segunda-feira, 5 de novembro de 2018

Engano Quase Fatal

                                                                      Carlos Eden Meira

Apolônio Cascadura foi para São Paulo, melhorar de vida. Deixou a jovem esposa e dois filhos pequenos morando com a mãe dele, prometendo vir buscá-los assim que arranjasse emprego e uma casa em São Paulo. Não demorou dois meses, após receber uma carta da mãe, Apolônio estava de volta. Desceu na rodoviária com cara de poucos amigos... Aliás, com cara de carrasco mesmo.
A caminho de casa, entrou no primeiro boteco que encontrou, tomou uma dose reforçada daquela que matou o guarda e saiu cuspindo cobras e lagartos. Entrou numa casa de ferragens ali perto, comprou a maior peixeira que existia no estoque, meteu na cintura e saiu soltando raios e trovões. Chegando à casa da mãe, Cascadura nem tomou “bença” à velha e foi logo gritando:
- Cadê a desgraçada? - a velha surpreendeu-se, dizendo:
-Popó, que qui tu ta fazendo aqui, filho de Deus? Tu num tava em São Paulo?
-Cadê a fidumaégua, mãe? Cadê ela?Vou matar a desgraçada!
-Mas, que diacho tu tá falando, Popó? Larga essa faca! Tu vai matar quem?
-A Isaura, mãe... A sem vergonha de minha mulher. Vou matar ela, depois me mato!
-Mas, por que Popó?
A essa altura, a vizinhança começou a se aproximar, para ver o que acontecia. Apolônio Cascadura estava possesso e não queria conversa. Os amigos tentavam segurá-lo, mas ele se espalhava de peixeira na mão, gritando:
-Me larga, senão eu mato todo mundo!
A velha se aproximou abrindo caminho naquele amontoado de gente, trazendo nas mãos o maior porrete que existia nas redondezas e gritou:
-Larga essa faca seu bosta, ou tu vai se haver comigo!
Cascadura não teve alternativa. Ou largava a peixeira ou matava a mãe. Quando a coisa acalmou, vieram as explicações:
-Popó, meu filho – disse a velha - tu não tinha ido pra São Paulo trabalhar, e assim que arranjasse emprego e casa, tu vinha buscar Isaura e os teus meninos? Que diacho deu em tu? Por que tu quer matar tua mulher?
- Ora, mãe, foi por causa daquela carta que a senhora me escreveu, ué!
- Por causa da minha carta? E o que eu disse na minha carta?
-A senhora me escreveu dizendo que a Isaura tava morando com um tal Nego Jacinto.
-A Isaura? Coitadinha da Isaura! Ela nunca faria uma coisa dessas, meu filho. Eu te escrevi dizendo que ela tava morando em outra rua, em outra casa!
-Tá escrito aqui mãe, mãe, olha! – Disse Apolônio, tirando a carta do bolso.
- A senhora escreveu dizendo que ela tá morando com o Nego Jacinto.
Realmente, estava escrito. Só que o que estava escrito era: “... a Isaura está morando na Rua CÔNEGO JACINTO...” Apolônio Cascadura lia mal...

Nota: texto cujo tema foi criado pelo autor e publicado em 1992, no livro JEQUIÉ POESIA E PROSA, organizado por Dermival Rios. Acabou virando piada, contada e escrita como se fosse de autoria anônima.

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