sexta-feira, 29 de junho de 2018

“Frutomaxi & Cia.”

                                         Carlos Eden Meira*


Seu Arquimedes Palmares, proprietário da “Pensão Aurora”, nome com o qual homenageava sua saudosa e distinta esposa dona Aurora Palmares, recebeu naquela tarde um hóspede, o qual ficaria para sempre gravado em sua memória e de toda a molecada da vizinhança. Acompanhado de um garoto de uns dez anos que dizia ser seu filho, um distinto senhor aparentando uns 40 anos, bem vestido, bem barbeado, cabelos começando a ficar grisalhos nas têmporas, se apresentou como representante da empresa “Frutomaxi & Cia.” especializada em frutas diversas, nacionais e importadas, da qual estava trazendo uma filial para a cidade, precisando inclusive de um gerente, além de um ponto comercial bem localizado para abrir a empresa. Logo ao chegar, solicitou uma ligação interurbana para a matriz na capital do Estado, conversando ao telefone com alguém que seu Arquimedes deduziu tratar-se de algum importante sócio da “Frutomaxi”. - Acabei de chegar, – dizia ele – amanhã mesmo vou manter alguns contatos para instalar a filial. Já abri conta no banco, e o número já enviei via telex (ainda não existiam fax nem e-mail) e estou aguardando depósito para as despesas, o mais breve possível. Inscreveu-se no livro de registros de hóspedes, com o nome de Alifanor Praxedes Calvo, economista e gerente geral da “Frutomaxi & Cia.”, e seu filho Pedrinho. Seu Arquimedes, não cabia em si de tanta gentileza e salamaleques para tão importante hóspede, coisa que se intensificou mais ainda, quando o Alifanor sugeriu seu nome, para gerenciar a futura filial da “Frutomaxi”.
Ao tomar conhecimento do que seria o seu salário, seu Arquimedes não pensou duas vezes, aceitou na hora. - Parabéns seu Arquimedes! – disse Alifanor Praxedes, apertando a mão do futuro gerente – O Sr. Não se arrependerá, pode crer.
- A propósito, - (Alifanor adorava usar esse termo) – tem aqui por perto algum barzinho maneiro, pra se tomar umas “loirinhas geladas?”- Tem sim! Aqui pertinho tem o “Estrela Bar”. – disse seu Arquimedes, mostrando pela janela o bar que ficava ali na esquina, em frente à “Pensão Aurora”. No bar, Alifanor todo sorrisos e distinção, apresentou-se ao proprietário Zequinha, dando ênfase aos seus objetivos na cidade, colocando-o a par do projeto de adquirir local bem situado, para instalar a filial.- A propósito – dizia Alifanor colocando no copo a cerveja geladinha servida pelo Zequinha – este ponto aqui é ótimo para nosso negócio, você não quer vender? - Vender? Oh, não! Este ponto aqui é alugado – respondeu Zequinha servindo um prato de batatinhas fritas. - Mas você pode sublocar e ainda ocupar o cargo de subgerente. E olha que o salário é alto hein? A caixa registradora mental do Zequinha começou a funcionar vertiginosamente, e então, a resposta foi imediata! - Negócio fechado! Quando começamos?- perguntou o eufórico Zequinha, com um novo brilho nos olhos. - Estou aguardando resposta da matriz, inclusive o depósito bancário para as despesas. Mas é coisa para breve – disse o Alifanor, pedindo outra cerveja e mais batatinhas fritas. - Estou hospedado ali na “Pensão Aurora”, do seu Arquimedes. Manteremos contato diariamente – disse Alifanor, procurando e não achando sua carteira, para pagar as cervejas e tira-gostos, quando foi interrompido pelo Zequinha. - Precisa pagar não chefe!Vou fazer uma caderneta para o senhor ir pagando quando quiser! Os dias foram passando, e nada da “Frutomaxi” dar sinal de vida. E tome cervejinhas, salgadinhos, doces e refrigerantes para o Pedrinho, no “Estrela Bar”. A conta a esta altura, já era astronômica.
Certa manhã na “Pensão Aurora”, como fazia sempre antes do desjejum e sempre na presença de seu Arquimedes, Alifanor falava alto ao telefone, visivelmente aborrecido com um possível subalterno da matriz, reclamando: - Não é possível! Isto é uma irresponsabilidade! Já assumi compromissos com diversas pessoas aqui e continuo de mãos atadas. Quero este dinheiro na conta amanhã, sem falta! Quanto? No mínimo uns cem milhões de cruzeiros! Claro!... Como? Já foi liberado? Ótimo, então amanhã irei ao banco. Tchau! – Alifanor desligou o telefone, com expressão de júbilo. - Fique sossegado, seu Arquimedes. Quero que o Sr. faça o levantamento das minhas diárias aqui, e hoje à tarde iremos a uma concessionária de veículos. Precisamos de uma Kombi para serviços de entrega, e outro telefone para o senhor ir já providenciando contatos com a clientela. A propósito, o Sr. Prefere telefones daqueles que tocam TRIIIIMM ou dos que fazem PRUUUUU? - E-Eu acho mais modernos os que fazem PRUUU – dizia encabulado, seu Arquimedes. - Pois bem, vou levar o Pedrinho pra cortar o cabelo e... A propósito, estou sem trocado pra pagar o barbeiro, o Sr. poderia...
- Oh, claro, claro, quanto o senhor quiser – dizia o solícito Sr. Arquimedes entregando um maço de notas ao dinâmico e distinto Alifanor Praxedes Calvo, economista e gerente geral da “Frutomaxi & Cia.”, do qual depois daquele dia, nunca mais se teve notícias.
Até hoje, os moleques da rua ligam para a “Pensão Aurora”, perguntando: - O Sr. prefere telefone daqueles que fazem TRIIIIM, ou dos que fazem PRUUUU? – e só desligam, após ouvir a enxurrada de palavrões cabeludos que seu Arquimedes descarrega, à beira de um colapso nervoso. (*Carlos Éden Meira - jornalista e cartunista)

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