domingo, 27 de outubro de 2019

A briga de galos.

J. B. Pessoa

Capítulo - 07 do livro “Guris e Gibis”.

Foi num final de tarde, quando o serviço de alto falante anunciava a Ave Maria, que o Sr. Miguel chegou à sua casa, carregando um galo enorme, deixando a vizinhança curiosa, pois nunca tinha visto um galo daquele tamanho. Johnny, que estava perdendo suas bolas de gude para Géo e Nêgo, aproveitou o momento para justificar sua saída do jogo e deu o fora. Despediu-se dos amigos e foi ao encontro do pai para ver de perto a magnífica ave.
Tratava-se de um capão, que o Sr. Miguel havia adquirido de um negociante da cidade de Brumado. Maria de Fátima ficou encantada por aquele galo, passando a dedicar-lhe uma atenção toda especial. Johnny também ficou maravilhado, pois o galo, além de bonito, era quase do tamanho de um peru. Como era esbelto e parecia orgulhoso, a menina deu-lhe o nome de Tarzan. Entretanto, como dizia o nome, era capado e Johnny não compreendia o significado que denominava o formoso galo, menos ainda, o que implicava à sua situação. Sendo grande e belo, a admiração das crianças crescia na medida em que ele engordava. Para o garoto era o maior galo que ele conhecera e, portanto, o mais forte. Quando Maria de Fátima soube, que aquele capão era para ser servido em um almoço, desatou a chorar, abraçando o seu galo como se fosse um animal de estimação, acusando a todos de desnaturados. Foi preciso Dona Nonna prometer que tal ato abjeto não seria cometido, para conter a sua manha.
Havia alguns moradores da vizinhança que criavam galinhas. Um deles admirava as brigas de galos e tinha uma grande criação das raças mais valentes Era o pai de Nêgo, O Sr. Ademir Nunes Garcia, o qual era um dos fundadores da principal rinha de Jequié. Nêgo, todo prosa, passava todo o tempo gabando os galos do pai e suas vitórias em rinhas jequiéense.
Certa tarde, cansado de tanto ouvir o seu amigo gabar de seus galos, Johnny gritou para Nêgo:
- O meu galo põe pra correrem todos os frangos do seu galinheiro!
A meninada ficou espantada com a afirmação do garoto, permanecendo caladas, enquanto ele acrescentava:
- O Tarzan é o galo mais forte do mundo! Convêm ninguém mexer com ele.
- Ah, é? Onde está essa maravilha com nome de cachorro? – Disse Nêgo com desprezo.
Johnny foi até a sua casa, pegou o seu galo e mostrou a sua turma, enquanto tecia proezas jamais cometidas pelo capão. Nêgo, irritado pelos descasos que o garoto fazia pelos seus galos de raça, fez o inevitável desafio:
- Aposto meu almanaque do Gibi Mensal contra o seu do Reis do Faroeste, como o menor frango do meu pai põe prá correr o capado, que você chama de Tarzan!
- Apostado! – Concordou o menino com muita raiva!
As apostas foram feitas e os dois foram buscar suas revistas. Quando souberam que ia acontecer uma briga de galos, apareceram outros meninos da vizinhança. A maioria era tão ignorante quanto Johnny a respeito desse nefasto esporte. Ficaram encantados com o galo do garoto e, quando apareceu um galo feio, de pescoço pelado e magro que Nêgo trazia, não tiveram dúvidas: apostaram no capão. Edgar, Géo, Pé de Pata e Mipai, que eram mais velhos e
entendiam de galos, aproveitaram a ingenuidade de alguns para levarem vantagens.
A meninada foi casando suas apostas, com a maioria apostando no galo capão. Os espertos foram apostando tudo que tinham no galo feio de Nêgo. Além de dinheiro apostaram piões, gibis, gudes, atiradeiras e brinquedos. Os meninos, alegres, gritavam pelo inicio do combate.
Antes de começar a briga, Johnny percebeu que alguma coisa estava errada. Além do sorriso zombeteiro de Nêgo, ele verificou que toda a sua turma tinha apostado no galo opositor. Sentiu que tinha feito uma bobagem, mais era tarde demais para voltar atrás. Sua precipitação era fruto de sua estupidez e como não tinha jeito, manteve a aposta.
Os garotos colocaram os dois galos frente a frente um do outro, atiçando-os com o bater de bicos, para deixá-los bastante furiosos. Em seguida eles soltaram os galos e a briga começou. Começou?! Não! Terminou! O que aconteceu naquele momento ficou marcado para sempre na memória de Johnny The Kid. Ele jamais esqueceria aquele funesto dia. Um só golpe desferido pelo galinho, que consistia numa violenta bicada na cabeça do capão, bastou para que o galo capado debandasse pela ladeira, perseguido pelo valente galinho de briga.
A gargalhada foi geral. Nêgo pegou o seu galo e o elevou ao ar em sinal de vitória e, a seguir, exigiu logo o pagamento da aposta. Johnny ficou inerte por algum tempo, sob as vaias da garotada. A meninada que apostou no seu galo capão ficou bastante zangada e a gozação que ouviu logo a seguir, deixou-o com vergonha e bastante decepcionado com a sua estupidez. O garoto estava vivendo a primeira derrota de sua existência. Quando se deu em conta, do que tinha acontecido, lembrou-se do capão, que tinha desaparecido. Eram quase seis horas da tarde, os meninos seguiram para suas casas, deixando Johnny com Edgar procurando o galo, o qual não foi encontrado. A seguir, os garotos concluíram que o belo capão, teria sido afanado por algum espertalhão das redondezas. Johnny despediu-se do amigo e foi para sua casa, bastante preocupado em explicar, o acontecido para seus pais e, principalmente a sua irmãzinha que adorava a bela ave. Depois de um longo e aborrecido sermão da sua mãe foi jantar, tendo a complacência de Maria de Fátima, que adorava o irmão. Estava chateado, por que: além de perder seu almanaque, ia ficar de castigo, sem poder ir à matinê no próximo domingo e perder o último episódio do seriado: “A Mulher Tigre”, estrelado por Allan Lane e Linda Stirling.

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