sábado, 15 de dezembro de 2018

A Lua Andando.

                                                                                  J. B. Pessoa


Havia dois estudantes do Colégio Comercial de Jequié, que não primavam pela inteligência. As mancadas que esses rapazes cometiam, tornaram-se piadas que ultrapassaram as fronteiras jequieenses. Andavam sempre juntos, pois cursava o mesmo ano, do curso de contabilidade. Eram jovens brancos, de famílias distintas, bastantes conceituadas na cidade. Quando os dois se sentavam em uma mesa de bar para beber e começavam a discutir, ostentavam uma postura elegante, parecendo verdadeiros intelectuais. Quando um afirmava uma coisa, que o outro discordava eles debatiam o tema com posturas acadêmicas, usando expressões eruditas. Porém a fama dos dois era grande, pois suas afirmações esdrúxulas eram frutos de uma delirante percepção anormal, que chegava ao ridículo. Freqüentavam a alta sociedade jequieense, e pelas suas famigeradas carraspanas, fiaram sendo conhecidos pelos apelidos de Chico Cana-doce e Zé Chupeta. Não conseguiam convencer ninguém de suas opiniões, nem mesmos os menos instruídos e, até os analfabetos, olhavam para eles com desdém.
Em um domingo à noite, após a da última sessão de cinema do Cine Teatro Auditorium, um grupo de estudantes encontrou os dois discutindo em frente de um palacete branco, conhecido como da casa de Lomanto. Era uma turma de vadios, famosa pelas suas molecagens, cujo passatempo predileto era ridicularizar os menos informados. Não poupavam ninguém. Nem mesmo os próprios elementos do seu grupo. Eles eram liderados por um temível gozador, conhecido Paulo Presley. Quando viu os rapazes, Zé Chupeta, morrendo de rir, foi ao encontro deles dizendo com escárnio:
- Olha pra aqui, turma! Veja o que Chico está falando! O cara é burro pra porra!
- O que Chico está falando? – Perguntou Paulo, fingindo surpresa.
- Ele está dizendo que a lua está andando!... Vê se pode!
Percebendo a chance de ridicularizar o rapaz com uma gozação, Paulo perguntou:
- A lua andando! Como é mesmo o negocio Zé?
Nesse instante Chico Cana-doce interferiu na conversa, dizendo:
- Estou dizendo pra esse otário, que a lua está andando e só ele, que é cego, não vê isso!
- E eu estou afirmando pra esse jumento, que a lua não anda! São as nuvens que passa debaixo dela, dando a impressão de que ela está andando! Não é mesmo turma? – Esclareceu Zé Chupeta, certo da aprovação da rapaziada.
Paulo disfarçou o sorriso e, piscando o olho para sua turma, disse em alto e bom som:
- O Chico está coberto de razão! A lua está realmente andando! – Chamando Zé Chupeta à parte, disse com amabilidade:
- Você não se lembra de quando nós encontramos vocês dois por aqui, antes das oito horas, quando a gente estava indo para o cinema? Você até comentou como ela estava bonita!... Ela estava nascendo por traz daquele
morro! Se ela não estivesse andando não estaria na posição, onde se encontra agora!
Zé Chupeta começou a coçar a cabeça e, chateado com seu “erro”, se desculpou:
- Puxa turma! É verdade! Eu não tinha pensado nisso!
- Porque é burro! – Disse Chico se vingando do amigo.
- Bom, desta vez você ganhou! Eu me atrapalhei! – afirmou Zé Chupeta se rendendo ao companheiro.
- Pois é! Eu lhe aconselho a estudar para não dizer bobagens! – Advertiu Chico, sentindo-se senhor da situação.
A turma deixou os dois discutindo e partiu em direção à Praça Ruy Barbosa, morrendo de rir com a estupidez dos dois. J. B. Pessoa (Do livro não publicado: “Velhos Tempos Jequieenses”)

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