domingo, 17 de fevereiro de 2019

O Dia do “Truvo”

                         Carlos Eden Meira
                                                  
O “fim do mundo” é esperado pela humanidade, há milênios. A Bíblia revela no Apocalipse, uma previsão do fim dos tempos sem data marcada, que somente agora a ciência começa a entender. Pesquisadores estudiosos de livros sagrados de diversas religiões antigas encontram textos que também falam disso. Ora, cresci ouvindo falar de previsões para o “fim do mundo”, e já perdi a conta de quantas vezes astrólogos, videntes e falsos profetas erraram vergonhosamente quando marcaram data para a hecatombe final.
Lembro-me de que meus pais e irmãos mais velhos contavam coisas interessantes de um eclipse total do Sol ocorrido em 20 de maio de 1947, visível aqui na Bahia, quando eu ainda não era nascido. Muita gente já esperava o “fim do mundo” nesse espetacular evento astronômico. Nas pequenas cidades, quem raramente tinha rádio ou lia jornais, naquela época, sabia do que se tratava um eclipse solar, e esperava tranquilamente o fato acontecer. Minha mãe contava que no momento exato em que o Sol ficou completamente encoberto, uma multidão de estudantes e pessoas curiosas, na Avenida Rio Branco, saudaram com assovios, palmas e gritos, a escuridão em pleno dia. No entanto, aqueles que não tinham acesso às informações, que moravam na roça e localidades mais isoladas, geralmente pessoas simples, sem instrução, não esperavam e nem sequer sabiam que tal fenômeno iria ocorrer.
Sá Maria, uma senhora que lavava roupas e que era muito amiga da nossa família, e de quem aprendemos a gostar como se fosse uma parenta próxima; contava-nos com muito humor, que no “dia do truvo”, (era como se referia ao dia do eclipse), ela e a família que de nada sabiam a respeito, cuidaram de matar as galinhas que criavam no quintal, para fazer um ensopado ao “molho pardo” bem gostoso, pois, se aquela escuridão em pleno dia seria o “fim do mundo”, eles pelo menos iriam morrer de barriga cheia. Ríamos muito dessa história.
Ugolino, vaqueiro da fazenda de meu avô tinha também, sua história interessante sobre o “dia do truvo”, como ele também se referia ao eclipse. Ele dizia que estando despreocupadamente “empoleirado” num galho de gameleira, árvore frondosa, sombreada e de galhos robustos, descansava um pouco, antes de recomeçar sua labuta diária, quando notou que a luz do Sol diminuíra. Pensou tratar-se de uma grande nuvem, dessas que tapam o Sol, continuou seu descanso e cochilou. Quando despertou um pouco mais tarde, notou assustado, que o dia estava escuro como a noite, pássaros voavam para seus ninhos e as galinhas subiam para seus poleiros. Ao olhar para o céu, Ugolino viu que não havia nuvem nenhuma, e o Sol era uma enorme bola preta cercada por um fino anel de luz. Apavorado, despencou de cima da árvore e saiu correndo em direção à sua casa, arranhando-se a cada arbusto, espinheiro, ou pé de mandacaru em que esbarrava pelo caminho. – Corri levando tudo quanto é pé de pau na caixa dos peitos – dizia ele.
Todo esmolambado, chegou em casa onde encontrou os seus pais e irmãos ajoelhados diante de um pequeno altar com velas acesas, rezando apavorados, sem entender o que se passava. Só podia ser o “fim do mundo”, aquela escuridão fora de hora! Cuidou de rezar também, chamando pelo nome de todos os santos que sabia e mais alguns que acabara de inventar. Somente quando o Sol brilhou novamente é que resolveram sair de casa, para saber que esquisitice era aquela. Mesmo tomando conhecimento do que era um eclipse, continuavam a achar que aquilo só podia ser um “sinal dos tempos”. Entretanto, hoje sabemos que são outros, os inúmeros fatores que podem realmente provocar a extinção da vida no planeta. Guerra nuclear, queda de um grande meteoro, choque com um cometa, ou a atividade de um super vulcão são os principais. Quem tiver suas galinhas no quintal, melhor cuidar de matar, fazer um ensopadinho saboroso pra “morrer de barriga cheia”, como dizia Sá Maria.

3 comentários:

  1. Meu querido tio,

    Li sua história e escutei sua voz, suas risadas, seus gestos e suas pausas para explicação. Gargalhei em alguns momentos. Que maravilha! Os causos que a memória guarda às vezes precisam ser mesmo escritos. Ainda bem que você o faz.

    Um abraço da sua sobrinha que te admira e ama muito.

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    1. Jaya fico feliz em saber que você gostou do meu texto.Muito obrigado pelo comentário. Um beijo e um abraço.

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  2. Gostei muito parabéns pela história do fim do mundo.

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