terça-feira, 16 de outubro de 2018

Os Otários.

                     J. B. Pessoa

Ademilton Silva estava bastante aborrecido naquele domingo à noite. O relógio da matriz badalava as onze horas e até aquele momento, ele não tinha feito nenhuma corrida com seu táxi novo. Caía uma garoa fina e gelada, deixando a Praça Ruy Barbosa toda brumosa, com aquele nevoeiro fora do comum. Observa a velha praça reformada num estilo que não lhe agradava. Sentia falta do velho “Colarinho Saback”, do parque infantil e da pista de patins. Quando foi trabalhar em São Paulo, cinco anos atrás, havia deixado um belo jardim, com frondosas árvores, as quais eram aparadas, formando um grande tapete aéreo, que proporcionavam sombras por toda a parte. O jardim era mais bonito com seus bancos e poste de luz, confeccionados dentro do estilo clássico e a praça, sem dúvida, era mais charmosa. Retornou à sua bela cidade no inicio daquele ano, sentindo o impacto da desagradável surpresa! Era um jardim vazio, sem árvores, sem bancos e sem canteiros de flores, que naquele momento lhe parecia um lugar medonho.
O taxista estava se preparando para ir embora, quando apareceram dois rapazes, acompanhados de uma jovem senhora e uma garota de dezoito anos, que conversavam animadamente. O Bar Berimbau, situado no Edifício Vicente Grillo, estava encerrando as suas atividades e eles queriam prolongar a farra por mais tempo. Ademilton conhecia bem os rapazes. Eram brancos, de famílias remediadas, e estudantes, se preparando para o próximo vestibular em Salvador. Os dois andavam sempre juntos e seus nomes eram José Ademir e José Roberto; entretanto, eram mais conhecidos pelos apelidos de Zé Bonito e Zé Feio, pelo fato do apolíneo Ademir ser considerado, pelas garotas da cidade, como o rapaz mais bonito de Jequié. Ele estava no esplendor de seus dezoitos anos, sendo, por isso, bastante imaturo e presunçoso. Roberto era um moço alto e magro, de rosto ossudo e nariz grande, sendo que, aos vinte e cinco anos, ostentava uma calvície precoce; contudo, não era feio como dizia o apelido. As mulheres, uma tia e sobrinha, eram do Rio de Janeiro e estavam viajando de carro, quando resolveram pernoitar em Jequié. Os rapazes conheceram as duas quando terminava a sessão de cinema. José Ademir quando viu aquela belíssima garota de pele bronzeada, cabelos loiros, olhos azuis, e com aquele glamouroso sotaque carioca, caiu de amores pela menina. A tia, uma balzaquiana de trinta e oito anos, era morena e muito atraente. Ademir se apresentou e acompanhado de Roberto convidou as duas para uns drinques. A paquera não demorou a sair e os casais se entendendo, resolveram ir a um motel. Ademir saudou o motorista e lhe disse com um ar esnobe:
- Meu caro taxista, nós precisamos de seus serviços! Queremos alugar o seu carro por tempo indeterminado, pois temos que mostrar a nossa cidade para estas meninas!
- Tudo bem! O amigo é quem manda. – Disse Ademilton, olhando fascinado para aquela bela morena de pernas grossas e sorriso lindo. A mulher olhou com interesse para o motorista, um mulato claro, bem apessoado, de porte altivo, deixando-o impressionado.
Os casais entraram no carro e rumaram em direção a Cidade Nova. A mulher, que se chamava Sônia, sentou-se junto do motorista e os rapazes foram
no banco de trás, junto da garota, que no meio deles distribuía simpatias. Seu nome era Sandra, porém a tia a tratava no diminutivo. Ademir tentou beijar a menina, que se esquivou delicadamente e, puxando conversa com Roberto, ela lhe disse com uma voz sensual:
Sabe que sou amarrada em um homem calvo? Dizem que eles são mais sensuais, mais viris...
-Verdade?!...Fico feliz com isso! – será que o dito popular é verdadeiro?
- Qual?
- “É dos carecas que elas gostam mais!”.
- Isso é conversa fiada. – Interrompeu Ademir com despeito, o qual não estava gostando do rumo que a conversa estava tomando, para depois acrescentar:
- Se isso fosse verdade, não haveria tantos carecas usando perucas!
- Pois eu gosto muito! Eles são mais amorosos, delicados, pacientes e sabem tratar bem uma mulher! – Disse Sônia com firmeza. Ademir balançou a cabeça discordando da afirmação, e olhando para a menina com pose de galã, lhe disse sorrindo:
- Então nesse caso, você prefere o Roberto a mim!
- Claro que prefiro! Você tem duvidas?
- Você só pode estar brincando!
- Não estou! É por isso eu vou dormir com ele e você com a minha tia.
José Roberto ficou surpreso com a escolha da menina, pois as garotas da cidade adoravam José Ademir. Era sorte demais ter aquela garota maravilhosa em seus braços, preferindo a ele e não a seu amigo.
- Nada disso! Você vai ficar comigo porque combinamos em tudo, inclusive na idade.
A garota protestou, dizendo que só ficaria com quem ela quisesse. Por sua vez, o rapaz argumentava que eles eram jovens, que ele era bonito e ela iria adorar.
A garota olhou para José Ademir e, espantada diante da sua presunção, lhe disse indignada:
- Quem foi que lhe disse que gosto de homem bonito?!... Além disso, você não é essa beleza toda!
- Não é o que afirma as garotas que conheço! - Disse o rapaz, tentando acariciar a garota.
- Eu gosto mesmo é de homem gostoso e Roberto é gostoso! - Gritou a menina nervosa, repelindo o rapaz.
Ademir ficou irritado com o que ouviu. Nesse momento o carro chegou ao seu destino e a mulher pediu ao motorista que estacionasse na porta de um restaurante, que naquela hora estava com poucos fregueses. Roberto, preocupado com a implicância do amigo, pediu a Ademilton que esperasse por eles. Chamando Ademir a sua atenção, procurou convencê-lo de que ele estava errado, deixando o rapaz mais irritado ainda, o qual não queria ceder de maneira alguma. O motorista Ademilton Silva assistia todo o desenrolar do drama, surpreso com a falta de tato do jovem arrogante. O barulho formado pela discussão tinha atraído alguns curiosos, que frequentava o restaurante. Um deles, amigo do motorista, havia se aproximado e perguntou a razão daquele alarido. Adailton contou tudo e o sujeito opinou:
- O garotão é um otário!
A mulher já estava perdendo a paciência com toda aquela confusão, quando Roberto chegou para os três dizendo com muita amabilidade:
- Eu não tenho preferência! Gosto mesmo é de mulher bonita e as duas são belíssimas!
A mulher acariciou o rapaz, dizendo com sensualidade:
- Eu gostaria de ter você Roberto. Mas, se minha sobrinha lhe escolheu, eu deixo você para ela, pois sempre satisfaço os seus desejos! – Depois virando para Ademir, disse-lhe aborrecida:
- Eu fico com você garoto! O que quero mesmo é fuder!
José Ademir permaneceu com a cara amuada. Depois, cruzando os braços numa atitude pueril, disse zangado:
- Eu não gosto de coroas!
- Coroa é sua mãe, seu veado filho de uma puta! – Explodiu a mulher com uma fúria incontrolável, deixando assustados os dois rapazes e puxando a sobrinha pela mão, disse raivosa:
- Vamos embora, Sandrinha!... Deixemos de lado esses idiotas!
Nesse mesmo instante, A mulher foi ao encontro do motorista, pedindo para ser levada dali com urgência. Ademilton acomodou as duas no carro e partiu para o centro da cidade.
Os dois rapazes ficaram discutindo entre si sobre o ocorrido, tendo como platéia uma turma de gozadores, que já sabiam da grande mancada. Tiveram que voltar a pé, pois não encontraram nenhuma condução naquele momento.
Chegando a Praça Ruy Barbosa, o motorista parou o carro na espera de algum pedido das passageiras. A mulher pediu desculpas pelo vexame, e com voz delicada perguntou:
- Como é seu nome meu amigo?
- Ademilton Silva, seu criado senhora!
-Meu nome é Sônia e esta é Sandra, minha sobrinha! Ademilton, você poderia nos indicar um bom hotel, onde a gente poderia passar a noite? – Disse a mulher despejando sensualidade e acrescentando com simpatia:
- Um hotel onde duas pequenas podem passar a noite, acompanhadas de um “pão” como você!
- Dá-se um jeito Sônia!
Ademilton levou as mulheres para o melhor hotel da cidade e, acomodando a tia e sobrinha em um apartamento, teve com as duas, a noite mais memorável de toda a sua vida!
José Roberto cortou as suas relações com José Ademir, dizendo: “Quem com porcos andam, farelos comem!” Quando soube da inusitada aventura do motorista, ficou doente de raiva! Principalmente quando Ademilton lhe exibiu duas calcinhas autografadas!

Nenhum comentário:

Postar um comentário