianças. Conhecia uns primos da sua idade em Vitória da Conquista, mas não teve oportunidade de fazer amizades com nenhum deles e os de Jequié eram bem mais velhos. Como nunca esteve numa escola, também não teve colegas. Foi alfabetizado em casa pela própria mãe, razão principal da saída de seus pais do campo para a cidade. Enfim, estava ali uma turma, com a qual ele se afeiçoara imediatamente, tendo a certeza que a simpatia era recíproca.
Chamando Edgar à parte, Nêgo se queixou da atitude dos amigos, surpreso com a afável recepção que eles estavam dando aquele guri, que era estranho ao meio.
- Por que vocês estão dando tanta ousadia a esse moleque intrometido?
- Você está falando do que, sujeito? – Perguntou Edgar em tom de repreensão.
Nêgo respondeu, lastimando, como se estivesse sofrendo alguma injustiça.
- Puxa turma! Esse moleque chegou aqui, nesse mesmo instante! Ninguém sabe de onde! Dando opinião em tudo e vocês se abrem para o cara!... Assim?... Logo de primeira?!
- Você não está vendo que ele é parente de Pé de Pata?
- Parente não! Ele é afilhado do pai do cara!
- E daí? Gostei do garoto e você está com despeito!
Nêgo deu de ombros, resmungou algumas malcriações e voltando-se para João disse com impertinência:
- Por que você afirma que Sansão é o artista mais forte que existe?
- Porque a força dele vem de Deus! – Respondeu o garoto com rapidez e convicção.
Um silêncio meditativo pairou naquele instante, fazendo com que todos refletissem sobre uma afirmação positiva de um garoto que denotava uma cultura precoce e uma inteligência peculiar. Géo e Pé de Pata, que tinham pais evangélicos e estavam familiarizados com a Bíblia, foram os primeiros a concordar, sendo logo seguidos pelos outros. Nêgo, que também era protestante, não teve outra saída e acabou reconhecendo o seu erro. Lembrou naquele momento que tinha uma mãe
fervorosa, que o obrigava ir aos cultos todos os domingos. Olhou para o garoto e avaliou com temeridade:
- É verdade!... Com Ele ninguém pode!
A meninada estava séria, refletindo sobre o teor daquela conversa, quando, subitamente, ouviu uma voz compassada e grave:
- “Comonibói” todo mundo aí...
Era um esperto negrinho de treze anos, exibindo um bonito revólver de brinquedo que, não conseguindo manter a desempenho dos mocinhos dos filmes faroeste, explodiu em uma sonora gargalhada.
- Tõe Porcino, seu sacana! Onde você roubou esse revólver? – Perguntou em tom de escárnio Mipai, que gostava de perturbar aquele garoto, o qual era mais esperto do que ele.
“Se respeita”, sujeito! Comprei com o suor de meu rosto!
A garotada ficou admirada com aquele brinquedo, que era um verdadeiro luxo para um garoto pobre. Era da marca Estrela, um revólver estilo cowboy, todo prateado, tendo na coronha branca uma escultura em relevo da cabeça de um touro.
- Igualzinho a do Roy Rogers! – Disse Pé de Pata, que tinha um revolver de plástico, que era totalmente inferior àquele de Pocino.
- Me custou cem “mangos”!
- Puxa a vida! Cem mil réis por um revólver de brinquedo!... Esse dinheiro dava pra ir à matinê mais de trinta vezes! – Disse João Evangelista, que calculou de memória o equivalente entre os dois preços!
- Quem é ele? – Perguntou o negrinho para Mipai, estranhando um garoto novo, com cara de rico, naquela turma de suburbanos.
Feitas as apresentações, não tardou para começar uma grande amizade entre o guri e o gibi, que gostava de brincar de mocinho & bandido e colecionar revistas em quadrinhos.
Antônio Porcino dos Santos morava numa área perto da Rua Siqueira Campos. Era uma praça situada no cimo de uma colina, que ficava toda alagada na maior parte do ano. Tinha uma água barrenta de coloração amarelada, sendo por isso denominada de Lagoa Dourada. Era um lugar paupérrimo, em que a maioria de seus moradores não tinha profissões definidas e tinha a má fama de acoitar malandros perigosos. Toda a zona oeste da cidade era povoada por cidadãos pobres, com exceção da Praça Joaquim Romão e das ruas Santa Luzia e Siqueira Campos, onde também vivia uma pequena classe média.
Porcino olhou para João Evangelista e, examinado os detalhes de seu rosto, disse para a turma:
- Vocês não acham esse menino parecido com o Johnny Mack Brown?
- É devera!... Dá as aparências! Mas eu acho que ele é mais parecido com aquele caubói chamado Billy The Kid! – Ponderou Géo.
É verdade, mas eu acho que ele se parece com os dois ao mesmo tempo. – Afirmou Edgar e virando para o garoto disse:
- De hoje em diante o seu nome de guerra é Johnny The Kid!
- Vamos batizar o homem! - Gritou Mipai.
- Vamos! - Repetiu o resto da turma.
Imediatamente uma saraivada de cascudos atingiu o menino, que atônito àquela situação não compreendia nada. Pensou que tivesse dito alguma coisa ofensiva, porém, ouvindo as gargalhadas e cantiga marota entoada, percebeu que se tratava de uma brincadeira.
- Puxa turma! Pensei que vocês estivessem zangados comigo!
- Ah é?! Você precisava ver como foi o batismo de Pé de Pata! Tomou muitos cascudos por causa da história da pata e ainda foi melado com bosta de boi. A sorte dele foi que a gente estava perto do rio da Suíça. – Disse Nêgo sorrindo, tentando ser simpático com o menino, o qual tinha hostilizado no início.
Géo aproveitou a oportunidade para irritar Pé de Pata, acrescentando:
- Mas o fedor não saiu!
Pé de Pata sorrindo para Géo disse com desdém:
- Deixa de ser besta sujeito!...Pior é o fedor dos teus peidos! – E virando para João disse a seguir:
- Meu caro amigo Johnny The Kid: quando esse infeliz solta uns, os urubus fica rodando por cima dele!
A garotada começou a rir e dali em diante a gozação foi geral, com todo mundo pilheriando uns com os outros. Estórias foram desenterradas e outras inventadas ao sabor das gargalhadas, daquela meninada no alvorecer de suas existências. A turma passou o resto da tarde em animadas conversas. João Evangelista, aliás, Johnny The Kid, tinha encontrado a turma que procurava. Eram os seus primeiros amigos e dali em diante tornou-se inseparável deles, adotando o lema dos amigos, plagiado dos Três Mosqueteiros, “Um por todos e todos por um”.
O sol se escondia por traz das colinas adjacentes, quando Johnny ouviu o chamado de sua mãe. Despediu-se da turma e seguiu para casa. A luz tênue do crepúsculo revelava a pobreza daqueles arredores onde, as casas sem quintais delimitados, denotavam uma melancolia típica dos povoados privados de energia elétrica. Ao longe se ouvia o soar da Ave Maria, vindo de um alto-falante situado no começo da rua. A maioria dos moradores daquela área criava animais domésticos, como complemento do orçamento familiar. Por toda parte ouviam-se os guinchos dos porcos, que viviam soltos na redondeza, sendo conduzidos aos seus chiqueiros. Mulheres esparramavam milho nos terreiros, alimentando suas galinhas que, ao escurecer, pulavam para seus poleiros. Em todas as residências o candeeiro e o fifó eram constantes e poucas eram as casas que possuíam uma lanterna sofisticada. As noites de luar consistiam para aquela gente, como uma verdadeira dádiva divina, e eles aproveitavam a claridade prateada da lua para prosearem com seus visinhos, enquanto suas crianças brincavam de roda e outros folguedos infantis. Às nove horas todos se recolhiam e o silêncio noturno tomava conta da imaginação de mentes simplórias, que viam nos acontecimentos naturais, como o uivo de um cão solitário ou o piar de uma coruja, como algo sobrenatural.
Johnny entrou em casa e foi direto ao seu quarto onde sua mãe o esperava com uma grande bacia, com água aquecida ao fogo, para seu banho. Estava bastante excitado com aquela tarde feita de acontecimentos proveitosos. Minutos depois, seu pai chega do trabalho contente com sua nova ocupação. Após o jantar, a família reunida em volta da mesa ficou por um bom tempo conversando. Maria de Fátima lia, sob a luz do candeeiro, um livro de Monteiro Lobato enquanto Johnny folheava umas revistas de quadrinhos. Seu Miguel alertou a menina do perigo de se
ler à noite com uma luz deficiente e a elogiou por estar lendo um texto inteligente e não aqueles gibis, reprovados por algumas professoras. Dona Nonna, ao contrario do marido, não concordava com aquela opinião. Ela afirmava que os quadrinhos estimulavam a imaginação infantil, fornecendo referências para uma literatura mais concisa. O menino levantou-se da mesa e chegou até a janela para dar uma espiada na rua, que, no momento, estava totalmente deserta naquela noite escura. Resolveu ir dormir, pois na manhã seguinte seria domingo e ele iria com a família à missa na Igreja Matriz. Pediu a benção de seus pais e se recolheu mais cedo, sonhando com as venturas que o porvir poderia oferecer.

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